sexta-feira, outubro 15, 2010

Nós e o Mar - Roberto Menescal

Cláudio Humberto

Cláudio Humberto
'Empate técnico' abre tempos de cólera no PT
O tempo fechou, no comitê de Dilma Rousseff (PT), ontem, com a divulgação da pesquisa CNT/Sensus apontando empate técnico com José Serra (PSDB), na disputa do segundo turno: 46,2 x 42,7%. Por ordem de Lula, o ministro da Propaganda, Franklin Martins, deu piti no comitê exigindo “pancadaria” no tucano. Antonio Palocci e o marqueteiro João Santana tentaram ponderar, e o tempo fechou.
“Não temos do que reclamar. Estamos na frente”
MICHEL TEMER, VICE DE DILMA, PARA QUEM O EMPATE TÉCNICO É “FORÇAÇÃO DE MÃO”
TÁ FEIA A COISA Razões para pânico: a distância entre Dilma e Serra caiu de oito para seis e ontem para apenas quatro pontos percentuais (CNT/Sensus).
CALADO! O presidente do PT, José Eduardo Dutra, há dias deixou de tuitar: após entrevista admitindo erros no primeiro turno, levou uma bronca federal.
GELEIRA CHILENA Os mineiros do Chile são pé-quente. Já imaginou Lula “dando uma forcinha” in loco, caso Dilma fosse eleita no primeiro turno? Toc-toc.
DESVIO Dilma cancelou um comício com Lula hoje em Londrina (PR), onde estará o tucano José Serra com o governador Beto Richa (PSDB).
EMPRESA FICA EM 7º, MAS LEVA LICITAÇÃO NO TCU O Tribunal de Contas da União fiscaliza licitações e o uso dos recursos públicos, mas quem fiscaliza o TCU? A pergunta não se cala para seis licitantes no TCU, desclassificados um a um até ser declarada vitoriosa a empresa que ficou em sétimo, na disputa pelo contrato de R$ 436,2 mil para manutenção de jardinagem. A vencedora, Florart Paisagismo Ltda, que coincidência, já presta serviços há cinco anos para o TCU.
JEITINHO O TCU desclassificou as seis licitantes sob alegações bobas, mas a vencedora teve a chance de “ajustar” e recompor sua proposta.
MUITO ESTRANHO Um “Atestado de Capacitação Operacional do Crea”, que não existe, estava entre as exigências eliminatórias na licitação do TCU.
DESCULPA O TCU informou que a proposta vencedora concordou em fechar seu contrato por um valor 7,51% menor que o valor estimado. Ah, bom.
DESPREPARO A candidata do PSC ao governo do DF, Weslian Roriz, fugiu do debate, ontem, com seu adversário Agnelo Queiroz (PT). Em carta à Band, ela alegou que não teve tempo para se preparar. Imaginem para governar.
A FICHA QUE CAI E... D. Weslian e o vice Jofran Frejat, contaram horário eleitoral que numa madrugada “caiu a ficha” e Joaquim Roriz desistiu de disputar o governo do DF. Só não explicaram qual ficha caiu: a limpa ou a suja?
...A INSÔNIA QUE VEM No seu relato, Jofran conta que, caída a ficha, Roriz ligou pra ele ainda de madrugada. “Jofran, você está acordado?” Ele: “Claro, governador. Eu sou cirurgião!...” Como confiar em cirurgião que não dorme?
BAIXARIA INVESTIGADA A OAB abriu processo disciplinar contra Clauber Madureira Guedes, advogado acusado de oferecer R$ 200 mil a um homem para fazer na TV falsa acusação a Agnelo Queiroz (PT), candidato ao governo do DF.
GRANDE PERDA Outro ministro do Supremo Tribunal Federal que pode antecipar sua aposentadoria, lamentam advogados de Brasília, é o decano Celso de Mello, cujas esplêndidas decisões fazem história no STF.
ATAQUE DESNECESSÁRIO Até petistas do Piauí reprovaram o ataque feroz de Lula aos senadores Mão Santa (PSC) e Heráclito Fortes (DEM), derrotados dia 3, durante o comício de Dilma em Teresina. Foi como chutar cachorro morto, dizem.
UMA VEZ SINDICALISTA... Ex-bancário, o ex-ministro da Previdência Ricardo Berzoini, que pôs na fila velhinhos de 90 anos, festejou a “força da categoria”, na greve que infernizou os clientes. Mas os bancos nunca foram tão felizes com Lula.
MOINHOS DE VENTO Derrotado ao Senado, o ex-prefeito do Rio Cesar Maia (DEM) acha que Marina Silva alavancará o PV se entrar no 2º Turno. “Síndrome de Dom Quixote acaba com ele abraçado ao seu cavalo e a Sancha Pança.”
UMA BOA IDEIA Deve ter sido Lula quem agendou o encontro “pacificador” de Dilma com os líderes evangélicos ontem. Foram exatamente 51...
PODER SEM PUDOR
MINISTRO DIURÉTICO
Mário Andreazza era ministro do Interior e visitava projetos de irrigação em Petrolina (PE). A programação foi longa, corrida, somente interrompida pelo almoço na usina de açúcar Mandaçu. De repente, o aflito Andreazza abandona o cordão de puxa-sacos e parte célere para o sanitário. Como ninguém sabia para onde ele se dirigia, todos o seguiram. Até serem interceptados por um atento segurança, com sua voz de comando:
- Senhores, por favor... o ministro vai urinar! - e ainda foi mais enfático - Xixi, mijar!...

