quarta-feira, agosto 25, 2010

Não se deve estigmatizar o Islã

EDITORIAL - O Globo
Não se deve estigmatizar o Islã
Publicada em 25/08/2010 às 16h24m
Não foi só no solo de Manhattan que o 11/9 abriu uma enorme cratera. Um verdadeiro canyon se criou entre o Ocidente e o Islã, pois islâmicos eram os autores do ignóbil atentado. Sendo assim, só faz esquentar a polêmica nos Estados Unidos a respeito da construção de um centro islâmico, incluindo uma mesquita, a duas quadras do local do atentado. De um lado estão os que consideram o projeto um insulto à memória dos quase 3 mil inocentes mortos no 11/9. Esses passaram a considerar o Islã a religião do ódio, de fanáticos capazes de tudo para destruir o modo de vida ocidental. De outro, estão os que defendem a liberdade de culto, reconhecem que o ódio não é a real face do Islã, sabem que os grupos radicais não representam a grande religião monoteísta fundada por Maomé.
O problema é que as extravagâncias dos radicais islâmicos recebem toda a atenção mundial, enquanto o verdadeiro Islã fica obscurecido. Isto acontece agora na questão da iraniana condenada à morte por supostos adultério e/ou participação na morte do marido. Este é um preceito geral do Islã? Não, trata-se da leitura radical que dele fazem, por exemplo, os xiitas do Irã e os sunitas do Talibã, no Afeganistão.
O jornalista Thomas L. Friedman, colunista do "New York Times", acha que as guerras do Islã não se travam contra o Ocidente, mas entre suas próprias correntes. Uma delas, segundo ele, opõe a direita religiosa saudita à extrema-direita, representada por Osama bin Laden. O ataque da segunda em 11/9 se deve, nessa ótica, a que os EUA apoiam a primeira. No Iraque, diz, a luta é entre os sunitas e os xiitas. No Paquistão, entre os fundamentalistas sunitas e todos os outros: xiitas, ahmadis e sufistas. "Em cada uma dessas guerras, quase não se passa uma semana sem que uma facção muçulmana detone uma mesquita ou mate uma multidão de inocentes de outra facção", escreveu Friedman.
Para mudar esse quadro, é preciso ir em busca das maiorias silenciosas no mundo islâmico e apoiar as forças da moderação e da tolerância - as únicas que podem ofuscar as correntes do ódio e da violência. As armas viáveis não são as militares, mas as do desarmamento dos espíritos e do diálogo. Neste sentido, o Departamento de Estado dos EUA patrocina um giro pelo Oriente Médio do imã que impulsiona o projeto do centro islâmico e da mesquita em Manhattan. O objetivo é que ele fale justamente a essas forças da tolerância e do diálogo interreligioso, construindo pontes sobre o imenso fosso que se abriu entre o Ocidente e os países islâmicos.
A realização de eleições há quase seis meses no Iraque, com a participação de coligações que incluíram xiitas e sunitas, abriu uma porta de esperança de que, finalmente, as duas comunidades se entendessem para criar um governo que se pusesse acima das diferenças sectárias. Infelizmente, isto até agora não aconteceu.
O anunciado reinício das conversações entre israelenses e palestinos é mais uma oportunidade para se colocar a tolerância e o diálogo acima do ódio e de velhas divergências.

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