bode providencial, é o resultado de uma negociação das regras, de um acordo para preservar o rei e ao mesmo tempo alimentar o deus. Nasceu o sacrificado metafórico, e junto com ele o Estado como
instituição. O poder que se oferece à imolação, na forma de bode, e ao mesmo tempo permanece e continua, purificado e perdoado. O bode expiatório, portanto, já começou como uma metáfora: não era
exatamente o que era. Era a segunda escolha do menu para aplacar o deus. Desde então o bode expiatório cumpre a função da metáfora, que é a de ser a coisa, mas a coisa prudentemente em segunda mão. Seu valor terapêutico é o de assumir a culpa alheia e seu valor institucional é o de livrar o Governo do sacrifício de se explicar, e o rei de se auto-imolar ou imolar seus favoritos. A culpa concentrada num bode absorve e absolve a culpa em volta, e reduz a um episódio de fraqueza humana e individual toda a engrenagem de cumplicidades de um sistema pervertido por anos de má explicação e impunidade – ou de sacrifícios de segunda mão. Isso que parece ser o espetáculo inédito de uma alta autoridade financeira brasileira chamada a se explicar na delegacia é apenas outra negociação para aplacar a ira do momento com um sacrificado substituto, escolhido entre os sacrificáveis. No Brasil, este condomínio de poucos que não têm outra preocupação senão a de disfarçar seus privilégios e adiar sua culpa, até o rituais mais graves, de vida, morte, expiação e depuração institucional – até o teatro grego – viram uma pantomima suspeita.
Nenhum comentário:
Postar um comentário