quinta-feira, maio 20, 2010
OAB: Ficha Limpa atinge os políticos condenados até a data da candidatura
OAB: Ficha Limpa atinge os políticos condenados até a data da candidatura
Brasília, 20/05/2010 - Os políticos que tem condenações judiciais proferidas por órgão colegiado estarão automaticamente impedidos pelo projeto Ficha Limpa de serem candidatos às próximas eleições, caso o presidente Lula venha a sancioná-lo. A afirmação foi feita hoje (20), em entrevista, pelo presidente em exercício do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Alberto de Paula Machado, ao ratificar que o Ficha Limpa - aprovado na noite dessa quarta-feira no Plenário do Senado - vale para os candidatos que possuem, atualmente, condenações judiciais. "O texto aprovado não tem a abrangência que alguns parlamentares estão defendendo, de que o veto à candidatura só se aplicaria às condenações judiciais futuras".
Conforme explica Alberto de Paula, o Ficha Limpa vale para os candidatos condenados atualmente porque não há direito adquirido a nenhuma candidatura. Isso porque as convenções partidárias ainda não se realizaram, de modo que as pessoas que pretendem ser candidatas só podem ter, no máximo, a expectativa de direito e não o direito adquirido. "Não temos, neste momento, nenhum candidato oficialmente. Tanto é que estamos vendo o TSE punindo os pré-candidatos por propaganda eleitoral antecipada", afirmou.
Vitória moral
Vitória moral
ELIANE CANTANHÊDE
BRASÍLIA - O projeto Ficha Limpa, aprovado por unanimidade no Senado, é mais ou menos como o acordo mediado pelo Brasil para evitar sanções contra o Irã: um avanço, mas ainda insuficiente para gerar resultados consistentes. O projeto é de iniciativa popular, teve 1,6 milhão de assinaturas e só começou a tramitar em setembro passado, comprovando que, quando quer, o Congresso pode. E que a opinião pública -ou publicada, como prefiram- não move montanhas, mas pesa no Parlamento, sobretudo em ano eleitoral.
Em resumo, essa gente que já foi condenada por mais de um juiz (ou seja, por um colegiado) perde o direito de registrar candidatura e se torna inelegível por oito anos após o cumprimento da pena.
A decisão tem efeito moral, mas, na prática, ainda há muitas e importantes dúvidas rondando o Ficha Limpa. A primeira é quanto ao confronto entre a decisão de ontem do Congresso e uma outra, de 2008, do Supremo Tribunal Federal, que ratificou a soberania da presunção de inocência.
Ou seja: pelo STF, só é considerado culpado, e, portanto sujeito a inelegibilidade, aquele (ou aquela) que for condenado(a) por decisão tramitada em julgado, sem possibilidade de recursos protelatórios.
Outras dúvidas são igualmente pertinentes. A regra vale para a eleição de outubro ou só para a seguinte? Quantos parlamentares atuais são atingidos? Ex-governadores hoje inelegíveis por três anos vão passar a ser por mais cinco?
A nova lei, assim, pode ser considerada uma vitória nossa contra o vale-tudo na política. Mas vamos pensar juntos: se atingisse dezenas de deputados e senadores, ela seria mesmo aprovada? O juiz e deputado Flávio Dino (PC do B-MA), que a defendeu, tem sérias dúvidas.
Ontem foi dia de comemoração, como foi quando da assinatura do acordo do Irã. Hoje talvez não seja tanto. Depende de como o Ficha Limpa e o acordo vão cair na real.
elianec@uol.com.br
Avó e tio têm direito à guarda compartilhada
Avó e tio têm direito à guarda compartilhada
O STJ, em uma decisão pioneira da Quarta Turma, permitiu que a avó e o tio paternos de uma menor tenham a guarda compartilhada da adolescente, que convive com eles há doze anos, desde os quatro meses de vida. A primeira instância julgou extinta a ação de guarda conjunta, dando chance à avó ou ao tio de optar pela guarda exclusiva. Mas eles recorreram ao TJSP. Para os desembargadores, o pedido de guarda compartilhada é possível, porém inadequado porque a família substituta deve ser formada a partir do referencial “casal” – marido e mulher ou o que se assemelhe. O ministro entendeu ser viável o pedido da avó e do tio, já que, na verdade, eles pretendem tão somente consolidar legalmente um fato que já existe.
