sexta-feira, outubro 15, 2010

As lições da mina

As lições da mina
EDITORIAL - FOLHA DE SÃO PAULO
Resgate de mineiros no Chile traz dividendos para o novo presidente, que promete melhorar as condições de trabalho na extração do cobre
O mundo acompanhou, entre a apreensão e o alívio, a exitosa operação de resgate dos 33 trabalhadores que ficaram confinados por mais de dois meses em uma mina no deserto do Atacama.
O presidente dos EUA, Barack Obama, resumiu o clima de congraçamento mundial em torno do final feliz do que esteve perto de ser uma tragédia. "Esse resgate é um tributo não apenas aos trabalhadores da equipe de socorro e do governo, mas também à união do povo que inspira o mundo", disse.
A compreensível atmosfera festiva que se sucede a um desfecho como esse não deve, porém, deixar em segundo plano a situação de risco diário enfrentada pelos trabalhadores nessas e em outras minas do Chile -e do mundo.
O segundo homem a ser resgatado, Mario Sepúlveda, destoou dos demais ao criticar a segurança no setor minerador. "Este era o momento de fazer mudanças. Este país tem de entender que é preciso fazer mudanças", afirmou.
O cobre, do qual o Chile é o principal produtor mundial, impulsiona a economia do país e ajuda a fazer dele o mais avançado da América do Sul, o único do subcontinente a integrar a OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico), sigla que reúne as nações mais desenvolvidas do mundo.
Os 5,4 milhões de toneladas do mineral produzidos anualmente pelo Chile abastecem 37% da demanda mundial. Os setores de energia, infraestrutura e mineração respondem por mais de dois terços dos 709 planos de investimento, no valor total de US$ 133 bilhões, ora em andamento no país. Além do cobre, a extração de carvão também se destaca -é a quinta maior no mundo.
Por trás desses números, há milhares de mineiros trabalhando em condições perigosas e insalubres. Só neste ano, 31 deles não tiveram a mesma sorte dos colegas da mina de San José e sucumbiram a acidentes. Ainda assim, o Chile é considerado um dos mais seguros no setor. Na China, por exemplo, onde acidentes fatais em minas são mais frequentes, a cobertura do resgate foi censurada na imprensa estatal.
O presidente do Chile, Sebastián Piñera, soube ganhar dividendos políticos com o episódio. Sob holofotes, diante das câmeras de TV, recebeu na saída da mina cada um dos 33 trabalhadores. Numa frase feita, disse que a maior riqueza do Chile não é o cobre, mas sim os mineiros -e prometeu promover mudanças como as exigidas por Sepúlveda.
"Não podemos garantir que não haverá mais acidentes. Mas podemos garantir que nunca mais se trabalhará em condições tão desumanas", anunciou o presidente, que tomou posse em março.
O resgate consumiu US$ 22 milhões e foi mais rápido do que o previsto -falava-se que os mineiros poderiam permanecer soterrados até o Natal. O êxito da empreitada dá ao presidente chileno plenas condições políticas para endurecer a legislação e ampliar a fiscalização sobre as mineradoras. Caso isso ocorra, o sofrimento dos 33 trabalhadores e de suas famílias não terá sido em vão.

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