terça-feira, agosto 31, 2010

O grande salto

O grande salto

Drauzio Varella
A ciência evolui aos saltos; a prática da medicina, também. A fase em que os remédios eram descobertos por casualidade ou tinham seu uso transmitido das avós para os netos durou milhares de anos, mas perdeu o sentido diante da natureza dos desafios atuais: evitar os ataques cardíacos, impedir que o sistema nervoso degenere, curar o câncer, retardar o envelhecimento.
Os médicos que assistiram ao aparecimento dos antibióticos contam que, antes da existência deles, não fossem as cirurgias, quase nada podiam receitar além de analgésicos, chazinhos, canja de frango e repouso no leito.
Diarréias, difteria, sarampo e amidalites banais dizimavam a população infantil, da mesma forma que a tuberculose se disseminava entre os adultos indefesos.
No início do século 19, a milenar medicina chinesa era incapaz de assegurar ao chinês médio mais do que trinta anos de permanência neste vale de lágrimas. Cem anos mais tarde, a expectativa de vida nos países mais desenvolvidos mal chegava aos quarenta anos.
As vacinas, o saneamento básico e os antibióticos transformaram o mundo num lugar menos inóspito. No século 20, a expectativa de vida duplicou em vários países, fato sem paralelo nos cinco milhões de anos decorridos desde que descemos das árvores nas savanas da África.
Na Segunda Guerra Mundial, durante os testes para uso da mostarda nitrogenada como gás de guerra, os médicos do exército americano perceberam que os técnicos apresentavam quedas bruscas do número de glóbulos brancos no sangue.
A observação levou-os a testar a mostarda no tratamento de doenças que cursam com aumento progressivo e irreversível dos vários tipos de glóbulos brancos: as leucemias e os linfomas. Finalmente, a medicina dispunha de uma droga química para tratar portadores de câncer: estava inaugurada a era da quimioterapia antineoplásica.
Nos cinqüenta anos que se seguiram, aprendemos que a quimioterapia podia curar leucemias, linfomas, câncer de testículo avançado, casos mais iniciais de câncer de mama, intestino e estômago, além da maioria dos tumores malignos que se instalam na infância. Enquanto esses progressos eram documentados em estudos multicêntricos, através dos quais foi possível testar novos esquemas de tratamento em ensaios clínicos conduzidos simultaneamente em milhares de pacientes de diversos países, na segunda metade do século 20 houve investimento de recursos colossais (especialmente nos Estados Unidos) na formação de cientistas e na execução de programas de pesquisa.
Tais programas permitiram, por exemplo, conhecer a estrutura química de todos os genes humanos e entender a cadeia de reações que acontece no interior das células desde o instante em que recebem o sinal para dividir-se, até o momento em que a divisão ocorre de fato, fenômeno biológico que encerra o segredo da gênese do câncer. Decifrar a natureza dos sinais transmitidos de uma molécula para a subseqüente desde a membrana externa da célula, através do citoplasma, até chegar ao núcleo para ordenar aos genes que disparem o gatilho da divisão celular, cria a possibilidade de desenhar moléculas-mísseis.
Estas são capazes de impedir que o sinal para a divisão progrida no interior das células malignas ou dos vasos sangüíneos essenciais para a sua nutrição. Já temos à disposição algumas moléculas-mísseis para tratamento de leucemias, linfomas, certos casos de câncer de mama, de rim e de outros tumores malignos; muitas outras se encontram em fase avançada de estudos clínicos. O grande salto dos próximos anos será dado pelos agentes biológicos.
Na primeira quinzena de junho de 2006, foi realizado o Congresso Americano de Oncologia, em Atlanta. No imenso hall em que a indústria farmacêutica exibe seus produtos, para cada estande montado com a finalidade de divulgar agentes quimioterápicos, havia meia dúzia de outros que anunciavam novas moléculas para tratamento biológico. Lembrei de uma visita a uma loja de discos em Nova York, em meados dos anos 1980. Nas estantes, todos os discos eram de vinil, com exceção de um canto reservado para os CDs, que acabavam de surgir. Seis meses mais tarde, na mesma loja, os CDs ocupavam todo o espaço; no cantinho, estavam os vinis.