Para Ayres, condenação muda cultura política
Para Ayres, condenação muda cultura política
Eleições: Ministro do Supremo diz que decisão terá efeito multiplicador
Juliano Basile, de Brasília - Valor Econômico
Relator da primeira condenação de um político na história recente do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Carlos Ayres Britto acredita que a decisão terá efeito multiplicador em todo o Brasil. Para ele, o resultado prático da condenação do deputado federal Zé Gerardo (PMDB-CE), na semana passada, será a redução de desvios de verbas em convênios feitos por Estados e municípios. "A partir da nossa decisão uma nova cultura vai se implantar no país", enfatizou Britto. "Os prefeitos, os governadores vão ter de respeitar os convênios", disse Britto, em conversa com o Valor. "Convênio não é casa de mãe Joana. É para ser respeitado. É dinheiro público." Gerardo foi condenado, na quinta-feira, a pagar 50 salários-mínimos de multa e a prestar serviços comunitários por ter desviado R$ 500 mil de um convênio, em 1997, quando era prefeito de Caucaia, município próximo a Fortaleza. O dinheiro foi liberado pelo Ministério do Meio Ambiente para a construção de um açude, mas foi destinado para a construção de "passagens molhadas" - pontes que, durante chuvas e cheias, permitem a passagem de veículos sobre rios.
A condenação foi a primeira imposta pelo STF a um político, desde a Constituição de 1988. Britto acredita que ela vai dar parâmetros para milhares de convênios que são firmados em mais de 5 mil municípios, em 27 estados e no Distrito Federal. "Eu me preocupo com os efeitos profiláticos das decisões." Segundo o ministro, o julgamento de Zé Gerardo traz um novo alerta para a classe política: o dinheiro liberado por meio de convênios deve ser utilizado para o fim específico para o qual foi determinado. "Os políticos não podem desviar o foco dos convênios." Para mostrar a importância de essa destinação ser cumprida à risca, Britto explicou a diferença entre a construção de um açude e uma "passagem molhada". O primeiro é obra para ajudar a população durante a seca. "Enquanto o açude é para acudir situação emergencial, ' passagem molhada ' é para acudir a cheia. Açude é para abastecer as pessoas", comparou.
No início do julgamento, Britto propôs penas mais duras para o político. Em seu voto, ele postulou cem salários-mínimos, mais 50 dias de multa e a inabilitação de Gerardo para a função pública. Mas o ministro-revisor do processo, Joaquim Barbosa, defendeu 50 salários mínimos e a prestação de serviços comunitários. Britto concordou com o revisor e, assim, foi formada a maioria de sete votos que resultou na condenação do político. Votaram com Britto e Barbosa os ministros Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia Antunes Rocha e Eros Grau. O presidente do STF, Cezar Peluso, e o ministro Marco Aurélio Mello votaram por penas um pouco menores, de, respectivamente, nove meses e um ano e meio de prisão, que também poderiam ser convertidas em multas. Já os ministros José Antonio Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Celso de Mello votaram pela absolvição de Gerardo, após entender que não havia provas de que ele autorizou mudanças na destinação de verbas do convênio. A tese dos três votos vencidos foi a de que não se pode responsabilizar o governante se não houver prova clara de que ele sabia do desvio cometido em seu governo. Britto, que, até abril, presidia o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), acredita que as decisões daquela Corte também terão efeitos profiláticos (preventivos) no futuro. Neste sentido, ele elogiou a decisão tomada, na quinta-feira, pelo TSE de multar a candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, e o partido por propaganda antecipada. Ela foi condenada a pagar R$ 5mil; o PT, R$ 20 mil. Além disso, o partido ficou sem direito ao horário gratuito que teria no primeiro semestre de 2011. "A decisão serve de freio", afirmou o ministro. Segundo ele, a campanha antecipada é proibida por lei justamente para que governantes não se desviem de suas funções e passem a fazer propaganda ao invés de governar. "Senão a propaganda antecipada vai levar ao desvirtuamento da máquina administrativa. A paridade de armas vai para o espaço", advertiu.
