sábado, abril 24, 2010

Ética na Medicina! Um exemplo!

Iniciando na profissão com a garra, esperança e certeza de mudar o mundo, enfrentei uma situação até então inusitada. Atendendo no ambulatório do Posto de Saúde, percebi uma jovem chorando na fila de espera, achando que poderia estar com alguma dor , solicitei à atendente que a fizesse entrar na frente e para minha surpresa não quis, alegando que aguardaria o final porque o que tinha pra me falar era muito sério. Claro que fiquei curioso e confesso que não via a hora de atendê-la. Depois de mais de duas horas de espera, enfim chegou sua vez e ao entrar no consultório, sentou-se e derramou-se em lágrimas. Esperei pacientemente que se acalmasse, quando então me descreveu a seguinte situação.
-Dr., tenho 15 anos , estou grávida e o Sr. precisa me ajudar a fazer um aborto pois além de não ter condições de criar essa criança, meu pai vai me expulsar de casa, pois tenho certeza que não vai aceitar a minha situação. Nesta altura, meu horário já tinha terminado e tinha que almoçar para começar outro serviço, mas resolvi dar-lhe atenção e depois de uma longa conversa e alegações de que nada justificava sua atitude, além de ser crime previsto em lei, me ofereci para contar e conversar com os pais dela o que de inicio foi retrucado por ela, alegando que não ia adiantar, mas que diante da minha insistência, por fim concordou. Prometi fazer seu pré-natal e ajudá-la em tudo que fosse possível.
Mãe chorosa, pai revoltado e a princípio irredutível, precisei de muito argumento e certa pressão para após longa e cansativa conversa, conseguir que a filha permanecesse em casa por um certo tempo e depois iriam enviá-la para casa de uma tia. Voltei a atendê-la por mais duas ou três vezes e depois perdi contato.
Passaram-se anos e num sábado, descansando em casa fui avisado que uma moça queria me falar, como de costume preparei-me para mais uma consulta, fato muito comum no interior e principalmente porque eu era o único médico do município. Qual não foi a minha surpresa ao vê-la com um menino de uns 7 anos e uma garotinha no colo.
-Vim agradecer-lhe e apresentar o Marco Antonio e essa aqui é sua irmãzinha.
Confesso que as lágrimas vieram-me aos olhos, nem tanto pelo fato do menino ter o meu nome, mas sim porque ali estava uma vida que só foi possível porque um dia, em final de expediente, não me omiti perante o drama daquela jovem.
Hoje, o Marco tem quase 30 anos, reside em minha cidade, casado, é pai de duas lindas garotas.Toda vez que o vejo, agradeço a Deus por ter-me feito médico e penso sempre que o aborto não impede somente o nascimento de uma vida, mas de toda uma geração.
Já não penso em mudar o mundo, mas continuo acreditando e lutando por um Brasil melhor e mais justo para as futuras gerações. 

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