Bicarbonato de sódio

 Bicarbonato de sódio
Súbita, uma angústia...
Ah, que angústia, que náusea do estômago à alma!
Que amigos que tenho tido!
Que vazias de tudo as cidades que tenho percorrido!
Que esterco metafísico os meus propósitos todos!
Uma angústia,
Uma desconsolação da epiderme da alma,
Um deixar cair os braços ao sol-pôr do esforço...
Renego.
Renego tudo.
Renego mais do que tudo.
Renego a gládio e fim todos os Deuses e a negação deles.
Mas o que é que me falta, que o sinto faltar-me no estômago e na
circulação do sangue?
Que atordoamento vazio me esfalfa no cérebro?
Devo tomar qualquer coisa ou suicidar-me?
Não: vou existir. Arre! Vou existir.
E-xis-tir...
E--xis--tir ...
Meu Deus! Que budismo me esfria no sangue!
Renunciar de portas todas abertas,
Perante a paisagem todas as paisagens,
Sem esperança, em liberdade,
Sem nexo,
Acidente da inconsequência da superfície das coisas,
Monótono mas dorminhoco,
E que brisas quando as portas e as janelas estão todas abertas!
Que verão agradável dos outros!
Dêem-me de beber, que não tenho sede!
Álvaro de Campos, um dos heterônimos de

Fernando Pessoa
(1888-1935)