Durante os dois anos da gestão de Britto, o TSE cassou três governadores, dois senadores e mais de 300 prefeitos. "Isso não significa caça às bruxas. É preciso interpretar a lei sem frouxidão", concluiu o ministro.
Um em cada dez homens tem depressão pós-parto
Um em cada dez homens tem depressão pós-parto
Estudos mostram também que há correspondência entre o distúrbio da mãe e o do pai
Período entre o terceiro e o sexto mês de vida do bebê é o mais crítico para os pais de primeira viagem; psicóloga acha que taxa é ainda maior
Período entre o terceiro e o sexto mês de vida do bebê é o mais crítico para os pais de primeira viagem; psicóloga acha que taxa é ainda maior
RACHEL BOTELHO – Folha de S. Paulo
A depressão pós-parto masculina é pouco conhecida até entre os profissionais da área, mas isso não significa que seja rara. Do início da primeira gestação da mulher até o bebê completar um ano, um a cada dez homens tem a doença. O dado é de uma revisão de 43 estudos, com 28 mil participantes, que acaba de ser publicada no "Jama", periódico da Associação Médica Americana. Outros estudos apontam que, entre as mulheres, a taxa de depressão é de 15% a 20%. A metanálise revela também que o período entre o terceiro e o sexto mês de vida do bebê é o mais crítico para os homens. Nessa fase, 25% deles sofrem de depressão. Por outro lado, os três primeiros meses após o nascimento são os menos problemáticos, quando apenas 7,7% dos pais desenvolvem depressão. "Nesses meses, a vida é muito corrida. O homem só começa a se dar conta do que está acontecendo depois do terceiro, quarto mês", acredita a psicóloga Fátima Bortoletti, que atende casais durante o pré-natal e o pós-parto no setor de obstetrícia da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo). Na opinião dela, a taxa pode ser ainda mais alta -nos EUA, por exemplo, chega a 14%. Vários fatores que coincidem nesse período podem funcionar como gatilho da depressão masculina, segundo o psiquiatra Joel Rennó Júnior, coordenador do Pró-Mulher do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo. "Muitos homens sentem-se inseguros em relação aos cuidados com o bebê e à disponibilidade de tempo necessária para ter uma participação ativa na criação do filho. Alguns não conseguem entender as mudanças da mulher em relação à sexualidade e à forma como vê seu corpo na gravidez", afirma. A situação econômica, frente às novas necessidades familiares, também os preocupa. Por fim, sentimentos de rejeição e exclusão são comuns entre os pais novatos. Como resultado, uma parcela dos homens compete com o bebê pela atenção da mulher, outra ignora o filho e há os que tentam afastar a mãe dos cuidados com a criança ou que buscam relações extraconjugais.
Correlação
A pesquisa reforça ainda a existência de correlação entre depressão masculina e feminina. "A mulher precisa da proteção do pai do bebê. Se ele passa a maior parte do tempo fora, a desproteção vem acompanhada do sentimento de abandono, que desencadeia a depressão feminina", diz Bortoletti. Como o trio familiar funciona de modo integrado, o desequilíbrio afeta todos. "A depressão masculina prejudica automaticamente a mãe, e o bebê é uma esponja emocional. Se seu parceiro está deprimido, ela fica insegura, irritada e passa isso para a criança, que pode ter problemas de aleitamento e dar mais trabalho", completa.
A pesquisa reforça ainda a existência de correlação entre depressão masculina e feminina. "A mulher precisa da proteção do pai do bebê. Se ele passa a maior parte do tempo fora, a desproteção vem acompanhada do sentimento de abandono, que desencadeia a depressão feminina", diz Bortoletti. Como o trio familiar funciona de modo integrado, o desequilíbrio afeta todos. "A depressão masculina prejudica automaticamente a mãe, e o bebê é uma esponja emocional. Se seu parceiro está deprimido, ela fica insegura, irritada e passa isso para a criança, que pode ter problemas de aleitamento e dar mais trabalho", completa.
