sábado, setembro 11, 2010

O que é a natureza... #fotografia #photography #fojornalismo #photog Litoral sul RN #botequimtuitajoaquim by Johnguardacosta

Receita orientou fraude em procurações, diz servidora

Receita orientou fraude em procurações, diz servidora
Bruno Tavares e Roberto Almeida O ESTADO DE S. PAULO
A servidora da Receita Federal Ana Maria Caroto Cano, investigada pela quebra de sigilo fiscal de cinco pessoas ligadas ao candidato José Serra (PSDB), afirmou à Polícia Civil de São Paulo que foi orientada pela Corregedoria do Fisco para "encobrir" violações de dados fiscais. O corregedor-geral da Receita, Antonio Carlos Costa d"Ávila, nega. A servidora foi levada a prestar depoimento sobre as quebras de sigilo após denúncia do aposentado Edson Pedro dos Santos. Ele acusou o marido da servidora, José Carlos Cano Larios, de tentar fazer com que assinasse uma procuração em seu nome para acessar dados da Receita. Segundo o depoimento de Santos, o marido de Ana Maria bateu à porta de sua casa há cinco dias e disse: "Minha mulher é funcionária da Receita, eu preciso que o senhor assine aqui dando autorização para que ela acesse suas declarações de renda dos exercícios 2007 e 2008."
Receita orientou fraude, diz servidora
Funcionária afirma em depoimento à Polícia Civil que foi orientada pela corregedoria do Fisco para "encobrir" violações de dados fiscais
Ana Maria Caroto Cano, servidora da Receita investigada pela violação de sigilo fiscal de cinco pessoas ligadas ao presidenciável José Serra (PSDB), afirmou em depoimento à Polícia Civil de São Paulo que foi orientada pela corregedoria do Fisco para "encobrir" violações de dados fiscais.
A servidora foi levada a prestar depoimento sobre as quebras de sigilo no 1º Distrito Policial de Mauá (SP) após denúncia do metalúrgico aposentado Edson Pedro dos Santos. Ele acusou o marido da servidora, José Carlos Cano Larios, de tentar fazer com que assinasse uma procuração em seu nome para acessar dados da Receita.
Segundo o depoimento de Santos obtido pelo Estado, o marido de Ana Maria bateu à porta da casa dele na última segunda-feira e declarou: "Minha mulher é funcionária da Receita, eu preciso que o senhor assine aqui dando autorização para que ela acesses suas declarações de renda exercícios 2007 e 2008. Quem fez esse pedido é o contador que fez suas declarações."
Santos pegou a procuração, mas não assinou. No dia 7 de setembro ele procurou seu contador e o indagou sobre o caso. "Você pediu acesso ao meu Imposto de Renda?" O contador negou e o aconselhou a procurar a polícia. No dia 8 o aposentado deixou uma carta no 1.º Distrito Policial de Mauá narrando o que tinha acontecido.
Ontem, ele disse que não imaginava que seu caso tivesse relação com o escândalo de violações de sigilo na Receita. Em 2008 ele foi candidato a vereador de Mauá pelo PPS. "Fiquei na dúvida. Ainda bem que meu contador me alertou para procurar a polícia. Até agora mão sei explicar por que queriam acessar meus dados."
Segundo o delegado Marcos Carneiro, chefe do Departamento de Polícia Judiciária da Macro São Paulo (Demacro), Ana Maria e seu marido afirmaram que as assinaturas começaram a ser colhidas a pedido da corregedoria do Fisco, após a série de reportagens sobre o escândalo.
O objetivo, segundo a funcionária da Receita, seria o de "justificar" acessos ilegais a declarações de Imposto de Renda. Segundo a polícia, Ana Maria foi indagada sobre quem na corregedoria a teria orientado a "encobrir" as violações de dados fiscais, mas não citou nomes.
"Segundo ela, (as autorizações) são de pessoas que pediram favores e ela teria feito o acesso", afirmou o chefe da Demacro. "Quando começou a reportagem maciça, Ana Maria foi orientada, segundo ela, por funcionários da corregedoria da Receita, para que declarassem que o acesso aos dados foi por vontade própria. Isso não corresponde. Esse cidadão (o metalúrgico aposentado) foi o primeiro que achou estranho", afirmou Carneiro.
Ana Maria Caroto Cano é filiada ao PMDB-SP desde setembro de 1981. Segundo a corregedoria do Fisco, que a investiga, partiram do computador dela acessos supostamente imotivados a 114 CPFs.
Reação. O corregedor-geral da Receita, Antonio Carlos Costa D"Avila, reagiu, em nota, à declaração de Ana Maria sobre a "orientação" do órgão . "A Corregedoria-Geral da Receita Federal do Brasil contesta e repudia a informação divulgada pela imprensa de que haveria orientado a servidora Ana Maria Rodrigues Caroto Cano, que está sob investigação, a providenciar qualquer documento para encobrir ou justificar irregularidades cometidas."

Milágrimas | Ná Ozzetti


Amâncio, para Tribuna do Norte

Bebê a bordo

Bebê a bordo
Fernando de Barros e Silva FOLHA DE S. PAULO
SÃO PAULO - A pequena Dilma está sentada na sua cadeirinha, os pezinhos soltos no ar, no banco traseiro do carrão de Lula. Supomos que o carrão seja de Lula (só pode ser), uma vez que no banco da frente tudo o que conseguimos divisar são dois vultos engravatados, atrás do vidro escurecido pelo insufilm.
Dilminha tem a expressão assustadiça e os bracinhos esticados, segurando firme na proteção da cadeirinha. Poder e desamparo, tutela e dependência estão contrastados, entre o banco da frente e o banco de trás, na charge histórica que Angeli publicou aqui ontem.
Nela não há nenhuma palavra, apenas a inscrição "Lei da Cadeirinha". A condição infantilizada, ou lulo-dependente da candidata, fica ainda mais exposta porque a criança retratada pelo artista tem feições de uma senhorinha convencional. (Veja: www.folha.com/102539).
Quando começou a campanha na TV, Marina Silva disse, com razão, que estavam "querendo infantilizar a sociedade brasileira com essa história de pai e de mãe". Este tem sido um dos traços definidores da sucessão, recorrente nas falas de Lula e na propaganda de Dilma.
Mas também a campanha de José Serra é muito infantilizante. A escolha de Indio da Costa como vice e tudo o que veio depois dela transformaram a candidatura tucana numa espécie de berçário da UDN. Entre o que Serra imaginava ser e o que se tornou o tombo é imenso.
Dilma, porém, é imbatível em matéria de festa infantil. Mãe do povo ou filha de Lula, tanto faz, o que importa é que ela permaneça protegida na sua "cadeirinha".
Nunca um presidenciável foi tão blindado.
Até mesmo nas entrevistas, a petista se preserva cuidadosamente distante da imprensa. É comum vê-la no "JN" caminhando até um púlpito, atrás do qual fala a um buquê de microfones, sem repórteres por perto, o que -conforme observou Renata Lo Prete - dificulta muito réplicas ou questões embaraçosas e lhe confere desde já ar presidencial. Dilma já sentou na cadeirinha.