Pires


Uma viagem ao interior

Uma viagem ao interior
Milton Hatoum
Não conhecia Alumínio, um município paulista perto de São Roque, que todos conhecem por ser uma cidade histórica cercada por serras. No passado, esse relevo verde fazia parte da mata atlântica. Hoje, apenas um parque sobreviveu a essa floresta. Fundada há mais de quatro séculos por bandeirantes, a história de São Roque - capela, fazenda e escravos - diz muito sobre a história de São Paulo e do Brasil.
Mas Alumínio, muito mais recente, também tem uma história. A diretora da biblioteca me mostrou com orgulho várias fotografias antigas de seu município. Vi a estação ferroviária de Rodovalho, construída em 1899; vi a imagem de um trem que atravessava o vale; vi trabalhadores negros vigiados por um capataz que, na foto, estava de costas e usava um chapéu branco; vi enormes manchas escuras que formavam a mata exuberante das serras. E quando olhei através da janela da biblioteca, vi um relevo de eucaliptos, como se fossem bosques tristes na paisagem de Alumínio.
Perguntei à diretora da biblioteca quem tinha sido Rodovalho. O dono de uma fábrica de cimento, ela disse. Depois acrescentou: coronel Rodovalho: Antônio Proust Rodovalho.
Proust?, perguntei, soletrando o sobrenome do grande escritor francês.
Proost, ela soletrou, mitigando minha obsessão pela literatura.
O que pode fazer uma única vogal! Olhei o céu acinzentado de Alumínio e, sob esse céu cor de cimento, avistei um amontoado de casas inacabadas, erguidas na mesma serra que acabara de ver numa das fotografias antigas. Disse a mim mesmo que a paisagem urbana não é menos tenebrosa que a natureza devastada. E perguntei à diretora como se chama aquele bairro que crescia na serra.
Alvorada, ela respondeu. Os estudantes já chegaram, mas ainda temos tempo para um café.
Tomei um gole, e enquanto relia o roteiro da minha palestra, a chuva caiu com um estrondo. Gotas grossas, pesadas e ruidosas, que desabavam inesperadamente e me recordaram a chuvarada no equador e o cheiro da floresta.
Alvorada é também o nome de um bairro pobre de Manaus, um bairro que eu havia esquecido e agora reaparecia na minha memória, com suas casas de madeira amontoadas à beira de um igarapé sujo. Nas tardes de sábado eu dava uma carona para Eliandra, a faxineira do edifício onde eu morava. Entrava no bairro, um labirinto de ruas estreitas e esburacadas, e deixava Eliandra perto de uma escada íngreme, que ela subia até alcançar uma rua de terra no alto de um barranco. Uma tarde quis visitar sua casa, ela me disse: no próximo sábado.
Eliandra me disse que morava com um motorista de caminhão, mas não conheci esse motorista. Conheci a casa de madeira, cuja fachada de tábuas empenadas e sem pintura debruçava-se sobre um abismo. Eliandra me serviu café e bolo de macaxeira. Abriu um álbum, onde vi imagens de passeios pelo Rio Negro, ela e o motorista no convés de um barco de linha. Eram felizes, ou pareciam felizes naquele passeio. A casa era apenas um quarto, uma saleta e uma cozinha. O banheiro ficava do lado de fora e não havia esgoto. Perguntei se ela estudava ou se tinha estudado, e ela disse não. Depois disse: mas quero muito. Sabia costurar: nossa roupa, as cortinas, as toalhas de mesa... Costuro qualquer coisa, disse Eliandra. E num sábado, quando dei a última carona, ela me revelou que morava sozinha, o motorista tinha sumido no ano passado: foi embora sem me dizer uma palavra. Nem um bicho faz isso. Chorou quando eu disse que ia morar longe de Manaus. Mas quis ficar com o meu gato de estimação e prometeu que ia cuidar dele. Como se fosse meu, ela disse.
Quando a chuva parou, tomei mais um gole de café e me dirigi ao auditório da biblioteca de Alumínio.
E assim começou minha viagem literária pelo interior de São Paulo.

Saiba Mais - Aborto

Rua Prudente de Morais, Olinda, Pernambuco, Brasil


Just do it, abutres!