Médicos aconselham mulheres a usar mochilas para aliviar coluna
Médicos aconselham mulheres a usar mochilas para aliviar coluna
Bom dia Brasil - 19/05/2010
Peso exagerado das bolsas pode causar problemas de postura e outras complicações. Segundo especialistas, a saída é mudar de hábitos para não prejudicar a saúde. Você costuma acordar com dores nas costas? Já experimentou conferir se o problema não está na bolsa? Elas são amigas inseparáveis das mulheres, mas podem se tranformar em inimigas se não forem bem usadas. Geralmente o mundo das mulheres está guardado nas bolsas. “Eu costumo dizer que a nossa vida está na bolsa. Guardo nécessaire, guarda-chuva, blusa, tudo”, brinca uma paulistana. Será que carregar tanta coisa pesa? Fomos testar. A bolsa da auxiliar de enfermagem Renata Leandro estava com 2,7 quilos. “O peso dói. O corpo reclama no fim do dia”, diz. Sensação de cansaço, dor nos ombros podem ser sinais de que o peso da bolsa está realmente exagerado. Isso permite o surgimento de problemas na postura e outras complicações para a coluna. “A maioria coloca a bolsa de um lado só. Isso provoca uma escoliose postural, uma sobrecarga muscular em um dos lados do corpo. Para manter o alinhamento corporal, o músculo entra em fadiga, fica cansado e com dor. Isso provoca também a famosa hérnia de disco, que é um processo gradativo por sobrecarga nos discos intervertebrais”, explica a fisioterapeuta Elisabete Medeiros.
O que fazer, então, para evitar tanto transtorno? Em primeiro lugar, arrume a bolsa todos os dias tirando o que não vai ser usado. Se precisar levar papéis ou agenda, use uma pasta para carregar na mão; evite as bolsas maiores que dão a sensação de que há espaço para mais coisa; prefira as mochilas, porque elas distribuem melhor o peso. Faça exercícios regularmente, eles fortalecem a musculatura e ajudam a diminuir a tensão nos ombros. Se a bolsa for a tiracolo troque frequentemente de lado.
Mas se você já está sentindo dor, pode alongar. Preste atenção no que fazer. Assista no vídeo como fazer os exercícios. “Por quatro vezes, faça um movimento para baixo, soltando o ar e flexionando. Depois faça uma extensão, devagar. Caia para uma das laterais, movimentando quatro vezes, pare no meio. Depois para a esquerda lentamente e procure girar os ombros. Relaxe a musculatura do trapézio que fica sobrecarregado. Compensa bem”, explica a fisioterapeuta. Há quem não se preocupe mais com os efeitos de carregar quase uma bagagem. A diarista Maria José descobriu o poder da síntese: “Bilhete único, chave e dinheirinho”, diz ela. Quer dizer, nem tanto assim. “Alicate de unha é para fazer volume”, diz a diarista.
A BASE DAS FARC NO BRASIL
A BASE DAS FARC NO BRASIL
EDITORIAL - JORNAL DO COMMERCIO (PE) = 19/5/2010
A prisão de integrantes das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), em ação da Polícia Federal em Manaus e cidades próximas, revelou não apenas a existência de uma rota de narcotráfico que parte da capital do Amazonas – mas também exibiu a vulnerabilidade persistente nas fronteiras brasileiras, além da desenvoltura com que os contrabandistas das Farc se escondem e operam em nosso território. Documento reservado da Polícia Federal, a que teve acesso o jornal O Estado de São Paulo, confirma essa realidade, que vem sendo negada pelo governo brasileiro. O governo Lula e o Partido dos Trabalhadores não admitem chamar as Farc de terroristas, preferindo manter posição de neutralidade que, na pratica, dificulta o combate aos crimes cometidos pela organização paramilitar. A situação que contamina a América Latina é ainda pior devido ao apoio aberto da Venezuela chavista aos “revolucionários” colombianos.