ANIVERSÁRIO DE ÓDIOS E PAIXÕES

ANIVERSÁRIO DE ÓDIOS E PAIXÕES
EDITORIAL - O GLOBO - 11/9/2010
Como nos anos anteriores, haverá cerimônias oficiais nos três locais onde os terroristas atacaram: no Pentágono, onde estará o presidente Obama; no Marco Zero, para onde vai o vice Joe Biden; e em Shanksville (Pensilvânia), onde caiu o quarto avião sequestrado, com a presença da primeira dama, Michelle Obama, e de sua antecessora, Laura Bush.
Mas o nono aniversário do 11 de Setembro não é como os anteriores. O clima de homenagens à memória dos 3 mil mortos nos atentados foi contaminado por ódios e paixões depois de dois episódios: a proposta de um imã nova-iorquino para construir uma mesquita a duas quadras de onde ficavam as Torres Gêmeas; e a decisão de um obscuro pastor evangélico da Flórida de queimar o maior número possível de alcorões (livro sagrado dos muçulmanos) - decisão suspensa até segunda ordem, depois de pressões de Washington.
São testes extremos para as liberdades religiosa e de expressão nos EUA. A primeira permite a construção de um templo muçulmano em Manhattan (ou em qualquer outro lugar dos EUA). Mas não deveria pelo menos ficar mais longe do local da tragédia maior de 11/9? - perguntam muitos americanos, completamente divididos a respeito. Mas que tipo de mensagem enviaria aos países islâmicos qualquer manobra que obstruísse a construção?
Já a liberdade de expressão permite ao pastor Terry Jones levar adiante seu plano macabro de queimar alcorões. Os mais altos escalões do governo americano imploraram-lhe que atentasse para os efeitos sobre a segurança do país. Quantos homens-bomba se ofereceriam para vingar a infâmia? O pastor, que tem (ou tinha) apenas 50 fiéis, parece ter adiado seu intento, exigindo um encontro com o imã que promove a mesquita em Nova York.
O presidente Barack Obama está no meio do tiroteio político-religioso, ainda mais que ambas as questões são exploradas pelas forças em luta na campanha para as eleições de meio de mandato (Câmara, Senado e governos estaduais), em novembro. Conservadores de todos os matizes aproveitam que Obama teve de fazer uma intervenção maciça na economia em crise para chamá-lo de "socialista". Incendiários da direita aloprada pregam-lhe o rótulo de "muçulmano", por ele ter nome árabe e vivido na Indonésia. Obama mantém o sangue frio e a moderação que o caracterizam. Na Casa Branca, disse que o 11/9 seria "uma excelente ocasião" para o país refletir sobre o fato de que há milhões de muçulmanos cidadãos americanos.
O nono aniversário do 11/9 é muito diferente dos anteriores. Um ano e oito meses depois da posse, o clima no governo Obama também. Herdeiro de uma guerra inútil (Iraque), de outra desastrosa (Afeganistão), da maior crise econômica desde a Grande Depressão e confrontado pelo maior desastre ambiental do mundo, sua popularidade despenca. Mas ele tem também muito a mostrar: a histórica reforma do sistema de saúde; a ação que evitou o colapso da economia em 2008/2009; a retirada das tropas de combate do Iraque, como prometera; o necessário reforço da presença americana no Afeganistão; uma eficiente iniciativa para melhorar o ensino nos EUA.
Infelizmente, o país está ainda mais dividido pela velha política obstrucionista em Washington, que Obama sonhou superar, e pelas forças obscurantistas que se agitam em datas como o 11/9.

PF prende cúpula política do Amapá

PF prende cúpula política do Amapá
Entre os presos estão governador, ex-governador, empresários e servidores. Operação apreendeu R$1 milhão e 5 carros
Fábio Fabrini e Jailton de Carvalho – O Globo
 BRASÍLIA. A Polícia Federal prendeu ontem o governador do Amapá, Pedro Paulo Dias (PP), o ex-governador Waldez Góes (PDT) e 16 empresários, servidores públicos e políticos, acusados de desviar R$300 milhões em recursos das áreas de educação, saúde, assistência social, entre outras. Na operação Mãos Limpas, a PF também obteve autorização judicial para conduzir à força para depor o presidente da Assembleia Legislativa, Jorge Amanajás (PSDB), o prefeito de Macapá, Roberto Góes (PDT), e 85 suspeitos de envolvimentos com corrupção, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha, entre outros crimes.
Entre os presos estão o presidente do Tribunal de Contas do Amapá (TCE-AP), José Júlio de Miranda Coelho; o secretário de Segurança, Aldo Alves Ferreira, delegado da PF; a ex-primeira-dama Marília Brito Xavier (mulher de Waldez); e Ruy Santos Carvalho, chefe da Superintendência de Agricultura, vinculada ao Ministério da Agricultura.
Durante as buscas, a PF apreendeu R$1 milhão em espécie, duas armas e cinco carros de luxo das marcas Ferrari, Masserati, Mercedes-Benz e Mini Cooper.
Fraudes em licitações em troca de propina
Os veículos foram apreendidos na casa de praia do presidente do TCE em João Pessoa. A maior parte do dinheiro (R$540 mil) foi recolhida na casa do secretário de Segurança. Outros R$250 mil estavam na casa do deputado estadual Edinho Duarte.
Depois das prisões, o presidente do Tribunal de Justiça do Amapá, desembargador Dôglas Evangelista Ramos, de 67 anos, assumiu o governo do estado. A operação deverá ter forte impacto na corrida eleitoral. Os principais candidatos majoritários foram atingidos pelas investigações. O governador Pedro Paulo Dias concorre à reeleição, assim como o presidente da Assembleia. O ex-governador Waldez Góes, que deixou o cargo em abril para disputar o Senado, lidera as pesquisas.
Na noite de ontem, os acusados foram levados a Brasília, onde devem ficar presos ao menos até quarta-feira, quando expira o prazo da prisão temporária, decretada pelo ministro João Otávio de Noronha, que preside o inquérito sigiloso no Superior Tribunal de Justiça. O governador e o presidente do TCE, que têm foro privilegiado, vão ficar em sala de Estado Maior na Superintendência da PF. São as mesmas instalações que abrigaram o ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda (ex-DEM, sem partido).
Os demais presos seriam transferidos de madrugada para a Penitenciária da Papuda, em Brasília. Ontem, O GLOBO não conseguiu contato com advogados dos acusados. As investigações, que envolveram PF, Receita Federal e Controladoria Geral da União (CGU), começaram em agosto. Revelaram um esquema de desvio dos fundos de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) e do Ensino Fundamental (Fundef), do governo federal, repassados à Secretaria da Educação. Conforme a PF, empresas eram contratadas mediante fraudes em licitações, sem formalidades legais. Em troca, integrantes do governo recebiam propina.
Apenas uma empresa de segurança, com contrato emergencial de três anos, recebia R$2,5 milhões mensais do estado. Levantamento da CGU mostra que, em 2009 e 2010, os órgãos atingidos pelas fraudes receberam R$800 milhões da União.

