domingo, setembro 05, 2010
Já se pode rir. E chorar?
Já se pode rir. E chorar?
Alberto Dines - JORNAL DO COMMERCIO (PE)
A suprema corte confirmou a liberação de piadas sobre políticos no rádio e TV. É um avanço extraordinário numa sociedade construída em torno de casuísmos e hipocrisias. Nossos sumos-magistrados, porém, não se pronunciaram sobre o tipo de humor e o estilo das piadas. Ou cabe aos humoristas redigir um código de autorregulação?
O direito canônico regeu Portugal desde a sua criação, as "Pragmáticas" da Restauração e a legislação pombalina criaram um paizinho engessado e uma colônia licenciosa onde para evitar abusos tudo é arbitrado até mesmo o livre-arbítrio. Graças ao STF, o riso agora é livre, a sátira deixa de ser crime de lesa-majestade, o povão pode rir daqueles que o enganam.
E chorar, pode? Respondam, meritíssimos: é lícito debulhar-se em lágrimas diante do espetáculo oferecido por um Estado incapaz de proteger a privacidade dos cidadãos? A avacalhação do instituto do sigilo - um dos pilares do estado de direito - pode ser lamentada ou esse é um sentimento golpista?
A quebra do sigilo de dados pessoais na Receita Federal é escandalosa, coloca o Brasil no nível da Venezuela. Sobretudo porque configura uma rotina e consolida um conceito de República Vale-Tudo que o Brasil não merece ostentar.
Foi estúpida a decisão do PSDB de pedir a cassação da candidatura da adversária, Dilma Rousseff. Esta não é uma questão eleitoral, é institucional, republicana. Calejado, desta vez o presidente Lula não jogou a culpa nos aloprados. Percebeu que a sucessão de irregularidades reveladas exatos 30 dias antes das eleições comprometem a lisura de um processo do qual é o primeiro e mais importante avalista. Lula precisa ser ajudado a assumir o seu papel de supremo-magistrado e, não, contestado.
O conceito estratégico de inteligência está sendo aviltado por milícias para-políticas, especializadas em arrombamentos e vazamentos, treinadas para lidar com sistemas informáticos de alta-segurança e produzir grosseiras falsificações. Também atuaram contra o governo (caso da espionagem da filha do ministro Mantega e na disputa pelo poder em Belo Horizonte). Nada muito diferente da operação contra a sede do Partido Democrata no edifício Watergate (Washington, 1972).
O governo, seus candidatos e apoiantes precisam compreender que a tática negacionista só ampliará a onda de denúncias. Uma série de rápidas providencias administrativas - incluindo o imediato licenciamento do Secretário da Receita Federal, Otacílio Cartaxo - interromperá o fluxo das revelações e impedirá o descrédito de um braço do estado de capital importância. Quando o eleitor sente-se lesado como contribuinte, não há marketing que o acalme.
A descontração da campanha eleitoral completa o clima de milagre econômico estampado na mídia internacional. Mas a liberação do riso não garante a sua perenidade. Já que saiu de moda chorar pela desgraçada Argentina convém evitar que se pergunte ao STF se é permitido soluçar pelo Brasil.
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