O modus operandi desbaratado trazia a cocaína produzida na selva colombiana por rios até Manaus, de onde era distribuída para o resto do Brasil e outros países. De acordo com o relatório da Polícia Federal, o guerrilheiro José Samuel Sánchez, conhecido como Tatareto (gago em espanhol), que arrecadava dinheiro para as Farc, transferiu a sua base operacional para o Amazonas, pois lá trabalhava “com mais tranquilidade”, à sombra da floresta, coordenando as atividades sem a ameaça de confronto com o Exército da Colômbia. Em um sítio em Tarumã, próximo a Manaus, o traficante montou um sistema de comunicação com rádios enterrados e a antena camuflada por copas de árvores, com horário marcado e transmissão em códigos. Uma empresa de fachada que foi aberta em 1998 pode ser um indício de que a temporada de tranquilidade das Farc no norte brasileiro ultrapassa o período de uma década.
Embora a prisão de Tatareto, como ressaltou o comandante militar da Amazônia, Luís Mattos, não signifique que a guerrilha colombiana esteja querendo abrir filial brasileira, como fez no Paraguai, com o Exército do Povo Paraguaio (EPP), o avanço do narcotráfico por aqui constitui motivo de preocupação em pelo menos dois pontos. O primeiro é a fragilidade de proteção das fronteiras ao Norte do País. Hoje, menos de 1,7 mil militares atuam na linha de frente dos 28 pelotões fronteiriços em todo o território nacional – e o plano de dobrar esse efetivo, contido na Estratégia Nacional de Defesa, até 2025, parece modesto, diante dos conflitos cada vez maiores envolvendo o tráfico de drogas no continente. O narcoterrorismo se nutre dessa fragilidade para desenvolver projetos internacionalistas, como afirmou ao repórter Wagner Sarmento, do JC, o sociólogo paraguaio Bernardino Cano Radil, em matéria no último dia 2.
O segundo motivo de preocupação é a falta de firmeza do Estado brasileiro em assumir um lado na luta contra as Farc, que há décadas atormentam o povo de seu país. Atrás de um biombo ideológico, os crimes patrocinados pela organização não deixam margem para interpretações, como quer parte dos ocupantes do governo petista. Neste sentido, a operação da Polícia Federal que resultou na prisão de oito traficantes, entre eles o Tatareto, deve ser aplaudida pela opinião pública, e servir de novo paradigma na excessivamente amistosa posição oficial do Brasil ante os criminosos da Colômbia, que intensificaram suas atividades este mês em virtude da proximidade das eleições presidenciais que definirão o sucessor de Álvaro Uribe, após dois mandatos em guerra contra as Farc.
A mera existência de uma base operacional estruturada nos arredores de Manaus é um alerta sobre o tipo de consequência gerada pela vista grossa do governo brasileiro na região de fronteira. A distinção preparada pelo discurso oficial – de que foram presos traficantes, e não guerrilheiros – não pode negar o fato de que a operação reprimiu a ação criminosa e promoveu uma baixa em uma organização de narcoguerrilha. Para as Farc, não há diferença entre a guerrilha e o contrabando de drogas. Por que o Brasil deveria criar essa diferença?
A coluna em jogadas
A coluna em jogadas
ROBERTO DaMATTA - O Globo - 19/05/2010
A semana passada teve como evento central a convocação dos jogadores da nossa seleção.
Coisa formidável essa mobilização do Brasil pelo futebol que é o nosso maior professor de liberalismo, mostrando como é possível conciliar liberdade com as coerções impostas por um jogo demarcado por normas que limitam os disputantes — o exato oposto de nossas concepção do poder. A consciência das regras é a consciência do poder, única fonte de seus limites numa democracia ou jogo de iguais. É ela que separa os papéis dos disputantes. O número “10” foi de Pelé, mas hoje pertence a outros craques. Um goleiro só excepcionalmente usa os pés; o oposto vale para os outros jogadores, obrigados a usar a parte de baixo do corpo como instrumento da parte de cima. A ênfase no abaixo da cintura, o equador moral de Bakhtin que, no seu livro clássico sobre Rabelais divide o corpo humano em dois hemisférios: abaixo e acima de cintura, subverte tudo. No Ocidente Iluminista, o lado de cima — da cabeça, das mãos e da racionalidade ajuizada — sempre foi superior. Mas no universo da cultura popular, do carnaval (vejam o que escrevi sobre isso) e do riso, o que conta é o lado de baixo. Donde o elo profundo do futebol com os destituídos. Temos uma equação curiosa: os políticos assentados dão rasteiras no povo; e os futebolistas em pé promovem uma privilegiada experiência com a justiça, a igualdade, a vitória e a autoestima.