Waldez, para o Amazônia Jornal

Legislativo não é apêndice do governo

Legislativo não é apêndice do governo
Arnaldo Jardim FOLHA DE S. PAULO
Ainda há muita água para rolar, mas, por hipótese - e não mais que por hipótese -, admitamos que a atual aliança governista eleja maioria expressiva nas duas Casas do Congresso. A primeira pergunta a fazer é: qual a consistência político-ideológica dessa maioria?
Sabemos que o partido lulista tentará usar tal maioria para avançar em mudanças constitucionais e legais ditas "de esquerda". Sabemos, também, que a outra metade (possivelmente majoritária no bloco), representada pelo PMDB de face mais liberal, quererá não mais que usufruir sua parcela de poder.
A segunda pergunta é: a que se prestaria essa aliança? Ela serviria para uma sustentação convencional do governo, não para grandes arroubos políticos. Não teria, por exemplo, homogeneidade para aprovar as inadiáveis reformas tributária e previdenciária, que o governo Lula postergou.
Tramada sobre circunstâncias, e não sobre programas, essa aliança teria uma consistência debilitada e uma convivência sempre atritada.
Portanto, uma eventual maioria da atual base governamental na Câmara e no Senado significaria, sim, uma excessiva concentração de poder, mas relativizada pelos objetivos políticos transversos de cada facção situacionista.
Duvido que ela se prestaria a validar o sonho autoritário do partido lulista, impondo modificações exóticas à legislação. Já no governo Lula existiu enorme distanciamento entre o que os ideólogos do partido pregavam e a prática política.
Os sonhos do partido sempre foram contornados no discurso que Lula faz à sociedade, operando o convencimento popular por prática populista frequentemente demagógica. Lula sempre esteve longe, muito longe, de aderir ao ideal de uma revolução transformadora.
Já o cerne da "intelligentsia" do partido lulista sonha usar o processo democrático -um tanto pateticamente, reconheçamos- para fazer a revolução que ainda não aconteceu. Mantém a visão da "tomada do palácio" para, a partir do governo, "moldar a sociedade".
Na Presidência, Lula ignorou essa visão com sua implacável hegemonia política sobre o partido; mas, quando ele não estiver mais lá -admitamos, por hipótese-, o PMDB teria muito mais cuidados com o destino do governo e das leis, estou certo? Não é novidade para o PMDB que o núcleo ideologizado do partido lulista sonha afastá-lo das decisões reais do poder.
A contínua pregação da hegemonia esquerdista -algo que não se concretizará tão cedo- deixa claro que o acolhimento do PMDB nas hostes lulistas é meramente oportunista e que o nível de confiabilidade da aliança é precário. Ao PMDB, definitivamente, não interessa contribuir para um modelo autoritário.
Mas há outra hipótese a considerar: no caso de vitória do candidato de oposição José Serra, como espero e aposto, a questão da maioria parlamentar se inverteria, posto que a adesão do PMDB a um eventual governo Serra seria lógica.
Isso não só pelo vínculo natural que o candidato tem com as frações históricas do partido como também pelo peristaltismo usual da sua parcela mais, digamos, pragmática. Na sua passagem pelo Ministério da Saúde, a aprovação da emenda nº 29 já demonstrou isso.
E não é só. É evidente que uma eventual bancada diminuta e os efeitos da cooptação do governo -o governo lulista nunca se inibiu com isso- podem criar dificuldades eventuais à resistência oposicionista. Mas isso já aconteceu num Brasil relativamente recente e o país se redemocratizou.
O que engrandece a resistência não é o número de parlamentares, mas a capacidade de luta democrática e articulação política da bancada oposicionista, inclusive aproveitando as contradições do bloco adversário.
Arnaldo Jardim, engenheiro, é deputado federal pelo PPS-SP e candidato a novo mandato.

