quinta-feira, setembro 02, 2010

Um acordo é difícil

Um acordo é difícil
Por Alon Feuerwerker
alonfeuerwerker.df@dabr.com.br

Ao registrar o fim das operações de combate no Iraque, o presidente Barack Obama fez questão de dar um telefonema ao antecessor, George W. Bush, responsável pelo reforço de guerra empreendido desde 2007, ação que permitiu aos Estados Unidos alcançarem uma relativa estabilidade na segurança interna do país mesopotâmico. Foi civilizado. Um dia talvez algo assim aconteça aqui entre adversários políticos.
Obama elegeu-se com duras críticas à guerra iraquiana, mas também com a promessa de fazer o necessário para vencer o conflito afegão. Quando assumiu, a primeira metade da laranja já estava bem descascada, com o Iraque suprimido como vetor militar e político regional relevante, ou autônomo. Restou a Obama orientar a arrumação do caminhão de mudança. Já no Afeganistão o buraco parece localizar-se um pouco mais abaixo.
Cumprida a promessa de retirar do Iraque as tropas de combate, e tendo garantido ali um governo aliado e dependente, o desafio de curto prazo da diplomacia da Casa Branca é impedir que o renovado diálogo entre Israel e Autoridade Palestina (AP) dê com os burros n`água. Já que, para usar uma expressão do nosso presidente, tem muita gente colocando olho gordo. Um acordo de paz interessa a Israel, à própria AP e aos aliados americanos no Oriente Médio. Não interessa ao Irã, ao Hezbollah, ao Hamas e aos amigos planetários dessa frente rejeicionista.
No meio de campo, pendulando conforme a necessidade, coloca-se a Síria. Convém aos sírios escapar da armadilha do isolamento, mas não podem fazê-lo abrindo mão das reivindicações nacionais, especialmente no tema libanês. Os Assad, antes o pai e agora o filho, percorrem uma trajetória mais inteligente do que Saddam Hussein: arreganham os dentes, evitando porém ter que desembainhar a faca.
O pivô do jogo regional é o Irã. Apesar dos esforços recentes para romper o isolamento, continua encalacrado na sua estratégia de ameaçar com o confronto. O último movimento dos aliados de Mahmoud Ahmadinejad para retirá-lo do cercadinho não foi suficiente: Brasil e Turquia bem que tentaram, mas um consenso inusual no Conselho de Segurança frustrou parcialmente o plano iraniano de ganhar tempo na corrida para conseguir a bomba nuclear.
Ano que vem o ataque às torres gêmeas completa uma década, e a invasão do Kuait pelo Iraque, quase o dobro. Na contabilidade fria, a posição norte-americana naquele pedaço do mundo está mais consolidada agora que antes. Apesar do Irã, que tomou o lugar antes ocupado por Hussein e projeta uma hegemonia bélico-política. Teerã tem hoje mais força do que Bagdá 20 anos atrás, mas caminha para um isolamento semelhante, se é que já não se enroscou irremediavelmente nele.
E o Brasil? Sentou-se nessa mesa de pôquer, empolgou-se no começo, mas parece estar sentindo que ali o cacife talvez custe caro demais. A diplomacia brasileira apostou num movimento ousado, tentando trazer para o carteado uma turma que os demais veem com desconfiança.
Como aliás o próprio Mahmoud Abbas havia feito ao ver Luiz Inácio Lula da Silva, quando pediu que o presidente brasileiro rogasse ao colega iraniano não se meter nos assuntos internos da Palestina. Ou seja: parar de apoiar e armar o Hamas.
Um acordo entre Israel e Palestina é difícil, porque os palestinos precisariam aceitar o direito de Israel existir na concepção atual, e falta-lhes unidade política para dar o passo. Yasser Arafat não se sentiu em condições de aceitar algo assim 10 anos atrás em Camp David, e foi para o túmulo sem ter criado seu Estado.
É preciso ver o quanto a relação de forças intrapalestina evoluiu desde então. Em outras palavras, talvez ainda cultivem a esperança de uma solução militar, impulsionada pelo projeto da potência regional iraniana. É uma aposta e tanto. É altamente improvável que o mundo árabe avalize o Irã em oposição aos Estados Unidos e Israel, pois uma Pérsia nuclear é mais ameaçadora para os vizinhos de Israel do que para o Estado judeu. E, ao contrário de Gaza, a vida na Cisjordânia exibe progressos sensíveis nos últimos anos.

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