Minha tia Lucília, filha do grande e esquecido dramaturgo Armando Gonzaga, conversa casualmente na porta da escola com uma ricaça, mãe de um colega de seu filho, meu querido primo Ronaldo. A mãe, arrogante e tão apaixonada pelo seu rebento quanto Pigmaleão por Galeteia, o professor Higgins por Elisa e o Lula por Dilma, dizia que o rapazinho era extraordinário. Poderia vencer o Joe Louis, jogava tanto quanto o Zizinho, era mais inteligente que Rui Barbosa e escrevia melhor do que Jorge Amado. Ademais, estava destinado a ter um peso extraordinário nos destinos do país e era muito preocupado com os pobres. Perto dele, São Francisco de Assis era juvenil. Depois de ter feito essa propaganda cretina do filho por cerca de meia hora, caiu finalmente em si e, lembrando-se de que não há genialidade sem a comparação — sem o outro que, pelo contraste com ela, a legitima —, perguntou a Lucília: “E o seu, como é?” Ouviu um irônico: “Ele é normal!”
Todo mundo quer vencer e, às vezes, vencer de qualquer modo — como manda o nosso figurino do poder, tão embaraçosamente claro neste processo eleitoral —, mas, no futebol, a vitória se faz por meio de regras estabelecidas, conhecidas dos jogadores e dos espectadores. Vencer com gol de mão é possível e fica bem aos maradonas, não aos pelés e, por extensão, a nós, brasileiros, que somos pentacampeões mundiais jogando (como estamos todos convencidos) sempre com classe, arte, força, amor pela camisa e lisura. Nossa relação com o futebol é quase oposta ao nosso modo de encarar as leis que regem o mundo diário. Nele, forjamos medalhões e nulidades que brilham apenas enquanto estão no poder e brasileiramente fazem favores aos amigos e usam os recursos do Estado para autovangloriar seus (des)feitos pois, em geral, a dinâmica do jogo Brasil não pode ser desenhada por uma linha reta, mas seria mais bem representada por idas e vindas.Passos de um bêbado que detesta o equilíbrio. No caso: a alergia contra a igualdade e a submissão de todos (inclusive do Estado) às mesmas normas, como é o caso do futebol.
O projeto Ficha Limpa é da mesma linhagem do Plano Real. Trata-se de uma norma preliminar, sem a qual o jogo torna-se impossível. O dado mais importante de uma economia capitalista é o valor do dinheiro; de uma democracia liberal é a figura da representação, quando alguns são transformados pelo simbolismo político moderno, fundado na escolha e na quantidade, numa pessoa única. O representar é uma incorporação livre e voluntária como queria o bíblico Hobbes. É uma delegação dada a um outro cidadão, de decidir sobre assuntos que o “nosso” grupo concorda. Como, pois, se deixar representar por canalhas e criminosos? O que representa um bandido com ficha na polícia, mas protegido pelo Parlamento? Esse projeto tem repercussões junto aos partidos e, como toda lei, não resolve nada enquanto não for honrada com sua aplicação ao real, punindo tanto os outros quantos os nossos. Isenção, sem a qual, as virtudes cívicas do altruísmo — que Rousseau queria transformar em religião — não superam o jogo da politicagem rasteira como rotina, como testemunhamos neste final de governo. O ilustre líder do governo no Senado, Romero Jucá, traduziu esplendidamente a ética governista. Como o projeto Ficha Limpa é da sociedade, o governo não tem obrigação de apoiá-lo. A prioridade é o pré-sal que vai salvar o Brasil, transformando todo mundo em funcionário público, como na Grécia e em Portugal. Parece que o senador entrou na minha obra. O que ele disse confirma a separação radical entre Estado e sociedade vigente no Brasil. Nós, com uma carga tributária fenomenal, trabalhando para a máquina de barganhas e ineficiências que constitui o Estado nacional. É um retrato brilhante deste governo, sempre dividido entre “nós” e “vocês”, como diz reiteradamente a candidata-Lula.
