O diretor de Fiscalização, Alvir Hoffmann (foto), explicou que há indícios de que as mesmas carteiras de crédito tenham sido vendidas mais de uma vez |
quinta-feira, novembro 11, 2010
Quatro anos de fraudes
Quatro anos de fraudes
Para BC, irregularidades no PanAmericano são anteriores à compra pela Caixa
Patrícia Duarte, Geralda Doca e Ronaldo D’Ercole BRASÍLIA e SÃO PAULO – O Globo
Indícios reunidos pelo Banco Central (BC) apontam que as irregularidades supostamente cometidas pela cúpula do banco PanAmericano, que resultaram em rombo de quase R$ 2,5 bilhões, podem estar ocorrendo há três ou quatro anos. O banco foi comprado pela Caixa Econômica Federal em dezembro de 2009, ou seja, quando a maquiagem nos balanços já acontecia. Ontem, o diretor de Fiscalização da autoridade monetária, Alvir Hoffman, confirmou que o PanAmericano — do Grupo Sílvio Santos — continuava contabilizando em seu balanço carteiras de crédito que já tinha vendido ao mercado. A instituição também vendeu as mesmas carteiras para clientes diferentes, o que caracteriza duplicidade. Hoffman disse que pode ter havido, neste caso, crime de colarinho branco.
Para tentar burlar ainda mais a fiscalização, segundo o BC, os executores dessas operações irregulares a tratavam “dentro da lei”, pagando até Imposto de Renda sobre os “ganhos” obtidos com as carteiras que não pertenciam mais ao banco. A fraude foi sofisticada, indicando que havia muito conhecimento contábil para evitar rastros. A suspeita maior é de que tenha sido cometida para melhorar os bônus da diretoria, que dependem do desempenho do banco.
As investigações envolvem toda a cúpula do banco, como ex-diretores, alguns conselheiros e administradores.
Os executivos envolvidos podem ser alvo de sanção administrativa, ficando impossibilitados de atuar no mercado financeiro. Após o término das investigações do BC, se forem confirmadas as fraudes, será caracterizado crime financeiro — passível de pena de reclusão — e a apuração será encaminhada ao Ministério Público.
— Ele (PanAmericano) vem fazendo ao longo do tempo. Pode ter começado há três, quatro anos. Nós não temos esses dados ainda — disse Hoffman.
Embora as fraudes tenham sido descobertas há um mês, só na terça-feira o PanAmericano afastou os oito executivos que dirigiam o banco. Todos foram demitidos, inclusive o diretorsuperintendente, Rafael Palladino, o diretor de Relações com Investidores, Wilson De Aro, e o diretor de crédito e Administrativo, Adalberto Savioli, que também foi presidente da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento.
Auditorias não detectaram problema
A participação de 49% no PanAmericano foi comprada pela Caixa por R$ 739,2 milhões. A operação foi aprovada pelo BC em julho deste ano apenas do ponto de vista de concentração bancária. Era preciso ainda analisar a situação das contas e foi então que, em outubro, o BC descobriu a fraude. Segundo fontes do BC, o banco estatal não sofre porque só passaria a ser corresponsável pela gestão quando indicasse seus diretores. E isso ocorreu apenas ontem, depois que o rombo já tinha sido divulgado e os exdiretores, afastados. Em nota, o BC informou que a tarefa de fazer auditoria num processo de aquisição cabe aos contratados pelos envolvidos.
— Não houve falhas na fiscalização.
O BC encontrou o problema. O BC não fez nada de errado, quem fez foram eles (PanAmericano) — afirmou Hoffman.
Nem o banco público nem as empresas que trabalharam para a Caixa na formatação do negócio — o Banco Fator, a auditoria KPMG e a BDO Consultores — detectaram as operações infladas. Além disso, ficou claro que o trabalho de auditoria foi feito com números fornecidos pelo próprio PanAmericano, chancelados pela sua auditoria contratada, a Deloitte, e alocados numa base de dados.
O rombo total apurado pelo BC é de um pouco mais de R$ 2,4 bilhões.
Para cobrir o rombo, o Grupo Silvio Santos tomou empréstimo de R$ 2,5 bilhões no Fundo Garantidor de Crédito (FGC), formado com contribuições dos próprios bancos.
O BC considera a solução dada para evitar a quebra do PanAmericano perfeita, porque não causou prejuízos ao FGC nem aos acionistas do banco, como a Caixa.
— O único que perdeu foi o dono do banco — afirmou o diretor do BC.
O BC, diante disso, não colocará nenhum técnico ou interventor no PanAmericano para acompanhar os próximos passos. Considera o caso solucionado e só continuará apurando o que, de fato, causou o rombo. Hoffman descarta problemas de solvência em outros bancos e assegura a solidez do sistema financeiro nacional: — O banco está recuperado e segue vida normal. Não há evidências de suspeitas de problemas semelhantes.
Ontem, no Twitter, o assunto Banco PanAmericano chegou a ser o tópico mais comentado no Brasil.
Senado convoca presidente do BC
A Caixa se recusou a conceder entrevista ontem. Em nota, informou apenas que a CaixaPar (braço financeiro criado na crise internacional para comprar empresas) contratou o Banco Fator, que, por sua vez, contratou a KPMG para a auditoria. Posteriormente, a Caixa contratou a BDO Consultores para uma segunda opinião.
O Fator informou ter subcontratado a KPMG e o escritório Bocater para a avaliação jurídica do negócio. A KMPG informou, por nota, que “não atuou e não atua como auditor independente” do PanAmericano, tendo sido contratada para executar procedimentos de análise de dados de março de 2009 disponibilizados pelo banco.
Já a BDO enfatizou em nota que o escopo de seus serviços “não envolveu, de forma alguma, atividades relativas à diligência técnica”. O advogado Francisco Costa do Bocater explicou que os trabalhos ficaram restritos aos aspectos jurídicos.
A Deloitte, primeira a auditar o banco, informou que, de acordo com o seu Código de Ética e Conduta Profissional, “não emite comentários sobre situações relacionadas a clientes”.
Fontes do BC avaliam que, na compra do PanAmericano, a Caixa foi prejudicada pela avaliação errônea das auditorias. Em compensação, conseguiu que o Grupo Silvio Santos se comprometesse a honrar a operação.
— É evidente que um fato como esse levanta uma percepção de risco, o que não é ruim. É bom que depositantes e até controladores de outros bancos fiquem atentos que o mercado tem risco. Achar que não tem gera distorções como um subprime americano. A diferença é que aqui não há dinheiro público na operação para salvar a instituição — disse a fonte.
Com mais de 200 lojas e parceria com mais de 20 mil estabelecimentos comerciais, o PanAmericano não é um “banco de conta corrente” e atua predominantemente como financeira. No fim de 2009, o banco informava ter 2,1 milhões de clientes com algum tipo de crédito contratado. Patrocinador do Corinthians, o banco terá, por contrato, sua marca estampada nas camisas do clube até o fim do ano.
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou ontem requerimento do senador Antonio Carlos Magalhães Júnior (DEM-BA) convidando os presidentes do BC, Henrique Meirelles, e da Caixa, Maria Fernanda Ramos Coelho, para audiência na próxima quarta-feira.
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