terça-feira, setembro 07, 2010

Trégua do ETA sob bombardeio

Trégua do ETA sob bombardeio

Cessar-fogo anunciado por terroristas bascos não convence autoridades, que devem manter partido ligado ao grupo fora das eleições

Priscila Guilayn – O Globo

 ‘Insuficiente, ambíguo e fraudulento’. Assim foi considerado, pelo governo basco, o cessar-fogo decretado ontem pela organização separatista ETA. Esta nova trégua do grupo terrorista, a 11aanunciada desde 1981, foi recebida pelas autoridades em toda a Espanha com ceticismo. Como não houve um anúncio de abandono definitivo das armas, o governo regional basco deixou claro que a polícia não está em trégua e que a chamada esquerda abertzale (nacionalistas radicais) continuará impedida de apresentar-se às eleições do ano que vem. No comunicado, o ETA se diz disposto a negociar um acordo com o governo “de requisitos mínimos democráticos necessários para empreender o processo democrático”.
— Temos de ser muito exigentes com o ETA para que deixe definitivamente a atividade terrorista — afirmou o conselheiro de Interior do governo basco, o socialista Rodolfo Ares. — Aos que dão algum valor a este comunicado, é preciso deixar claro que é insuficiente para que possam voltar à política.
Ares se referia à própria esquerda nacionalista basca, que em outra entrevista coletiva citava o comunicado do ETA como uma “decisão unilateral, indefinida e não condicionada de interrupção de suas ações armadas”.
O partido Batasuna, que representava institucionalmente a esquerda abertzale, foi ilegalizado há sete anos, após ser considerado pelo juiz Baltazar Garzón o braço político do ETA. Seu líder, Arnaldo Otegi, está preso e perdeu os direitos políticos por 16 anos. O Batasuna ainda está presente em cerca de 30 prefeituras bascas, mas está fadado a desaparecer em 2011, quando serão realizadas novas eleições municipais.
— O comunicado tem um valor inquestionável para que se instaure a paz e se consolide um processo democrático — afirmou ontem o porta-voz abertzale Txelui Moreno, que, em abril, fez a primeira censura pública ao ETA, acusando-o de ser “um bloqueio ao diálogo”.
O comunicado de ontem foi feito através de um vídeo divulgado pela rede BBC de Londres, uma estratégia para conseguir mais repercussão internacional. Eram três encapuzados: quem leu o comunicado foi uma mulher.
O Partido Nacionalista Basco (PNV), que governou durante 29 anos consecutivos — até 2009 — o País Basco, divulgou uma nota dizendo que o comunicado do ETA não é o que a sociedade basca esperava. Já para o Eusko Alkartasuna (EA), um pequeno partido nacionalista dissidente do PNV, o anúncio de cessar-fogo do ETA é alentador, mas não deixa de ser apenas um primeiro passo.
— A decisão do ETA de não realizar atentados, além de responder à demanda da cidadania, é e deve ser um primeiro passo que nos leve a uma situação de trégua definida que estabeleça um cenário de paz — disse Pello Urizar, secretário-geral do EA.
Desde que rompeu o último cessar-fogo — que durou nove meses — com um carro-bomba no Aeroporto de Barajas, no dia 30 de dezembro, o ETA cometeu cerca de meia centena de atentados e matou 12 pessoas. O fim da trégua significou um enfrentamento entre as principais forças políticas espanholas: Partido Socialista (PSOE), no governo, e Partido Popular (PP), na oposição. O processo de paz de 2006, quando o governo do socialista José Luis Rodríguez Zapatero e o ETA estavam em plena negociação, rompeu um acordo antiterrorista firmado com o PP em 2000.
Oposição promete apoiar luta contra terrorismo
Ontem, com o comunicado de uma nova trégua do ETA, o PP afirmou que o governo contará com seu apoio se continuar o trabalho na luta contra o terrorismo. A abertura de um novo diálogo com o ETA significaria para o Partido Popular a ruptura de um acordo que tornou possível a posse de Patxi López, do PSOE, como primeiro lehendakari (chefe do governo basco) não nacionalista.

— O único comunicado que interessa à sociedade espanhola será aquele no qual se anuncie a dissolução do ETA e o abandono definitivo das armas — afirmou Javier Arenas, vice-secretário nacional do PP.
O cerco ao ETA vem sendo cada vez mais forte, não só na Espanha como na França, onde oito líderes foram detidos nos últimos dois anos.
Com a prisão de Francisco López Peña, conhecido como Thierry, em maio de 2008, uma nova geração passou a ocupar a direção do grupo terrorista.
São jovens nascidos depois da transição democrática, que não superam os 30 anos e carecem de formação ideológica. Sua escola era a chamada kale boroka, a violência urbana.
Encurralado, como alternativa de quartel-general o ETA foi para Portugal, onde montou sua fábrica de bombas. Nestes últimos anos, o grupo vem apostando no recrutamento de pessoas sem ficha policial e que conciliem uma vida normal com a atividade terrorista. Com escassa formação militar, cometem numerosos erros, facilmente detectados pela polícia. As dissidências internas completam o atual panorama de debilidade.
Membros históricos do ETA, com diversos assassinatos nas costas, presos e condenados a penas de até 200 anos, vêm se mostrando abertamente contrários à continuidade da luta armada.
Este anúncio de cessar-fogo chega num momento em que há tempos o terrorismo do ETA não ocupa destaque nos meios de comunicação nacionais, nem é ordem do dia nos debates entre governo e oposição.
— É o comunicado mais fraco que emitiram até agora e no qual mostram querer mais coisas em troca: estar nas eleições municipais — diz Ángeles Pedraza, da Associação de Vítimas do Terrorismo.
A última vítima de ETA foi um policial, assassinado na França no dia 16 de março.
Antes disso, no dia 31 de julho de 2009, dois guardas civis espanhóis foram mortos na ilha de Maiorca. O último atentado foi cometido no dia 9 de agosto do ano passado.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Skoob

BBC Brasil Atualidades

Visitantes

free counters