Assim é, se lhe parece
Assim é, se lhe parece
Zuenir Ventura – O Globo – 19/05/2010
Você, não sei, talvez tenha entendido tudo e chegado a uma conclusão, a qual, qualquer que tenha sido, pode estar certa. Ou não. Já eu me senti na peça "Assim é, se lhe parece", de Luigi Pirandello, sobre pontos de vista contraditórios que confundem ilusão e realidade, aparência e verdade. Estou me referindo ao documento que os presidentes Lula e Ahmadinejad assinaram anteontem em Teerã. Alguém poderia dizer que nunca na história um acordo despertou tanto desacordo. Num primeiro momento, não tive dúvida de que representava uma incontestável vitória de Lula. "O danado antecipou de véspera que ia conseguir, ninguém acreditou, e ele conseguiu", pensei. "Agora ele vai querer o Nobel." Depois, vi que as coisas não eram bem assim. Ou eram para alguns, mas não para outros. Segundo as dezenas de opiniões manifestadas — de governantes, especialistas, observadores e jornais do mundo inteiro — o resultado foi um sucesso, ou nem tanto assim, ou mais ou menos, ou foi positivo, inócuo, um avanço, ou não vai adiantar nada. Em suma, teria sido um golpe esperto para evitar sanções, uma espécie de repeteco de compromisso semelhante assumido pelo Irã em outubro e não cumprido. Acertou quem apostou em "só o tempo dirá".
Sem desprezar os esforços de Brasil e Turquia para evitar uma guerra, eu estaria mais satisfeito (se isso tivesse alguma importância) se Lula, em vez de ficar afagando o monstro iraniano, tivesse atendido ao apelo de Shirin Ebadi, a juíza perseguida pelo regime dos aiatolás e exilada na Europa. Em entrevista a Deborah Berlinck, antes da viagem presidencial, ela pediu que Lula visitasse os prisioneiros políticos e suas famílias. "Há três dias", informou, "cinco deles foram executados, e não quiseram devolver os cadáveres às famílias". O crime dessas pessoas era pertencer a um grupo de minoria curda. "Infelizmente, há outros 18 opositores condenados à morte", acrescentou Shirin. "Todas as organizações de defesa dos direitos humanos, como a Anistia Internacional, estão indignadas."
Lula deve ter feito a mesma cara de não é comigo que fez quando em visita a Cuba soube que um prisioneiro político morrera em greve de fome. A juíza disse que "desejava muito" que Lula dissesse a seu interlocutor que "o Irã foi condenado 25 vezes por violação dos direitos humanos". Pois eu já teria me contentado se ao menos ele tivesse tido a coragem de dizer ao homem que nega o Holocausto (nega porque talvez fizesse pior) que o Brasil reconhece e considera hediondo o extermínio de seis milhões de judeus pelos nazistas.
Um presidente com poder em declínio
Um presidente com poder em declínio
RICHARD COHEN - O Globo - 19/05/2010
No início do mês, o presidente Barack Obama foi à Louisiana para verificar os estragos provocados pela explosão de uma plataforma de petróleo da British Petroleum, manter as equipes de limpeza na ponta dos cascos — nada de dizer “ei, vocês estão fazendo um trabalho dos diabos”, como o ex-presidente Bush — e mostrar aos estados na costa do Golfo e ao resto do país sua preocupação.
