segunda-feira, novembro 08, 2010

Festa

Crônica
Festa
Fernanda Torres – Veja Rio
    Agora que passaram a Copa do Mundo e as eleições, o ano vai finalmente começar. Será? O feriado de finados deixou a semana passada espremida entre uma quarta e um sábado, de forma que só voltaremos realmente à ativa no dia 8 de novembro. Com o aniversário da Proclamação da República no 15, restarão seis dias úteis para pôr em prática os planos do fim do ano passado. Até o Natal, teremos 34 jornadas de trabalho pesado para a realização de nossos ideais e aí... Bom, aí já vêm réveillon, o verão, as férias escolares e o Carnaval. Só voltem a falar comigo em março. E é melhor que 2011 seja produtivo, porque 2012 tem Olimpíada, seguida de Copa do Mundo em 2014. Um amigo já disse que vai enforcar 2013.
    Mas é injustiça dizer que estamos mais preguiçosos. Eu não sei o que aconteceu com o calendário estudantil. Quando eu era criança, tínhamos três meses de férias em dezembro e um mês inteiro em julho. Eu passava tanto tempo longe da escola que batia até saudade da rotina. Atualmente, a parada do primeiro semestre foi reduzida a duas magras semanas, o ano letivo vai praticamente até o Natal e a terrível volta às aulas já acontece em fevereiro. Os moleques dão um duro danado, cursam inglês, francês, alemão, chinês, judô, natação, vôlei, futebol, violão, piano, pintura, desenho, balé...
    Para compensar, os feriados se multiplicaram. Zumbi emenda com Nossa Senhora Aparecida, junta com o Dia do Professor, o Dia da Pátria, São Sebastião, Semana Santa, Dia do Livro. Se fizerem as contas, verão que estamos quites com nossos rebentos. Sou a favor do ócio produtivo, por isso não reclamo do engarrafamento de datas santas. Às vezes, é até salutar ter tempo para pensar duas vezes antes de fazer besteira. Aqui vai uma das grandes: Antônio Gomes da Costa Neto, mestrando da Universidade de Brasília, bem que poderia ter dado uma espairecida antes de cometer a insanidade de apresentar uma denúncia à Secretaria de Promoção da Igualdade Racial alertando para o racismo contido na obra de Monteiro Lobato. Da mesma forma, a senhora Nilma Lino Gomes, professora da Universidade Federal de Minas Gerais e membro do Conselho Nacional de Educação (CNE), poderia ter tirado umas férias antes de se esmerar em um parecer favorável às observações de Antônio Gomes. E uma parada coletiva do CNE também teria sido providencial antes que os conselheiros acatassem por unanimidade a opinião de Nilma e sugerissem que o livro fosse retirado da lista oficial de recomendações literárias ou distribuído nas escolas públicas com um aviso de alerta para os desvios contidos na obra.
    Não deviam todos ter tirado umas férias?! O politicamente correto é uma praga tão nefasta quanto o racismo, é o racismo às avessas e se iguala ao primeiro em estupidez. Monteiro Lobato devia ser obrigatório. Meu filho aprendeu matemática com o Visconde, cresci alimentada pelo imaginário brasileiríssimo dos seus personagens. Feliz da criança que tem acesso ao Sítio do Picapau Amarelo. Os problemas de educação do Brasil são tão graves que impressiona que o CNE gaste seu expediente pondo a culpa em Monteiro Lobato. Por que razão a insanidade é sempre mais produtiva do que o bom-senso?
    Para terminar, deixo aqui uma sugestão para a gente pensar antes que seja tarde: não sei se é verdade, mas um grupo hoteleiro teria comprado o terreno onde hoje existe o Teatro Scala para construir um edifício. O Scala é uma casa de shows sem maiores tradições. Com pouco trabalho, poderia se transformar em um teatro extraordinário. Não seria pedir muito rogar que o espaço receba o mesmo destino do seu vizinho, o Teatro Oi Casa Grande, cuja reforma de tirar o chapéu beneficiou o público, o shopping, o bairro e a cidade. Depois da demolição do Teatro Glória, Eike Batista se comprometeu com o governador Sérgio Cabral a construir uma outra casa de espetáculo nas imediações. Eu recebi um recado da assessoria do Hotel Copacabana dizendo que a reabertura do Teatro Copacabana é uma questão de honra. Se o prefeito conseguir reabrir o Teatro Manchete, reformar o Dulcina e o Ipanema e salvar o espaço do Scala, se conseguirem barrar a insanidade das secretarias de Educação, já vou achar que 2011 valeu a pena.

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