A ciência evolui aos saltos; a prática da medicina, também. A fase em que os remédios eram descobertos por casualidade ou tinham seu uso transmitido das avós para os netos durou milhares de anos, mas perdeu o sentido diante da natureza dos desafios atuais: evitar os ataques cardíacos, impedir que o sistema nervoso degenere, curar o câncer, retardar o envelhecimento.
Os médicos que assistiram ao aparecimento dos antibióticos contam que, antes da existência deles, não fossem as cirurgias, quase nada podiam receitar além de analgésicos, chazinhos, canja de frango e repouso no leito.
Diarréias, difteria, sarampo e amidalites banais dizimavam a população infantil, da mesma forma que a tuberculose se disseminava entre os adultos indefesos.No início do século 19, a milenar medicina chinesa era incapaz de assegurar ao chinês médio mais do que trinta anos de permanência neste vale de lágrimas. Cem anos mais tarde, a expectativa de vida nos países mais desenvolvidos mal chegava aos quarenta anos.
As vacinas, o saneamento básico e os antibióticos transformaram o mundo num lugar menos inóspito. No século 20, a expectativa de vida duplicou em vários países, fato sem paralelo nos cinco milhões de anos decorridos desde que descemos das árvores nas savanas da África.
Na Segunda Guerra Mundial, durante os testes para uso da mostarda nitrogenada como gás de guerra, os médicos do exército americano perceberam que os técnicos apresentavam quedas bruscas do número de glóbulos brancos no sangue. A observação levou-os a testar a mostarda no tratamento de doenças que cursam com aumento progressivo e irreversível dos vários tipos de glóbulos brancos: as leucemias e os linfomas.
Finalmente, a medicina dispunha de uma droga química para tratar portadores de câncer: estava inaugurada a era da quimioterapia antineoplásica.
Nos cinqüenta anos que se seguiram, aprendemos que a quimioterapia podia curar leucemias, linfomas, câncer de testículo avançado, casos mais iniciais de câncer de mama, intestino e estômago, além da maioria dos tumores malignos que se instalam na infância. Enquanto esses progressos eram documentados em estudos multicêntricos, através dos quais foi possível testar novos esquemas de tratamento em ensaios clínicos conduzidos simultaneamente em milhares de pacientes de diversos países, na segunda metade do século 20 houve investimento de recursos colossais (especialmente nos Estados Unidos) na formação de cientistas e na execução de programas de pesquisa.
Tais programas permitiram, por exemplo, conhecer a estrutura química de todos os genes humanos e entender a cadeia de reações que acontece no interior das células desde o instante em que recebem o sinal para dividir-se, até o momento em que a divisão ocorre de fato, fenômeno biológico que encerra o segredo da gênese do câncer.Decifrar a natureza dos sinais transmitidos de uma molécula para a subseqüente desde a membrana externa da célula, através do citoplasma, até chegar ao núcleo para ordenar aos genes que disparem o gatilho da divisão celular, cria a possibilidade de desenhar moléculas-mísseis. Estas são capazes de impedir que o sinal para a divisão progrida no interior das células malignas ou dos vasos sangüíneos essenciais para a sua nutrição.
Já temos à disposição algumas moléculas-mísseis para tratamento de leucemias, linfomas, certos casos de câncer de mama, de rim e de outros tumores malignos; muitas outras se encontram em fase avançada de estudos clínicos. O grande salto dos próximos anos será dado pelos agentes biológicos. Na primeira quinzena de junho de 2006, foi realizado o Congresso Americano de Oncologia, em Atlanta. No imenso hall em que a indústria farmacêutica exibe seus produtos, para cada estande montado com a finalidade de divulgar agentes quimioterápicos, havia meia dúzia de outros que anunciavam novas moléculas para tratamento biológico.
Lembrei de uma visita a uma loja de discos em Nova York, em meados dos anos 1980. Nas estantes, todos os discos eram de vinil, com exceção de um canto reservado para os CDs, que acabavam de surgir. Seis meses mais tarde, na mesma loja, os CDs ocupavam todo o espaço; no cantinho, estavam os vinis.
http://www.drauziovarella.com.br/

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