No dia 3 de maio, o site do “Washington Post” na internet colocou a notícia precisamente no lugar adequado — enterrada no meio da página. Com isto queria dizer que o presidente dos Estados Unidos, neste caso, não tinha muito a fazer. Todo mundo sabia que Obama estava meramente mostrando que não é George W. Bush. Ele não iria ignorar uma calamidade, especialmente uma que afetasse Nova Orleans e a costa do Golfo. Por outro lado, todos sabíamos que ele não poderia reverter os ventos nem arrolhar o vazamento. Na verdade, ele podia fazer muito pouco, a não ser mostrar sua preocupação.
Foi um momento simbólico — a maré de óleo ameaçando a costa, movendo-se a seu bel-prazer, da mesma forma como parecem estar os fatos pelo mundo. Estamos acostumados a presidentes americanos serem supremamente importantes, quando menos pela razão de que comandam a força militar mais poderosa do mundo. Mas nós devemos avaliar também que a importância do presidente, em termos de ser capaz de influenciar os fatos, está declinando. No Oriente Médio, nada que Obama tentou tem feito muita diferença. Na Europa, o euro cambaleia. Crítica como é esta moeda, ela é muito menos importante que o conceito de integração europeia sobre a qual está baseada. Nós tendemos a esquecer que a Europa é a sede de guerras horrorosas — duas vezes no século passado nós estivemos envolvidos. E se você incluir a Rússia como parte da Europa, como alguns russos insistem em fazer, teríamos que contar a Guerra Fria também. Quanto à Rússia, ela se lixa para as queixas americanas e se move progressivamente para trás — não é uma democracia europeia, mas outra coisa.
Na periferia da Europa está a Turquia, lutando para restabelecer algo da influência que o Império Otomano teve um dia na região. Ela pode estar se tornando também um Estado mais islâmico, possivelmente após concluir que cem anos do secularismo de Mustafa Kemal Ataturk foram suficientes. Qualquer que seja o caso, não há muito o que possamos fazer sobre a Turquia. Ela não precisa mais dos Estados Unidos como um aliado na Guerra Fria, e até mesmo bloqueou nosso acesso militar ao Iraque no início da guerra. A declinante influência americana do presente não pode mais conter a influência do passado otomano. Israel, cuidado.
A China também está fora de nosso alcance. Em alguns casos, precisamos mais dela do que ela de nós. Devemos dinheiro a Pequim. Compramos produtos da China. Respeitamos sua força crescente. Lamentamos nosso poder decrescente. Ocultamos nossa preocupação com os direitos humanos. Somos uma superpotência. Mas contra o quê? Os conser vadores americanos olham as derrotas e os desapontamentos e fulminam Obama. Chamamno de fraco e inepto — e certamente, em algumas áreas, ele tem sido ambas as coisas. Mas estão errados em pensar que outra pessoa faria muita diferença. Os tempos mudaram. O poder dos Estados Unidos está reduzido — em termos relativos, mas em termos absolutos também. Como uma superpotência, os Estados Unidos invadiram o Iraque. Saddam é poeira. Mas esta guerra “rápida” está agora em seu oitavo ano.
Em 1987, Paul Kennedy publicou “Ascensão e queda das grandes potências”. Isto criou uma zoeira porque, entre outras coisas, previu o declínio relativo e absoluto dos Estados Unidos. Kennedy atribuiu isto à sobrecarga dos militares e aos gastos do governo — problemas que desde então passaram de teóricos a agudos. Fazemos mais guerras do que nosso dinheiro permite. A necessidade de mencionar Kennedy magoa. Sugere inevitabilidade, como se os Estados Unidos fossem o Império Romano ou o Britânico, e como se o passado estivesse destinado a se repetir no futuro. Podemos gastar menos, aumentar impostos, renunciar a guerras que escolhemos fazer, reformar o Congresso e parar de confundir a fama que cerca a Presidência com poder real.
Obama presidindo o “impresidível”, tomando conta do incompreensível, toda a panóplia do poder sem sentido — Air Force One, Marine One, a limusine, a escolta de motociclistas, a maleta com os códigos nucleares —, tudo significando, no caso, um homem investindo contra o mar, uma lição sombria para todos nós. O vazamento de óleo continua. A guerra continua. A dívida aumenta — e então, para muitos de nós, aumenta também a recusa.
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