Somewhere | trailer US (2010) Sofia Coppola winner Venice Film Festival

Fetiche

Fetiche
Fernanda Torres – Veja Rio
Não fiz faculdade. Dependo da bondade alheia para ordenar meu conhecimento. Eu e a Blanche DuBois. Quando João Ubaldo Ribeiro me segredou seu incômodo com relação à repetição da palavra “enlouquecida” em uma apresentação de A Casa dos Budas Ditosos, e pediu que eu checasse no texto para ver se não era “ensandecida” e “enlouquecida”, e confessou sua irritação por ter repetido “ânsia” duas vezes em Viva o Povo Brasileiro, passei a sofrer de TOC com toda e qualquer replicação do vernáculo. Agora, que escrevo com mais frequência, percebo quanto enraivece o retorno aos mesmos “poréns”, “contudos” e “todavias”. Encontrei antídoto para tal pobreza no Dicionário de Sinônimos e Antônimos do Antônio Houaiss. Hoje, se não o tenho à mão, sofro de síndrome de abstinência. Descobri o prazer de folheá-lo mesmo quando não preciso, só pelo puro exercício das associações.
Depois do Houaiss, não fiquei mais chateada, e sim zangada, aborrecida e enfezada com a minha bronquice e, ignorante, me dei por satisfeita com as novas fronteiras do meu português. Foi quando a professora de inglês do meu filho me recomendou, entusiasmada, o recém-reeditado Dicionário Analógico da Língua Portuguesa, de Francisco Ferreira dos Santos Azevedo. Sem ter noção do que se tratava, na mesma tarde fui à livraria adquirir um exemplar. Para não perder a viagem, ainda arrematei um segundo, o Etimológico, de Antônio Geraldo da Cunha.
Meu horizonte, até então reto, se curvou em direção ao infinito. O Dicionário Analógico tem um prefácio deslumbrante de Chico Buarque que, sozinho, já vale o gasto. É uma obra de associação de ideias. Perto dele, o de sinônimos e antônimos parece o bê-á-bá. Ainda estou apanhando para aprender a usá-lo, é humilhante. O quadro sinóptico, ou resumido, divide as palavras em categorias, como se fossem os reinos animal, vegetal e mineral. São definições como Dimensão, Tempo, Causas, Quantidade, Mudanças, Espaço... É como se todo conhecimento, concreto, abstrato, sensorial e racional, pudesse ser classificável. O livro é uma espécie de árvore genealógica de tudo o que tem nome. É imperdível.
O Etimológico eu ainda nem abri. É outro admirável mundo novo para uma besta quadrada que nem eu. Mas esse, pelo menos, eu sei do que se trata; o outro, eu não sabia nem que existia. Por coincidência, meu filho está se aprofundando em gramática na escola e começa a enfrentar as leis da escrita. Eu, que estudei em colégio experimental e tudo o que aprendi foi por osmose, dedução e pura sensibilidade, estou aproveitando para repassar as noções básicas de acentuação, os pretéritos imperfeitos e os futuros do pretérito. Nunca tive prazer de aprender as normas do português, apesar de sempre ter me saído bem em redação. Cresci com a impressão de que o estudo gramatical era espinhoso. Hoje, tenho pena de mim por só saber o lado empírico das convenções.
Uma curiosidade a respeito desse mais novo fetiche. Apesar de ter investido em um iPad em recente viagem, e de adorar matar as dúvidas de maneira rápida pela internet, o dicionário de papel é um objeto de arte e possessão. Poder segurá-lo inteiro dá a noção real daquilo que se desconhece. Ao procurar um vernáculo, visitam-se milhares de outros num passar de olhos, é um processo de sedução e curiosidade. Tenho amor pelos romances que manuseei, folha a folha, e pelos cantos em que fiz anotações. Quase todos os dias passo em uma livraria, só para ver o que anda por lá. Mas um romance se lê em linha reta, qualquer computador dá conta. O ir e vir do dicionário, não, esse só a bisbilhotice do tato sossega.
Fernanda Torres
e-mail: fernanda.torres.vejario@gmail.com

Explosão de beleza!

Leonardo Boff fala sobre Marina Silva

Bessinha

O que Dilma não respondeu

O que Dilma não respondeu
Perguntas que colunistas do GLOBO fariam para a petista, que se recusou a debater
 Ancelmo Gois Eu gostaria de repetir a pergunta que fiz a Lula, então candidato em 2002, até porque, em que pesem as promessas do atual presidente, de lá para cá o problema se agravou ainda mais. Por que acreditar que, com a senhora na Presidência, o problema da violência poderia ser atenuado?
 Merval Pereira Candidata, a senhora vem sofrendo uma transformação radical, à vista de todos, tanto na fisionomia quanto na ideologia. Qual é a verdadeira Dilma, a gerentona do governo, que já colocou muitos ministros a chorar depois de discussões, ou a mãe gentil do povo brasileiro? A que coloca o chapéu do MST e diz que não trata dos movimentos sociais na base da polícia, ou a que diz que não convém colocar o chapéu do MST e que não tolerará ilegalidades? A que se orgulha de ter participado da luta armada contra a ditadura e foi saudada por José Dirceu como "minha companheira em armas" ou a que nega ter pegado em armas contra a ditadura? A que classificou de "rudimentar" a proposta do então ministro Antônio Palocci de limitar os gastos do governo, ou a que defende o corte de gastos e tem o mesmo Antônio Palocci como coordenador de sua campanha?