Just do it, abutres!
BARBARA GANCIA
Um jornalista da CNN ousou dizer que o ocorrido tem tanto significado quanto a chegada do homem à Lua
E SE VOCÊ FOSSE um dos mineiros chilenos, meu nobre leitor? Tempo não teria lhe faltado para pensar na mensagem que você ia querer enviar ao mundo na volta do inferno, não?
Pois como você emergiria do fosso maldito? Dando um abraço acanhado na sua amante como o mineiro infiel, Yoni Barrios? Reivindicando melhores condições para sua categoria como Mário Sepúlveda, o segundo a ser resgatado?
Nos anos 60, a TV Excelsior costumava reprisar um filme chamado "Como Era Verde o Meu Vale", sobre as agruras de uma família galesa de mineradores. Pelo que me lembro do sofrimento mostrado no filme, acho que teria preferido me juntar a Ingrid Betancourt em seus anos de cativeiro na selva colombiana a passar um dia sequer dentro de uma mina de carvão no País de Gales no início do século 20.
Mas se sempre me compadeci com mineiros por conta do clássico de John Ford ("Como Era Verde o Meu Vale" conquistou Oscar de melhor filme e melhor diretor de 1942), foi outro filmaço sobre, digamos, um drama subterrâneo, desta vez do fabuloso Billy Wilder, que me deixou para sempre com a pulga atrás da orelha em relação à minha profissão. "A Montanha dos Sete Abutres", de 1951, é uma das melhores críticas ao jornalismo que o cinema já perpetrou.
Na época em que "Big Brother" existia apenas no livro de Orwell, Billy Wilder já se dava ao trabalho de ironizar o sensacionalismo e deixar claro que ele não existiria se o público não tivesse uma devoção especial por histórias sórdidas.
Kirk Douglas, no auge da sua canastrice característica, é um jornalista marrom que resolve transformar o acidente que deixa um escavador preso dentro de uma mina abandonada em circo midiático.
O caso dos mineiros chilenos no deserto do Atacama gera curiosidade pelo inusitado do acontecimento. Até aí, não reclamo. Mas nos últimos dias vi muita gente tratar o assunto como se estivesse assistindo a um reality show, só faltou o Pedro Bial para mediar o resgate.
Um jornalista da CNN ousou dizer que o ocorrido tem tanto significado quanto a chegada do homem à Lua. Um bilhão de espectadores com os olhos grudados por horas a fio na TV mais a presença de 1.300 jornalistas, iluminadores e operadores de áudio do mundo inteiro presentes ao acampamento improvisado em Copiapó parecem atestar a importância do fato.
O triunfo da resistência em situações extremadas e da sobrevivência contra qualquer adversidade traz conforto, inspira e comove até o mais implacável dos "voyeurs".
Não sabemos ainda de que maneira os acontecimentos de Copiapó irão nos transformar. Mas sabemos que se "A Montanha dos Sete Abutres" ganhasse uma nova versão, o filme fatalmente teria de levar o mercado em conta.
Se estivesse na pele de um dos mineiros, antes de abraçar o presidente ou a minha vovozinha, eu teria me voltado para as câmeras e exclamado: "Que saudades dos carros da Subaru, da operadora Vivo e dos produtos da L'Oréal!" Quem dorme no ponto é passageiro virado. Ou então executivo de marketing da Ray-Ban. Que jogada genial da Oakley de mandar óculos de sol para cada resgatado, não?
barbara@uol.com.br  @barbaragancia www.barbaragancia.com.br

DEPOIS DO SEXO - Mulheres preferem carinhos, homens pedem uma bebida

DEPOIS DO SEXO - Mulheres preferem carinhos, homens pedem uma bebida
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA - Enquanto as mulheres querem prolongar o momento íntimo após o sexo discutindo a relação ou declarando amor, os homens preferem fumar, comer ou tomar alguma bebida.
É o que aponta estudo publicado no "Journal of Sex Research" e divulgado no site do britânico "The Telegraph".
Segundo os pesquisadores, alguns homens tentam aproveitar o momento pós-coito para pedir um favor às parceiras, enquanto eles relaxam.
Susan Hughes, da Albright College na Pensilvânia (EUA), afirmou que as mulheres ainda buscam intimidade: "Elas estão mais propensas a querer beijar e abraçar após o sexo".
Segundo a pesquisa, as mulheres usam relacionamentos breves para avaliar o grau de intimidade com um homem e checar se ele terá condições de ser bom pai no futuro.

SPONHOLZ


FHC desafia Lula a debater 'cara a cara'

