segunda-feira, novembro 08, 2010
Os desafios de Dilma
Os desafios de Dilma
Suely Caldas - O ESTADO DE S. PAULO
Duas pesquisas globais divulgadas nos últimos dias indicam os caminhos que a presidente eleita, Dilma Rousseff, deve seguir se quiser fazer do Brasil um país economicamente desenvolvido e socialmente próspero. No Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) da Organização das Nações Unidas (ONU) o Brasil melhorou sua classificação e passou da 77.ª para a 73.ª posição num ranking de 169 países. Mas essa posição recua nada menos que 15 pontos quando são avaliados critérios de desigualdade regional de renda, saneamento básico, educação e saúde de boa qualidade. A segunda pesquisa, o relatório Fazendo Negócios - 2011, do Banco Mundial, foi menos otimista: entre 183 países, o Brasil caiu da 124.ª para a 127.ª posição na avaliação dos que oferecem ambiente favorável para abertura e prosperidade de negócios. Ou seja, por aqui pioraram as condições para empresas investirem, instalarem-se, gerarem crescimento, empregos e renda. E muitas acabam desistindo e mudando de país.
Começando pela segunda pesquisa, a lentidão da ação estatal e o emaranhado absurdo de papéis, documentos e exigências burocráticas, até para pagar impostos, constituem grande parte do problema. Exemplos: são necessárias 2.600 horas para a empresa reunir documentos e executar procedimentos para pagar taxas; um alvará de construção leva um ano e dois meses para ser aprovado; e abrir uma empresa demora quatro meses (na Nova Zelândia leva um dia).
O paquiderme burocrático assusta e piora o custo de produzir no Brasil, já elevado por conta das deficiências na infraestrutura. Não bastasse a desvalorização do dólar, a precariedade na operação nos portos, por exemplo, faz do Brasil um dos campeões em custo de exportação: US$ 1.790 por contêiner. Tudo isso atrapalha, retarda, até expulsa o investimento econômico e precisa ser atacado com energia, determinação. Mas não só isso.
No discurso que leu pouco depois de proclamada eleita, Dilma Rousseff finalmente falou de economia e listou algumas diretrizes de seu futuro governo. O texto lido surpreendeu não por revelar propostas inovadoras para nossos velhos dilemas, mas porque trazia uma profissão de fé em muito do que o governo Lula rejeitou em oito anos, e por vezes incentivado pela própria Dilma.
Em relação às agências reguladoras, ela garantiu: "Terão todo o respaldo para atuar com determinação e autonomia." O que fizeram Lula e Dilma? Enfraqueceram as agências, usadas para abrigar políticos de partidos aliados. "Valorizarei a transparência na administração pública. Não haverá compromisso com erros, com desvio e com malfeito", prometeu. O que dizer do mensalão, dólares na cueca, aloprados, vampiros, a rede de corrupção montada pelo PT e aliados, sob o olhar complacente de Lula? "O povo brasileiro não aceita mais inflação nem que governos gastem acima do que seja sustentável", profetizou, em oposição, sobretudo, ao último período de Lula, quando os gastos correntes dispararam, manobras contábeis disfarçaram os resultados e o governo não aproveitou o aumento da arrecadação de impostos para reduzir a dívida pública.
De qualquer forma, a futura presidente sinalizou que irá atacar as mazelas que emperram o desenvolvimento econômico. E, embora tenha se traído em poucos dias e admitido discutir a recriação da CPMF depois de prometer reduzir tributos, ela merece um voto de confiança da população para fazer o que precisa ser feito para o País afastar entraves e crescer continuamente.
A primeira pesquisa - o IDH da ONU - reflete a ascensão de uma parcela de famílias pobres para a classe média, mas ainda mostra avanços muito lentos ou nenhum na erradicação do analfabetismo funcional, na evasão escolar, na cobertura de lares com água e esgoto tratados e na qualidade da saúde e da educação. Em 1980 o trabalhador com mais de 25 anos tinha em média 2,6 anos de estudo, e, 30 anos depois, tem 7,2 anos. É ritmo muito lento, se
comparado com os países asiáticos, que nos anos 80 investiram maciçamente em educação e fizeram disso a base de seu rápido e próspero desenvolvimento econômico.
Jornalista, é professora da PUC-RIO
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