 Ilimar Franco A necessidade de uma reforma política é recorrente no discurso de todos os partidos. Os presidentes da República falam de sua necessidade, mas nenhum deles assumiu a responsabilidade de levá-la adiante. Nas gestões do presidente Lula, a Câmara esteve próxima de aprovar uma reforma que previa a votação em lista fechada para a Câmara dos Deputados e o financiamento público das campanhas. Se a senhora for eleita presidente da República, pretende trabalhar pela votação de uma reforma política? A senhora é favorável, ou não, ao voto em lista? A senhora é favorável, ou não, ao financiamento público?
 Ricardo Noblat Se Lula não a tivesse escolhido para ser candidata à sucessão dele, a senhora cogitava ser candidata a qualquer outra coisa? Caso seja eleita e Lula queira voltar em 2014, a senhora abrirá mão da reeleição?
 Jorge Bastos Moreno Qual a sua verdadeira posição em relação ao sistema de partilha do pré-sal, já que, como integrante do governo, a senhora não foi tão enfática?
 Elio Gaspari No campo político a senhora defende a introdução do voto de lista. Vamos ser claros: desde 1946 o eleitor brasileiro votou em candidato para a Câmara dos Deputados, indicando-o nominalmente. Por exemplo: o eleitor quer votar em Dilma Rousseff para deputado e vota em Dilma Rousseff. Como funcionará isso no seu sistema de lista? O eleitor votará no partido, digamos o PTB, presidido por Roberto Jefferson, e qual será a ordem de entrada dos candidatos? A da vontade da direção do PTB ou de qualquer outro partido que organizou a lista?
 Zuenir Ventura A senhora disse que a oposição está com medo de que uma mulher dê certo na Presidência. A senhora já se considera eleita? Não é cedo para cantar vitória?
 Verissimo Se eleita, qual será o seu primeiro gesto, aquele ato de impacto que costuma inaugurar governos? Ou não haverá nada disso?
 Chico Caruso Como pretende conviver com caricaturas e caricaturistas, se for eleita?
 Míriam Leitão O governo tem banalizado o crime de quebra de sigilo fiscal dos líderes da oposição e familiares do candidato José Serra com frases espantosas. O ministro da Fazenda disse que vazamentos sempre acontecem; o presidente Lula perguntou num comício "cadê esse tal de sigilo?"; a senhora declarou que falar disso é desespero e jogo eleitoral da oposição. Tente imaginar a situação inversa: os dados da sua filha sendo espionados no órgão que deve zelar pela proteção constitucional do sigilo. O que a senhora sentiria? A senhora considera normal que órgãos do Estado sejam usados para espionar adversários políticos?
 Flávia Oliveira Uma das primeiras medidas do governo Lula na área econômica foi a elevação dos juros básicos para controlar uma inflação crescente em 2002/2003. O resultado foi um primeiro ano de governo com PIB estagnado. Que medidas fiscais e monetárias a senhora pretende adotar no início do seu mandato para manter o Brasil com crescimento econômico e baixa inflação?
 Fernando Calazans A senhora disse que, se eleita, estenderia a mão para os adversários. A mão ainda pode ser estendida? É possível ou impossível um entendimento, no governo, com o PSDB? Por quê?
 Artur Xexéo Uma das áreas mais polêmicas do atual governo, a administrada pelo Ministério da Cultura, não recebeu até agora uma só menção no seu programa do horário eleitoral. Caso ganhe as eleições, quais são as suas prioridades na área da cultura?
 Joaquim Ferreira dos Santos O presidente Lula praticamente não esteve presente a eventos de cultura, como uma peça de teatro, um concerto de clássicos ou música popular. A senhora também não tem sido vista em plateias de cultura. Qual a sua relação pessoal com os hábitos culturais?
 Cora Rónai A senhora tem sido apresentada, na sua campanha, como um duplo do presidente Lula, "Lula e Dilma", como se ambos tivessem governado o país juntos ao longo dos últimos anos. Caso venha a ser eleita, a parceria continua? Teremos "Dilma e Lula" no poder?
 Arnaldo Jabor Se a senhora for eleita, vai seguir a trilha do Lula, mais conciliadora, ou vai dar ouvidos às ordens de petistas de carteirinha como Dirceu, Berzoini e outros?
 Arnaldo Bloch O maestro John Neschling disse que teve um encontro com a senhora e ficou impressionado com seu conhecimento das óperas russas, a ponto de cantar árias inteiras. Como a senhora vê, em contrapartida, a situação da cultura brasileira, completamente ausente do debate eleitoral?