FHC desafia Lula a debater 'cara a cara'
Roberto Almeida - O ESTADO DE S. PAULO
FHC: “Quero ver o presidente Lula, que fez o PT votar contra o Real, dizer que estabilizou o Brasil”
Em discurso inflamado para tucanos, ex-presidente classifica sucessor de 'mesquinho' e de mentir 'sem cessar' sobre o País que encontrou ao assumir mandato
SÃO PAULO - Em sua mais contundente incursão na campanha tucana até agora, que incluiu a defesa de seu legado à frente do Palácio do Planalto, o ex-presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, desafiou ontem o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para um debate "cara a cara" após o fim das eleições.
Diante de centenas de militantes do PSDB, em um hotel na zona norte da capital paulista, FHC pediu a Lula que, quando "perder o monopólio da verdade", vá ao instituto que leva seu nome, em São Paulo, para debater. "Presidente Lula, quando acabar as eleições, quando você puser o pijama, será bem recebido. Venha ao meu instituto, vamos conversar, cara a cara", bradou, em discurso inflamado.
O ex-presidente, dizendo-se alvo de mentiras, passou a defender suas gestões na Presidência (1994–2002). As cenas, gravadas por uma equipe da campanha do presidenciável tucano José Serra – que não esteve no evento –, devem ir ao horário eleitoral.
"Estou calado há muitos anos ouvindo. Agora quando o presidente Lula vier, como deve vir, como todo presidente democrata eleito, perder a pompa toda, perder o monopólio da verdade, está desafiado a conversar comigo em qualquer lugar do Brasil", disse FHC.
"Não é para conversar para dizer o que eu fiz, o que ele fez. Isso o povo vai julgar. É para ter firmeza, olhando cara a cara, um ao outro, e ver se um é capaz de dizer ao outro as coisas que diz", continuou o ex-presidente.
Como exemplo dos pontos que abordaria no debate com Lula, FHC citou o Plano Real, principal bandeira tucana, e disse que questionaria o petista sobre as responsabilidades pela estabilização econômica do País.
"Quero ver o presidente Lula, que votou contra o Real, que fez o PT votar contra o Real, dizer que estabilizou o Brasil. Ele não precisa disso. Ele fez coisas boas que eu reconheço. Ele agiu bem na crise atual, financeira. Para que, meu Deus, ser tão mesquinho? É isso que quero perguntar a ele: ‘Lula, por que isso, rapaz?’", bradou.
Aos militantes tucanos, o ex-presidente apostou na veemência para que seu nome, antes escondido nas campanhas, passe a ser defendido abertamente.
"Eu não tenho do que me arrepender. Eu mudei o Brasil. Eu nunca disse isso. Agora, oito anos depois do governo Lula (digo que) eu mudei o Brasil. Não mudei sozinho, mas com o povo brasileiro, com uma equipe de gente competente, com outros partidos. Tudo o que foi inovador foi plantado naquele período. Chega de ficar calado", afirmou FHC.
Privatizações. O ex-presidente elevou o tom e pediu "respeito" ao rebater nota divulgada ontem pelo presidente da Petrobrás, José Sérgio Gabrielli, que o acusou de preparar a estatal para a privatização.
"Quem é esse Gabrielli pra falar isso pra mim, meu Deus? Eu mandei uma carta ao Senado para dizer que não privatizaria a Petrobrás. Eu perdi uma cátedra porque eu defendi a Petrobrás e fui processado", anotou FHC.
De acordo com FHC, a "politicalha" voltou avançar sobre a estatal após sua saída do governo. "Por isso, perdeu já 20% do valor de mercado sob a batuta dessa gente. O mercado, assim chamado, percebeu agora – custou – que tem ingerência política", anotou.
Ao final do discurso, o ex-presidente lembrou ainda a queda da ex-ministra chefe da Casa Civil, Erenice Guerra, acuada por denúncias de lobby no Planalto. "Não queremos um Brasil de preguiçosos, não queremos um Brasil de amigos do rei. Nós não queremos um Brasil de companheiras tipo Erenice", anotou FHC, que pediu "apoio total" à candidatura de Serra.

