domingo, dezembro 26, 2010
O mau sinal do governo que nem começou
O mau sinal do governo que nem começou
ELIO GASPARI – O GLOBO e FOLHA DE SÃO PAULO - 26/12/10
A permanência do deputado Pedro Novais (PMDB-MA) no Ministério do Turismo, e da senadora Ideli Salvatti (PT-SC), no da Pesca são um mau presságio para um governo que nem começou. Revelam ligeireza com o dinheiro da Viúva, onipotência e descaso pela opinião pública.
Novais recebeu da Câmara R$ 2.156 por conta de uma nota fiscal do Motel Caribe, de São Luís, relacionada com despesas feitas no estabelecimento durante a noite de 28 de junho. A senadora, que recebe R$ 3.800 mensais para custear sua moradia na Capital, cobrou à Viúva R$ 4.606 referentes a diárias de hospedagens no hotel San Marco, de Brasília, entre janeiro e dezembro deste ano.
Descobertos, ambos atribuíram as cobranças e os "erros" praticados por assessores e informaram que devolveriam o dinheiro. Pedir desculpas à patuleia, identificando publicamente os responsáveis, nem pensar. Cobrança de parte da presidente eleita que acabara de indicá-los para o ministério, muito menos. Preservou-se o padrão de casa-grande dos maganos de Brasília. Ao pessoal da senzala restou o alívio da descoberta do avanço sobre seu dinheiro, feita pelos repórteres Leandro Colon, Matheus Leitão, Andreza Matais e José Ernesto Credencio.
O deputado Novais, um maranhense octogenário, que vive no Rio de Janeiro e chegou ao Ministério do Turismo por indicação do senador José Sarney, do Amapá, foi imediatamente defendido pelo líder de seu partido, Henrique Eduardo Alves: "Ele está esclarecendo de forma competente". Em seguida, pelo futuro ministro da Articulação Política, deputado Luiz Sérgio (PT-RJ): "O Pedro Novais é um parlamentar experiente e, pela história dele, precisamos dar crédito à sua versão".
Num primeiro instante, a reação de Novais foi típica dos senhores de escravos: "Pare de encher o saco. Faça o que você quiser". Depois, apresentou uma explicação que tem muito de experiente e pouco de competente: "Indignei-me como parlamentar e homem público, mas, acima de tudo, como cidadão e marido. A acusação leviana tenta atingir minha moral e a firmeza de minha vida familiar. Sou casado há 35 anos. Na noite de 28 de junho, data da emissão da nota fiscal, pelo estabelecimento, estava em casa, ao lado de minha mulher. Não posso aceitar que essa falha seja usada para acusações irresponsáveis à minha pessoa".
Mesmo que na noite de 28 de junho o deputado estivesse na Igreja Evangélica Brasileira, que fica na Rua do Amor, nas cercanias do motel Caribe, isso não teria qualquer importância. Foi seu gabinete que apresentou à burocracia da Câmara a nota fiscal do motel. Ademais, uma funcionária do Caribe informou que houvera uma reserva em seu nome.
Admitindo-se que tudo não passou de um erro, Novais deveria ser grato ao repórter Leandro Colon, pois ele permitiu que expurgasse de sua longeva biografia e de seu firme matrimônio a sombra de uma despesa de R$ 2.156 num motel.
Em 2002, a nação petista sabia que o tesoureiro Delúbio Soares ia além de suas chinelas nas mágicas financeiras que fazia com o publicitário Marcos Valério. Acharam que dava para segurar. Em 2003, o poderoso José Dirceu sabia como operava seu assessor Waldomiro Diniz. Achou que dava para segurar. Depois que as acrobacias confluíram no mensalão, Nosso Guia deu-se conta de que deveria ter substituído Dirceu logo depois do caso de Waldomiro. Em todos os episódios, o governo comprou o risco da crise porque tolerou malfeitos que lhe pareciam toleráveis. Isso, supondo-se que Dilma Rousseff não fazia ideia das atividades da família Guerra quando patrocinou a ascensão da doutora Erenice à chefia da Casa Civil da Presidência.
A senadora Salvatti e o deputado Novais foram preliminarmente exonerados pela teoria do "erro", sempre praticado por assessores jamais identificados e nunca disciplinados. Repetindo: nem desculpas pediram. Passou-se adiante o pior dos sinais: "Vamos em frente, não tem problema".
AeroAlckmin
Durante a campanha eleitoral de 2006, o tucano Geraldo Alckmin anunciou que vendera o jato HS do governo do estado de São Paulo e, caso fosse eleito presidente da República, passaria adiante o AeroLula. Fez isso depois de ter usufruído a conveniência do brinquedo durante os cinco anos em que o teve à disposição. Alckmin perdeu a eleição, e seu sucessor recomprou o jato.
Na próxima semana o avião estará a sua espera.
Caso encerrado
Na quarta-feira, o Senado aprovou o crédito de R$ 10,1 milhões para o pagamento das indenizações e das bolsas de estudo para os familiares dos 18 militares mortos em janeiro, durante o terremoto do Haiti. Demorou, mas saiu.
Futuro de Cuba
A constatação de que a Coreia do Sul e a China discutem serenamente o futuro do regime de Pyongyang serviu para fortalecer a ala da diplomacia brasileira que defende o cultivo de uma relação amigável com Cuba.
Por mais que os Estados Unidos briguem com a Coreia do Norte, certamente estarão interessados em evitar que aquele principado das trevas se transforme num condomínio econômico compartilhado por Seul e Beijing. Como diria o rei Leopoldo da Bélgica no século XIX, "quero meu pedaço do bolo".
Não haveria motivo para o Brasil se afastar de Cuba para depois assistir a uma entrada dos Estados Unidos na economia da ilha.
No século passado, o Brasil ficou a reboque dos Estados Unidos, isolando a China, e em 1971 acordou com a notícia de que o presidente Richard Nixon fizera uma surpreendente aproximação com o Grande Timoneiro Mao Zedong.
Aerocracia
Uma previsão maledicente dizia que a primeira lombada do governo de Dilma Rousseff surgiria no caminho de suas relações com os aerocratas.
Ela pretendia criar o Ministério dos Aeroportos. Desistiu e achou melhor deixar as coisas como estavam. Nas mãos do ministro da Defesa, Nelson Jobim, o governo Lula termina com mais uma semana de caos nos aeroportos, explicado pela Anac como consequência do excesso de demanda. Como se fosse novidade o fato de a companheirada viajar no final do ano.
Talvez a doutora Dilma se lembre quando ela achou racional redistribuir os balcões das empresas quebradas e foi convencida a mudar de ideia.
São dois os tipos de interesses que rondam os palácios. Um é o bloco das escavadeiras, que disputam obras físicas. Para o bem ou para o mal, constrói alguma coisa. Outro é o dos teclados, que mexe apenas com papéis. Esse bloco fatura mercadejando normas. O caos aéreo nasce desse segundo tipo.
Jogo de segredos
Um dos jogos prediletos da diplomacia mundial de hoje é a especulação em torno do tempo que demorará até o aparecimento de um mega-arquivo de país emergente no site da WikiLeaks.
Ideia maluca
Apareceu uma ideia tão maluca que pode acabar dando samba. Acompanhado por um vice de algum peso, capaz de permitir-lhe uma saída honrosa em 2014, Lula pode sair candidato a prefeito de São Paulo em 2012, com o propósito exclusivo de iniciar o desmonte da influência tucana no estado.
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