Elvis, para o Correio Amazonense

"O Brasil não vai votar num envelope fechado"

"O Brasil não vai votar num envelope fechado"
Serra ataca duramente a adversária do PT e o governo Lula e também se diz otimista com a possibilidade de haver segundo turno
 MÍRIAM LEITÃO: A Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) foi divulgada esta semana. Dá para ver que, nos últimos cinco anos, houve aumento de renda, mas o melhor ano foi 1996. O acesso à telefonia, depois da privatização, aumentou 300%. E, na educação, os avanços são lentos, mas foram um pouco mais rápidos no governo Fernando Henrique. O ex-presidente não aparece em seu programa, e o presidente Lula aparece. O senhor tem vergonha do legado tucano? Gostaria de ser o candidato do presidente Lula?
 SERRA: Nunca me passou pela ideia ser o candidato do Lula. Nem por vontade própria, nem por vontade provavelmente recíproca. O PT colocou na pauta que a campanha deveria se orientar pelo debate entre os governos Lula e Fernando Henrique. Muitos jornalistas, muita gente entrou nessa. De fato, esta eleição não está decidindo entre governo Fernando Henrique e governo Lula, até porque as circunstâncias são totalmente diferentes. Se você verificar as entrevistas que eu dei, discursos, verá que, a todo momento, entro em análises do que aconteceu no passado e agora. E tenho outra coisa de que, graças a Deus, eu me orgulho: não tenho que ficar, a cada momento, revisando meu passado. Nem guardo num cofre trechos da minha história, que é mais ou menos conhecida. Então, tenho muita paz em relação a essas circunstâncias do passado, comparações etc. Fui ministro do Fernando Henrique. Tudo que foi feito na Saúde, na minha época, foi com a cobertura dele. Isso é mais ou menos óbvio.
MÍRIAM: Mas não é falar do passado para ficar nessa discussão sobre o que foi melhor. É para que se possa entender quais são as ideias da candidatura, o que foi feito quando vocês estiveram no poder. Por que a pessoa do seu partido que governou o Brasil oito anos não aparece?
 SERRA: Mas a todo momento ele esteve comigo. A estratégia de programa de televisão é uma. A estratégia política de falar para a mídia é outra. A estratégia de comício é uma terceira. Essa história de que eu fico pondo o Lula (no programa eleitoral) não é verdade. Apareceu num clipe que era para comparar, mostrar até que a candidata Dilma não tem história. Quem são as duas pessoas que estão aí? Eu sou candidato, e o Lula é o patrono (de Dilma), praticamente o candidato de novo. Lula está se candidatando por meio dela. Então, sublinhamos: o Lula tem história? Tem. Alguma experiência? Tem. Eu também. E ela, nenhuma. Ao contrário, (o uso do Lula) foi numa perspectiva crítica. Então, a partir daí, fixou-se jurisprudência. Acho que é muito folclore isso.
ILIMAR FRANCO: Existe uma crise da representação política. Se for eleito, o senhor colocaria como uma das prioridades promover uma reforma política? E que reforma política, que ideia defenderia?
SERRA: A questão essencial é a eleitoral neste momento. Tenho uma proposta concreta que acho que começaria a mudar o sistema político brasileiro. É de implantar o voto distrital em municípios que têm segundo turno, onde há mais de 200 mil habitantes. Por exemplo: o Rio tem quantos vereadores? Cinquenta? Você dividiria o Rio em 50 distritos e elegeria um vereador para cada distrito. Por que esse voto distrital puro? Porque a população se sentiria muito mais representada e cobraria de quem fosse eleito. Você introduziria no Brasil o vírus benigno do voto distrital e da melhor representação. Se depois vai fazer distrital misto ou voto de lista, é outra história. Começaria por aí. A questão é melhorar a representação, o controle sobre aquele em quem o eleitor votou. Outra coisa que eu mexeria é na história do horário, que não é gratuito. É tudo, menos gratuito. Primeiro, porque as empresas de comunicação descontam no Imposto de Renda. Segundo, porque é uma fortuna fazer uma campanha em que se acaba vendendo candidato, em alguns casos - no meu nunca aconteceu -, como se fosse iogurte, sabonete, sapato de praia. Fantasiando inteiramente. No meu ver, tem que ter a câmera e o candidato. Programa político eleitoral não é de entretenimento. Se a política é chata, é chata. Eu também limitaria, pela legislação, a questão dos nanicos, de partidos de aluguel.
 RICARDO NOBLAT: O senhor disse que comentou com o Lula, em janeiro, a respeito da eventual quebra de sigilo de sua filha, Verônica. Estavam surgindo dados, em blogs e em sites, que indicavam que poderia ter havido quebra de sigilo da Verônica. Em outubro do ano passado, que, aliás, foi quando houve a quebra de sigilo, o "Jornal do SBT" publicou reportagem sobre venda de dados sigilosos em SP. E até ouviram o senhor porque havia ali elementos que mostravam a quebra de sigilo de pessoas importantes, o senhor, a sua família, o presidente Lula. Quando foi exatamente que o senhor começou a ter maior segurança de que isso tinha acontecido?
 SERRA: Eu nunca dei declaração sobre essa conversa (com Lula). Eu fiz um comentário numa emissora de TV, onde eu ia dar uma entrevista, e alguém ouviu e passou para o jornal. Então, ficou uma história mal explicada. No dia 25 de janeiro, teve o aniversário de São Paulo, e o Kassab convidou o Lula. E, depois da reunião, nós conversamos. Eu disse ao Lula que ia ser candidato a presidente. Estava aquela onda na imprensa de sai ou não sai (candidato a presidente). Eu já tinha tomado a decisão de sair, e transmiti ao Lula. Ele nunca passou isso para fora. Foi discreto a esse respeito. A conversa girou em torno disso. No final, eu passei a ele cópias de blog de amigos dele e do blog de amigos da Dilma. E o blog tinha coisas sujas a respeito da minha filha, da minha família. Então, eu dei a ele. Falei: "Olha, se puder parar isso". Minha filha me disse que deviam estar quebrando sigilos porque existiam dados, segundo ela, que só estavam no IR. Mas ela também não tinha certeza. Foi isso. Ocupou 5% do tempo da conversa. Isso foi tudo. Agora, essa questão de outubro, eu não sabia. Foi a Verônica que começou a me dizer que achava estranho, ela e meu genro... Há uma indústria de blogs mantida pelo PT. Ou mantém pagando no bolso direto, ou mantém através de terceirização. A TV Brasil paga a gente que tem blog sujo. É uma remuneração indireta. E que se dedicam (os blogs) à difamação. No caso do Eduardo Jorge, dos outros (tucanos), foi em função de campanha eleitoral. Desde 2006, havia "dossiês" com coisas delirantes de quando ela (a filha) morava nos Estados Unidos. Vocês não imaginam a sujeira que é isso. Quebrou (o sigilo) de mais gente, então, não é o PT. Claro que foi. Agora, pode ter usado um pé de chulé qualquer que chega lá e pega? Pode.
