sábado, agosto 28, 2010
Uma oposição em frangalhos
Uma oposição em frangalhos
Em silêncio, Lula deve até comemorar o fato de ter anulado os críticos. Orgulhar-se de tal coisa, porém, é um erro. Sem debates políticos, um país corre o risco de se tornar menor
Por Leonardo Cavalcanti – Correio Braziliense
Quinta-feira, 23 de outubro de 2003. Na antessala do gabinete no Senado, Arthur Virgílio tentava se mostrar à vontade. Naquele primeiro ano do governo Luiz Inácio Lula Silva, o senador amazonense ainda acostumava-se com o novo papel imposto pelos eleitores a tucanos e democratas. O papel de oposição. A entrevista a este Correio tratava de uma das etapas da construção do perfil do político do PSDB, na época o principal arauto da gestão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Homem afeito a frases feitas, Virgílio disparou: “Uma coisa mudou de cara com o governo Lula, a qualidade da oposição”. O título da reportagem publicada três dias depois: Pitbull de FHC, líder do PSDB assume a missão de defensor do presidente tucano. O discurso do parlamentar, entretanto, se perdeu no tempo — talvez nem ele mesmo acredite mais em tal coisa, principalmente agora, quando corre o risco de não se reeleger pelo Amazonas.
Oito anos depois, dois mandatos de Luiz Inácio Lula da Silva e com Dilma Rousseff favorita em levar a eleição presidencial no primeiro turno, a oposição, ao contrário do que queria Virgílio, está em frangalhos. Dia a dia — ou, de pesquisa a pesquisa —, o candidato tucano José Serra perde terreno. Quem ainda tem tempo, ensaia o desembarque do barco serrista. Não dá para dizer, portanto, que a “qualidade da oposição melhorou”. Ao contrário. A oposição que o governo encontrou pela frente foi a feita pela parte fisiológica da própria base aliada. Refiro-me aos deputados ligados oficialmente ao Planalto, mas que exigiam agrados para votar a favor. O mensalão, ou pelo menos parte dele, é o melhor exemplo dessa simbiose de malandros. Não à toa, o pior momento do governo Lula. E, por mais distante que tal fato possa ter ficado no tempo, sempre será lembrado nos livros honestos de história.
Resistência
A popularidade de Lula é um fato e os críticos ao governo não são capazes de freá-la. Há focos de resistências, é claro. Refiro-me a São Paulo, Minas e Paraná. Mas, como disse, são focos de resistência. Nas derradeiras aparições do mandato, Lula mostrou-se emotivo e fez balanço da administração — continuará fazendo tal coisa mesmo passada a campanha. Mas, em silêncio, ele, o presidente, deve contabilizar o fato de ter anulado a oposição em oito anos. Orgulhar-se de tal coisa, porém, é um erro. Nada contra comemorações. Lula se fortaleceu em dois mandatos. Fez mais: encantou eleitores como há muito tempo não se via. As eleições de outubro, mesmo com ele fora da disputa, deverão reforçar esse encantamento. E ninguém será capaz de tirar-lhe o crédito. Mas isso não significa que o fato de ter diminuído a oposição seja algo positivo. Por mais que tal ação tenha de ser creditada à própria incompetência dos adversários. Um país sem críticos ao governo é um país menor. Sem debates políticos, esse país corre o risco de se tornar estúpido.
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