domingo, dezembro 26, 2010

Papai Noel e Pousos Lunares

Papai Noel e Pousos Lunares
MARCELO GLEISER – Folha de São Paulo
É trágico que pessoas duvidem de feitos científicos, ao invés de celebrá-los. Seria melhor crer em Papai Noel
SE VOCÊ TIVER menos de oito anos, pare de ler. A vida seria muito sem graça se não pudéssemos acreditar no impossível por um tempo. Afinal, a força de um mito está na sua credibilidade e não na sua veracidade.
Papai Noel, São Nicolau, é inspirado num bispo que viveu no século 4, na cidade de Myra, hoje província de Anatólia, na Turquia. Dentre seus atos generosos, deu três dotes para meninas pobres para que não virassem prostitutas.
O mito evoluiu e hoje faz parte da cultura planetária. Mas chega uma hora em que a imagem do gordinho de barbas brancas e longas, que atravessa o mundo voando num trenó puxado por renas para dar presentes às crianças deixa de fazer sentido. Isso nos leva aos pousos lunares. Seriam são um mito também?
Na semana passada houve um eclipse lunar, o primeiro durante o solstício de verão desde 1638. A Lua ficou vermelha, uma visão que costumava assustar muita gente. Não é à toa que no Apocalipse de João a Lua aparece vermelha. Várias tabelas previam precisamente quando ele iria ocorrer. Espero que essa precisão da astronomia não tenha passado desapercebida. Sem ela, os pousos lunares não teriam ocorrido.
É grande o número de pessoas que duvidam que o homem tenha ido à Lua, achando que é tudo uma conspiração americana. "Desculpe filho, mas Papai Noel não existe. Aliás, astronautas também nunca foram à Lua..."
A maioria das teorias de conspiração se concentram no primeiro pouso lunar, da Apolo 11, em 20 de julho de 1969. "A Nasa [agência espacial americana] fabricou os vídeos no estúdio do Stanley Kubrick"". Foram seis pousos lunares, e 12 astronautas passearam por lá, em missões que duraram 41 meses, terminando com Gene Cernan e Jack Schmitt da Apolo 17e, em 1972.
Dezenas de milhares de técnicos e engenheiros trabalharam para isso. Eis alguns dos argumentos usados:
1.Como que a bandeira americana balançava se não há ar na Lua?
Os astronautas usaram uma haste horizontal para manter a bandeira aberta. No vácuo lunar, uma pequena oscilação dura muito tempo.
2.Como que sombras parecem projetadas em múltiplas direções quando existem apenas algumas fontes de luz?
Numa superfície curva, como a da Lua, a rede de sombras depende da topologia do solo e dos detalhes da iluminação, podendo criar essa variação complexa.
3.Como que a pegada do Neil Armstrong fica tão definida numa região sem qualquer umidade?
No vácuo lunar, a fina poeira que cobre a superfície pode facilmente criar as impressões de marcas de botas dos astronautas.
Denegrir esse feito é retornar a um obscurantismo medieval que, francamente, é ridículo hoje em dia. Talvez parte da culpa esteja na nossa pobre educação científica. Muitas pessoas acreditam que a Nasa fez isso para ganhar a Guerra Fria.
Os russos cairiam nessa? Acreditar que a coisa toda é uma invenção talvez crie um senso de proteção contra os avanços imprevisíveis da ciência.
É trágico que, em vez de celebrar os grandes feitos da ciência, tantas pessoas escolham fechar os olhos e crer numa mentira. Se é esse o caso, seria muito melhor, então, acreditar em Papai Noel.
MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor do livro "Criação Imperfeita"

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