 NOBLAT: Essa reportagem de outubro era sobre quebra de sigilo, sobre venda na Rua Santa Efigênia de dados sigilosos... Sobre um site que falava de dados sigilosos. Mostrava os de Lula, do filho do Lula, do senhor, de pessoas da sua família. E lá, nessa reportagem, o senhor já comenta isso. Diz que é um crime, que tem que ser combatido. O que eu pergunto é: isso já acontecia há mais tempo, não é o fato de acontecer agora... (Serra interrompe Noblat)
 SERRA: Mas eu não tinha essa consciência. E também teria que se comprovar. Vou ser bem franco: vejo gente aí escrevendo que eu quis aproveitar, divulgar, me fazer de vítima e etc. Sabe qual foi a minha primeira reação quando soube da (quebra de sigilo) da Verônica? Não foi a de divulgar. Você não quer ver nome de seus familiares exibidos. Depois, ela trabalha, uma pessoa que não tem nada a ver com política. Por mim, não teria divulgado para não trazer amolação para ela. Sempre tive essa preocupação.
 NOBLAT: Mas uma crítica que se faz é que o senhor deu muita importância a esse assunto - não que ele não merecesse - e está, com isso, tentando recuperar, eventualmente... (Serra interrompe)
 SERRA: É uma crítica imbecil, primeiro, de quem não quer gastar neurônios para pensar no que está acontecendo. Segundo, é tipicamente de um comitê petista. Ou o sujeito que tem medo de patrulhamento. Não tem pé nem cabeça isso.
 JORGE BASTOS MORENO: O senhor acredita que, após esta eleição, vai haver uma mexida partidária, independente de uma reforma política? O nível que está a campanha eleitoral para presidente adia um pouco um projeto, que é o sonho de muitos tucanos e de muitos petistas, não sei se é o seu também, de, no futuro, esses dois partidos (PT e PSDB) se unirem através de projetos comuns, já que eles nasceram, praticamente, afinados um com o outro?
 SERRA: Não conheço esses tucanos. Devem ser mais exóticos ainda do que o tucano natural. Tem uma diferença PSDB-PT com relação à concepção do que é partido, do que é democracia, liberdade. Isso é antagônico. Não significa que não tem gente dentro do PT, gente dentro do outro lado que não tenha mais afinidade. Estou dizendo como partido, como instituição. Agora, eu eleito presidente, a parte política, pode está certo, será bem conduzida. Eu, no Ministério da Saúde, consegui aprovar seis leis importantes, que marcaram o sistema de saúde no Brasil. Mais uma emenda constitucional com o apoio da oposição. Sempre atendi todos. Eu conheço. Sei como são, como funciona a vida parlamentar. Eu creio que o governo Lula foi e tem sido um dos mais fracos da História em matéria de Congresso Nacional. Do que eu me lembro, realmente, só não foi mais fraco do que o do Collor. Estou me referindo ao período da democratização. Tudo lá, cada voto, tem que recompor a maioria e tem que ceder mais cargos porque, como começou assim, cria um círculo vicioso.
 MERVAL PEREIRA: O PSDB tem a tradição de vencer em São Paulo. O senhor foi eleito prefeito e governador. No entanto, nas duas campanhas presidenciais, em 2002, o senhor perdeu para o Lula em São Paulo; agora está perdendo para a Dilma em São Paulo, enquanto Alckmin, em 2006, ganhou com uma diferença de quase 4 milhões de votos e Fernando Henrique ganhou, em 94 e 98, com cinco milhões de votos de diferença. Como o senhor explica esse insucesso no momento em São Paulo, estado que o senhor governou, e como o senhor imagina ganhar uma eleição perdendo no estado que governou?
 SERRA: Não imagino; nós vamos ganhar em São Paulo. Não estou perdendo. Eleição não é uma partida de futebol. Eleição só tem um lance, um gol, que é no final. Então não considero que estou perdendo. O fato é que eu fiquei mais distante de São Paulo, a campanha só começou em agosto, tem o peso em relação a Dilma, da popularidade do Lula...
 ELIO GASPARI: O que o senhor pretende fazer para colocar em funcionamento, de maneira eficaz, duas iniciativas nascidas no governo FH que atravessaram a atual administração sem resultados significativos. Primeiro, o ressarcimento ao SUS pelos planos de saúde de despesas feitas na rede pública para atendimento de seus clientes. Segundo, a generalização do cartão do SUS, pelo qual cada cidadão poderá ter, num só plástico, os dados relativos ao seu atendimento médico na rede pública.
 SERRA: Essas foram iniciativas minhas no governo Fernando Henrique. Foram ideias minhas. E não tivemos tempo de concluir ou de implantar efetivamente. Por exemplo, o cartão SUS, eu comecei, consegui financiamento, e a gente pensava que o próximo governo desse sequência, e eles deixaram para trás.
 ANCELMO: E essa questão do ressarcimento?
 SERRA: Lógico, não tem nada mais justo. Estávamos nessa batalha, era uma batalha jurídica. Aprovou-se uma lei, as pessoas reagiram contra, com bons advogados, com a experiência que eles têm no setor, e nesse contexto é que mudou o governo e foi tudo deixado de lado. Até porque a ANS passou a ser loteada. Porque uma coisa gravíssima no Brasil foi o loteamento dessas agências de Estado, porque não são de governo, são de Estado. Isso é uma aberração. Isso é uma coisa que vai ter que se consertar no Brasil.
 ZUENIR VENTURA: Quando foi que a sua campanha errou, se é que errou?
 SERRA: Eu estou muito no calor da campanha para fazer uma análise a esse respeito. Não vejo erro. Às vezes as circunstâncias são mais fortes... Eu nunca na vida fiz passa-moleque. Aqui se diz isso (risos)? Quando você engana o outro, você faz um passa-moleque. É uma uma rasteira, combina uma coisa e faz outra. Posso ser chato, duro (...) Eu sou muito atento, mas eu tive um que foi o maior da minha vida, que foi o do Osmar Dias. Estava tudo combinado e de repente... Eu tenho um defeito em política, acredito que, quando a gente combina uma coisa, o outro vai cumprir. Se você disser, isso foi um erro? Pode ter sido, mas...
 ZUENIR: Eu vi uma declaração atribuída ao ex-presidente Fernando Henrique que parece uma tentativa de explicar isso. Ele teria dito que o senhor não está sintonizado com o país, mas que há condições de mudar isso. O senhor concorda?
 SERRA: Eu não vi essa declaração, sinceramente.
 ARTUR XEXÉO: As pesquisas eleitorais, de certa forma, antecipam o resultado da eleição. Conheço eleitores seus que não têm mais esperança na sua vitória. Quando o senhor acorda e tem uma agenda enorme de campanha pela frente, o senhor acha que ainda vale a pena? O senhor acredita numa virada?
 SERRA: Acho que vai ter uma virada. Se você me acompanhasse todo o período em que estou acordado, veria que estou com uma energia que não tive na minha vida. Essa energia provém de uma convicção de que vou ganhar. Do que provém essa convicção? O Brasil não vai votar num envelope fechado. É demais isso. Eu acredito que as pessoas vão se dando conta, sobretudo nessa reta final. Sobre pesquisas, posso dar exemplos de viradas e não viradas.
 VERISSIMO: Entre várias semelhanças, numa coisa os governos Fernando Henrique Cardoso e Lula são diferentes: na política externa. Se eleito, voltará a política antiga, menos terceiro-mundista e mais alinhada com os Estados Unidos?