Rio - Roberto Menescal

Religião e eleições

Religião e eleições
MARIA DAS DORES C. MACHADO – O GLOBO
A grande importância que o tema do aborto adquiriu no debate público e na agenda dos candidatos à Presidência antecipa os desafios a serem enfrentados pelos movimentos feministas no próximo governo, mas também põe em xeque uma série de ideias do senso comum sobre o universo evangélico brasileiro e, mais precisamente, sobre a atuação política dos pentecostais.
Um primeiro ponto a ser destacado se refere ao fato de que num pleito onde, pela primeira vez em nossa sociedade, duas mulheres disputaram a Presidência da República e receberam 66% dos votos válidos no primeiro turno, o avanço das conquistas feministas ficou ofuscado pela importância que passou a ter a posição e o engajamento dos líderes religiosos — católicos, espíritas, evangélicos — nas campanhas das duas candidaturas femininas e na discussão em torno do aborto.
Ainda que a posição em defesa da vida perpassasse os diferentes segmentos cristãos, deve-se registrar que no primeiro turno ocorreu uma divisão tanto entre os católicos quanto entre os evangélicos em torno das duas candidaturas femininas. No campo católico, enquanto alguns líderes — como o bispo da Diocese de Guarulhos, D. Luiz Gonzaga Bergonzini — manifestaramse publicamente contra Dilma e o PT pelas posições do partido em relação ao tema, outros membros da hierarquia católica, como o sacerdote Gabriel Cipriani, foram ao “Encontro de Dilma com os cristãos”, realizado em Brasília no dia 29 para tratar da temática, e gravaram depoimento de apoio à sua candidatura, afirmando acreditar no seu compromisso de manter o diálogo com os grupos religiosos em relação a esta questão.
No campo evangélico, caracterizado pela heterogeneidade e pela intensa competição entre os grupos confessionais, também se verificou uma profunda divisão, com alguns líderes apoiando Dilma e outros defendendo a candidatura de Marina Silva, uma pentecostal cujo partido tem uma posição bem mais liberal do que a de sua candidata.
Assistiu-se, por um lado, à distribuição gratuita para os fieis pentecostais de DVDs do pastor Silas Malafaia em templos do Rio, assim como do vídeo do pastor batista Paschoal Piragine Jr, do Paraná, pregando votos contra a candidatura que defendia o tratamento do aborto como uma questão de saúde pública. Por outro lado, constatou-se que cartas de apoio foram veiculadas em blogs e sites pessoais e institucionais, como a do bispo Edir Macedo, da Igreja Universal do Reino de Deus, e declarações de voto de confiança na candidata petista foram gravadas por parte de líderes das mais distintas denominações: um dos mais proeminentes é o pastor Manoel Ferreira, da Assembleia de Deus, demonstrando que o conservadorismo moral em segmentos pentecostais encontra no pragmatismo de líderes um poderoso antídoto para uma posição alinhada em favor da candidatura da “irmã” de fé, que desde o início de sua participação na disputa eleitoral deixou claro sua posição contra a descriminalização do aborto e afinada com os valores tradicionalistas do pentecostalismo.
Deve-se destacar ainda que Marina Silva, embora conte com inegável carisma e uma postura física mais próxima da base social do movimento pentecostal, partilhou com Dilma e Serra os votos dos eleitores pentecostais.
A votação da representante do PV, apesar do aumento surpreendente na última semana, não pode ser explicada apenas pelo voto evangélico. Se, para além da confissão religiosa, a história de vida de Marina apresenta pontos de contato com a da grande maioria dos pentecostais, o tamanho e a ideologia do PV serviram de contraponto na disputa dos votos nesse segmento social. Dito isso, argumento que a definição dos votos dos eleitores pentecostais passa por outras variáveis do que a simples confissão de fé do/a candidato/a.
Em suma, se os votos dos católicos, evangélicos e espíritas — grupos confessionais que tendem a ter posições mais inflexíveis com relação ao aborto — se distribuem entre os candidatos, não faz sentido os dois postulantes à Presidência caírem na armadilha de pautar o debate pelos temas morais que só interessam aos tradicionalistas e fortalecem os atores religiosos que procuram fazer de uma questão que atinge milhares de mulheres brasileiras uma moeda de troca no jogo eleitoral.
As trajetórias políticas de José Serra e Dilma Rousseff têm mais afinidades com a conquista histórica do Estado laico do que com a interferência das instituições religiosas na política institucional.
Da mesma forma, os dois candidatos têm clareza dos custos de uma legislação restritiva no campo da interrupção da gravidez para a saúde pública e sobre quem recai o ônus da criminalização do aborto e, por isso mesmo, não podem abandonar o compromisso com as mulheres mais pobres de nossa sociedade, as mais prejudicadas com o uso eleitoreiro do tema do aborto.
MARIA DAS DORES C. MACHADO é professora da UFRJ.

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