quarta-feira, dezembro 29, 2010

Orientação enxuta, cobrança forte

Orientação enxuta, cobrança forte
Rosângela Bittar – Valor Econômico
Dilma reconhece que o governo ficou devendo na Saúde
Ao convidar ministros a integrar sua equipe de governo que toma posse este sábado, Dilma Rousseff deu indicações precisas sobre os rumos que pretende dar a determinadas áreas da administração. Algumas, já eram conhecidas como problemáticas mas, outras, nem tanto. A presidente eleita disse, por exemplo, a Paulo Bernardo, ministro do Planejamento no governo Lula e ministro das Comunicações no futuro governo, que é preciso dar atenção total a uma regulação que possa superar a briga surda e crescente entre as empresas de telecomunicações e as TVs. Lembrou que há projetos tramitando no Congresso, pediu que fossem acompanhados, mas que o ministério não deixasse de entrar no assunto. Todos creem que a interferência tem que ser mais que cuidadosa, mas precisa existir. No governo, não há dúvidas de que as telecomunicações devem participar desse mercado, mas, como são gigantes perto das TVs, se não houver cuidado podem entrar arrebentando quem estiver no caminho.
A presidente orientou seu ministro a coordenar o programa de inclusão digital, o de banda larga e pediu uma atenção especialíssima à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, os Correios de tantas e tão denunciadas irregularidades administrativas jamais superadas, nicho de corrupção entregue há anos a partidos políticos. O começo do saneamento dos Correios poderá ser negando suas diretorias e seus principais cargos a políticos, estabelecendo-se ali a profissionalização. Quer, também, a presidente, que o Ministério das Comunicações passe a ter boa equipe de formulação, pois vem de vários anos a seco, sem qualquer proposta de política. Não se imaginava que o setor estivesse tão à matroca, mas pelas preocupações demonstradas, estava. Outro Ministério que Dilma pretende acompanhar com lupa é o da Saúde. Em que pese a intensa propaganda, os palanques eleitorais que não permitem reconhecer falhas, e a transferência de culpa à oposição que derrubou o imposto sobre o cheque -, que todos sabem ter tido a participação dos partidos governistas e não essas verbas jamais sido destinadas à Saúde - a presidente reconhece que o governo petista ficou devendo, e muito, na área. Foi isso o que disse ao destinar o cargo ao ministro Alexandre Padilha. Em nenhum momento dessas avaliações sobrou culpa para o atual ministro José Gomes Temporão. Apenas considera-se que ele chegou ao governo como um formulador, alguém que colocaria a máquina para funcionar, mas não conseguiu vencer as barreiras. Por isso foi substituído. Com o volume de recursos que há para a Saúde no orçamento de 2011 - R$ 77 bilhões - ter mais dinheiro não é absolutamente a prioridade. É preciso fazer acontecer a gestão, ir a fundo na execução das políticas, que, é evidente, tiveram administração frouxa. O ministro Padilha será cobrado direta e permanentemente pela presidente, e foi avisado disso. Na conversa demorada que tiveram, Dilma falou também das Fundações de Direito Privado, que não saíram do papel, e dos problemas profundos dos hospitais federais.
Uma terceira orientação política que já se conhece da presidente Dilma Rousseff é a transmitida ao novo ministro do Desenvolvimento Agrário, Afonso Florence. O balanço informal e real do governo Lula nessa área é que não é preciso mais assentar, a demanda está atendida, mas há tudo por fazer nos assentamentos. Há convicção de que é preciso dar ênfase em programas para melhorar a vida nos assentamentos.
Reduziu-se sensivelmente a demanda por terra, mas o assentado não tem estrada, saúde, escola, nada. A preocupação com a gestão é a constante na orientação da presidente. Desses três setores do governo sabe-se dos propósitos objetivos de Dilma mas há dois sobre os quais conhecem-se apenas as suas expectativas, e estas explicam um pouco os planos a serem executados e porque houve a troca de comando apesar do desejo de continuidade. Um, é a diplomacia, que passa da direção de oito anos de Celso Amorim para a de Antonio Patriota, braço direito do ministro que sai. No Palácio, permanece a assessoria firme nesta área de Marco Aurélio Garcia. Dilma espera, neste caso, porém, fazer algumas correções de rumo, estabelecer nuances, e preferiu, para que suas opções fiquem claras, estabelecer a nova política com outra equipe. Em direitos humanos, por exemplo, não há hipótese de negociação de princípios, e Amorim ficou muito identificado com a aliança ao governo do Irã. Quanto às relações com os Estados Unidos, a expectativa da presidente eleita é ir um pouco além da reafirmação de independência e autonomia: quer isto com aprofundamento das relações comerciais, vender e comprar, sem sombra de contradições. O outro caso, também simbólico, é o de Henrique Meirelles, cuja participação neste novo governo não foi ainda afastada de forma cabal, mas se for o será em outra área. Assim como Amorim, pelas histórias a respeito das razões pelas quais não ficou, dá para fazer conclusões a respeito da expectativa de Dilma Rousseff na política monetária.
O embate em torno da política monetária passa incólume do governo Lula para o de Dilma.
Assim, ao tirar Henrique Meirelles, a presidente quis dar sinais de redução do poder do mercado e ter ali um comando mais neutro. Meirelles, embora tenha feito tudo o que o governo quis, agradou também ao mercado, ou seja, fez tudo o que todo mundo quis. O governo Dilma, porém, tem um problema, baixar os juros. A troca de comando busca uma resposta a isto: como baixar os juros já que, para Dilma e sua equipe, o Brasil reduziu drasticamente a dívida pública líquida nos últimos anos, melhorou a situação fiscal e obteve grau de investimento das agências de risco sem resolver o problema. A mudança dá sinais desta expectativa da presidente. Embora ela saiba que não tem nada simples nessa seara e a contradição possa aparecer logo ali no primeiro mês de governo, com o aumento dos juros pelo Comitê de Política Monetária.

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