SERRA: Farei outra política. No caso da família Verissimo, houve uma alternância. Leiam o livro "O senhor embaixador", do Erico Verissimo. Vocês vão ver que ele era admirador do Foster Dulles (ex-secretário de Estado americano na Guerra Fria, opositor do comunismo). Tem lá uma apologia porque o personagem está andando pelas ruas de Washington, quando o grande estadista Foster Dulles morreu. O filho passou para o lado contrário em matéria de questão externa. Vou ter uma política própria. Pega a política do Lula: primeiro teve muita promoção política, na época do Fernando Henrique também. Eu acho bom. Em geral, eu vou viajar menos pelo mundo. Na parte comercial, houve pouca agressividade comercial. No Lula menos ainda que no Fernando Henrique. No governo Fernando Henrique, investiu-se muito tempo no Mercosul. Não é aquela coisa simplificadora de que sou contra o Mercosul. O que tinha que ter sido feito era uma zona de livre comércio. Depois se faria uma união alfandegária. Mas isso é fruto de um amadurecimento, de décadas. Quiseram fazer logo de cara. Resultado: não funcionou. Na questão externa, de tarifas com o resto do mundo, de políticas comerciais, não se avançou como se devia na zona de livre comércio. O governo Lula fez más del mismo. E aí usando só para frufru. Para festival, chefes de Estado. A Venezuela entrar no Mercosul é uma piada. Acho que o governo Lula, em matéria de promoção comercial, não avançou nada. Teve um dado que eu levantei: houve cem tratados de livre comércio no mundo desde 2003, e o Brasil assinou apenas um. Com Israel, ainda com as restrições de que não pode ser das áreas contestadas dos assentamentos em terras palestinas. O Brasil vai ser o quinto PIB do mundo e, de cem tratados, só fez esse? O que foi feito é que, para entrar no Conselho de Segurança, ficaram-se abrindo embaixadas. A fatia do Brasil no comércio exterior mundial é a mesma. Apesar do boom de preços das exportações brasileiras, ficamos com a mesma fatia. O que me leva a desconfiar que, em termos físicos, se fosse possível calcular, nós diminuímos a participação no comércio mundial. Vamos fazer uma política agressiva de comércio exterior, de defesa comercial. Reconhecemos a China como uma economia de mercado a troco de quê? É uma medida cucaracha de política externa. Qualquer economia moderna, eficiente, competitiva tem mecanismos de defesa comercial. Finalmente, o Brasil não vai mais ter carinho e amizade por ditadores, por fascistas do século XXI.
 FERNANDO CALAZANS: O Brasil será sede nos próximos anos dos dois maiores eventos esportivos do planeta: a Copa e os Jogos Olímpicos. Como o senhor pretende controlar os gastos públicos, que, nesses casos, sempre superam o que estava previsto - ou por superfaturamento ou por atraso nas obras. E segundo, no plano da segurança, o que pode ser feito?
 SERRA: A base do crime organizado no Brasil é o contrabando de armas e drogas. Entre tudo o que a Dilma disse, o maior absurdo foi num debate de televisão, quando disse que as nossas fronteiras são as mais bem guardadas do mundo. É exatamente o oposto. Carro roubado entra no Paraguai em troca de armas. Até jornais fizeram reportagens comprando arma na Bolívia. Isso é a base do crime organizado. O preço da cocaína no Brasil caiu 50 vezes nos últimos 15 anos. Então, você tem aí um problema de oferta que é anterior e superior a todos os outros problemas, por incrível que pareça, porque é a base do crime organizado, e por isso que eu quero criar o Ministério da Segurança Pública. O governo federal não tirar o corpo fora como faz hoje. Você vê, a única proposta que o PT está fazendo, que a Dilma está fazendo, é criar UPP em todo Brasil, como se isso fosse a fórmula mágica. Uma medida que funciona no Rio restritamente. A solução para o Brasil é essa? Imagine. Com toda droga, essa coca, e essas armas que entram. Então, esse é um ponto. Como tem Copa e Olimpíada, naturalmente vai ter uma segurança muito reforçada, e isso não me inquieta. Quanto à questão de fazer, tudo ficou para o próximo governo. Tudo. Vai ter fazer isso direito, tem que sair. É um compromisso que um governo assumiu festivamente para o outro cumprir, e vai ter cumprir mesmo até porque são boas oportunidades. Para não ter superfaturamento precisa ter planejamento e, segundo, não deixar roubar. Negócio de roubar é não deixar. Não deixar, e dar o exemplo de cima. Isso é muito importante. Quando você tem uma autoridade que começa errado, a coisa vai para baixo com uma legitimidade que não tem tamanho.
 NOBLAT: O senhor acha que o governo deixou roubar?
 CANDIDATO: Eu acho que deixou. Não estou dizendo no caso da Copa, porque nem começou.
 JOAQUIM FERREIRA DOS SANTOS: As atuais leis de incentivo à cultura têm, entre outros vícios, o de incentivar artistas e produtores poderosos que, a rigor, não precisariam de incentivo algum. Como o senhor vai mudar isso?
 SERRA: O exemplo clássico é o Circo de Soleil, que teve incentivo. Acho que isso não deve acontecer. Isso foii decidido e aprovado por um conselho. Então não é erro da lei, mas da aplicação da lei.
 CORA RÓNAI: Outro dia, o senhor falou que Índia e China seriam países com projeto de nação. Eu queria saber o que isso significa e saber o que falta ao Brasil para que possa ser considerado um país com projeto de nação?
 SERRA: A China e a Índia têm mais ou menos claro para onde querem ir em matéria de desenvolvimento, defendem seus interesses na política internacional, de economia, política-política, não são exibidos. Defesa de interesse não é exibição, são discretos. No fundo, (o que acontece hoje), é o seguinte: estamos caminhando para voltar ao modelo hasta fuera de crescimento de antigamente, diante dos anos 30. Ou vamos ser um país industrial aberto mas competitivo. Hoje está caminhando para trás. Acho que a minha eleição representará no sentido do Brasil perseguir um modelo de crescimento sustentado com indústria da vanguarda junto com a agricultura.
 ARNALDO JABOR: Agora que o Lula está atacando frontalmente sua campanha: quando o senhor vai defender o governo anterior? Quando vai mostrar à população que, sem o Plano Real, sem as leis que o governo anterior criou, como responsabilidade fiscal, privatizações, consolidação da dívida interna, telefonia, o governo Lula seria apenas um populismo virtual?
 SERRA: Vou mostrar ao Jabor o estoque de debates, discursos, gravações, para ele poder ter uma ideia mais realista sobre o que a campanha está fazendo.
 ARNALDO BLOCH: Em abril, Chico Buarque confessou a uma revista francesa que vai votar na Dilma porque é a candidata do Lula e disse: "eu gosto do Lula". Em seguida, acrescentou que não vê grande diferença se o Serra ganhar: "A Dilma ou o Serra, não haveria muita diferença." Meses depois, Cacá Diegues, numa entrevista em que não declarou seu voto, disse a mesma coisa: "Em linhas gerais, não vejo grande diferença." Ontem (anteontem), a candidata Marina, aqui neste auditório, também disse isso: "Não vejo muita diferença entre Serra e Dilma." De onde vem essa noção de que o senhor é parecido com a Dilma? E como é sua relação hoje com a classe cultural?
 SERRA: Vindo da parte do Chico esse comentário, acho até uma colher de chá. Vindo da parte do Cacá, que é meu colega da UNE, fiquei curioso. Acho que há uma diferença imensa. Mas acho que, apesar de tudo, ele (Cacá) vai votar em mim. Mesmo achando que dá na mesma. Acho que é mais uma posição política com relação a uma certa insatisfação, que eu não sabia, de condução da campanha do que propriamente em relação à minha pessoa. Quero dizer que respeito, o Cacá é muito inteligente. Ainda bem que não li isso antes. Na campanha, não posso ter estresse. Você falou da cultura. Eu tenho amigos na área da cultura, mas nunca desenvolvi uma política junto aos artistas, aos fazedores de cultura mais ativos. Mas, em compensação, na prefeitura e mesmo no governo federal, eu meti o bico. Inclusive houve um projeto de recuperação do patrimônio histórico que foi ideia minha. Quando eu estava no Planejamento, o BID financiou. Sempre fui muito ligado, até porque na universidade eu cheguei a ser ator, diretor do grupo teatral da Politécnica. Na prefeitura, criei a Virada Cultural, que foi um sucesso estrondoso em São Paulo. Agora foi feita no Rio também. E no estado, o orçamento que mais cresceu foi o da cultura.
 ANCELMO GOIS: Fernando Henrique Cardoso prometeu duas vezes que a questão da violência urbana seria prioridade. Não foi. Lula também prometeu aqui que a questão da violência urbana seria um prioridade. Não foi. Por que acreditar que com o senhor vai ser uma prioridade?
 SERRA: Porque o que falo eu faço.
 ANCELMO: Já Fernando Henrique e Lula...
 SERRA: Não estou dizendo que é o caso dele (Fernando Henrique). Tudo o que o Ministério da Justiça tem em matéria de segurança foi criado na época do Fernando Henrique. Houve alguns equívocos, por exemplo, a Secretaria Nacional Antidrogas. Ele fez uma péssima nomeação. Resultado: uma coisa nova, boa, acabou naufragando, não fazendo o que deveria ter feito. Mas tomou as iniciativas. Depois (no governo Lula) só se fez fru-fru.

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