sexta-feira, outubro 15, 2010

Adulteração e sonegação

Adulteração e sonegação
RODOLFO LANDIM
A sonegação no mercado de combustíveis quase sempre vem associada a operações de adulteração do produto
FRAUDES E DISTORÇÕES não são uma novidade no mercado brasileiro de combustíveis. Desde 1994, aproveitando-se da falta de jurisprudência em relação à substituição tributária nas refinarias, de deficiências na fiscalização tributária, da complexidade da legislação e da prática sistemática de anistias (Refis) pelos órgãos estaduais e federais de arrecadação, alguns empresários especializaram-se em buscar formas de fraudar os tributos.
Uma verdadeira fábrica de liminares foi criada para contestar a tributação e a regulamentação da Agência Nacional do Petróleo (ANP). A partir da criação de distribuidoras "barriga de aluguel", alguns empresários praticam sistematicamente a sonegação da Cide, do PIS/Cofins e/ou do ICMS. Entre as práticas mais comuns, destacam-se:
1) a sonegação de tributos no diesel, devido a alíquotas de ICMS diferenciadas entre Estados;
2) venda de álcool supostamente para outros fins, com menor incidência de carga tributária;
3) falsa operação interestadual de etanol hidratado;
4) venda de álcool hidratado com nota fiscal de anidro (que, por ser misturado à gasolina, não paga imposto ao sair da usina);
5) reutilização de uma mesma nota fiscal;
6) venda sem nota fiscal.
As "barrigas de aluguel" não possuem ativos e operam unicamente intermediando as operações. Essas distribuidoras são abertas e fechadas com grande velocidade, engordando as contas bancárias de seus proprietários e deixando passivos tributários significativos.
Segundo o Sindicom (Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis e de Lubrificantes), essa perda tributária, apenas no álcool hidratado, pode chegar a R$ 1 bilhão em 2010, valor equivalente ao custo de construção de 100 mil casas populares.
A sonegação vem quase sempre associada a uma operação de adulteração. Em quase todos os casos de sonegação, é possível identificar a ação, pelo mesmo agente, de uma das seguintes práticas:
a) adulteração da gasolina com solventes (mais baratos) ou adição de álcool anidro em percentual acima do permitido por lei;
b) adulteração dos medidores de combustível das bombas;
c) produção clandestina de gasolina com sonegação de tributos e baixa qualidade;
d) postos misturando álcool hidratado na gasolina;
e) venda de diesel interior em regiões metropolitanas;
f) venda de diesel sem biodiesel ou desvio do diesel marítimo (exemplo: o diesel importado foge do controle de compra de biodiesel via Petrobras);
g) adulteração de álcool hidratado com metanol;
h) venda de álcool com elevado teor de água.
Com isso, perdem os consumidores, que sofrem perdas econômicas diretas, ao pagar por volumes menores, e indiretas, que decorrem dos problemas causados nos seus veículos. Perdem as distribuidoras e os revendedores éticos, que sofrem prejuízo ao competir com preços predatórios e têm sua imagem desgastada. Por fim, perdem a sociedade e o Estado, que veem a receita e a capacidade de investimento reduzidas.
Mas a realidade é que as margens apertadas e o alto valor dos impostos envolvidos criam um ambiente favorável para a existência de uma competição desleal através de sonegação e adulteração, caso essas não sejam combatidas.
A resposta a esse problema passa pelo uso das novas ferramentas e bases de dados, atualmente disponíveis, para identificar e inibir as fraudes. A partir da adoção da Nota Fiscal Eletrônica em alguns Estados é possível, cruzando dados do produtor e da distribuidora com os dados de coleta de preço da ANP, identificar indícios de fraudes, como a prática de preços abaixo do custo, o desvio de uso de etanol e o uso de solventes, entre outros.
A partir daí é fundamental a atuação conjunta da ANP, do Legislativo, do Executivo e do Judiciário em ações de repressão, cassando a inscrição estadual das empresas responsáveis, acabando com as fábricas de liminares e punindo os envolvidos para acabar de uma vez por todas com práticas em que apenas os fraudadores ganham.
RODOLFO LANDIM, 53, engenheiro civil e de petróleo, é conselheiro da Wellstream. Trabalhou na Petrobras, onde, entre outras funções, foi diretor-gerente de exploração e produção e presidente da Petrobras Distribuidora. Escreve quinzenalmente, às sextas-feiras, nesta coluna.

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