segunda-feira, janeiro 24, 2011

Lei ambiental


Lei ambiental
EDITORIAL - FOLHA DE SÃO PAULO
editoriais@uol.com.br
Governo precisa ultimar proposta de um novo código florestal, a fim de corrigir as concessões excessivas do substitutivo de Aldo Rebelo
As chuvas torrenciais que se abatem sobre o Sudeste do Brasil transformaram encostas e córregos em veículos de morte e devastação. A tragédia ambiental, a um só tempo natural e humana, representa oportunidade única para retomar com serenidade o debate sobre o código florestal.
De pronto, é bom destacar que uma ocupação mais ordenada desses ambientes, e em maior conformidade com a legislação ambiental, poderia ter evitado muitas mortes. A cobertura florestal no topo e na vertente de morros, assim como na beira de cursos d'água, atua como barreira de amortecimento. Onde há mata não se formam enxurradas violentas. Ali, a água penetra no solo com mais facilidade, alojando-se nos lençóis freáticos.
É claro que eventos extremos de precipitação podem sobrepujar até mesmo essa capacidade natural de absorção. Isso ficou patente nos muitos deslizamentos em áreas florestadas da região serrana do Estado do Rio de Janeiro.
À vista do desastre recente, contudo, não parece boa ideia flexibilizar o código florestal para afrouxar normas que já deixam de ser cumpridas com deplorável frequência -tanto no meio rural como no urbano. Essas concessões comprometem o substitutivo do relator Aldo Rebelo (PC do B-SP) aprovado em julho de 2010 por comissão especial da Câmara.
Rebelo nega que seu projeto, ainda por ser votado nos plenários do Legislativo, tenha implicações para zonas de risco nas cidades, o que é discutível. De todo modo, é difícil não reconhecer que seu substitutivo pende em demasia a favor de interesses ruralistas.
Proprietários de todos os portes, de posseiros a latifundiários, estão em guerra contra o atual código florestal. Até 2001, limitavam-se a desobedecê-lo, sem muito risco de sofrer autuação.
Naquele ano a lei de 1965 foi modificada por medida provisória. Tornou-se mais rigorosa, elevando para 80%, por exemplo, a exigência de reserva legal nas propriedades em região de floresta amazônica. A partir de 2008, para combater desmatamentos, o governo passou a fiscalizar o cumprimento da norma com maior eficácia. Foi quando a bancada ruralista no Congresso tornou-se mais estridente, encontrando em Rebelo um porta-voz dedicado.
Suas propostas, no entanto, despertaram forte reação da comunidade científica e de organizações ambientais. Foram encaradas como sinal aberto para aumentar o desmatamento, a custo contido nos anos anteriores.
Já se defendeu, neste espaço, que o código precisa de revisão para adequar-se à realidade do agronegócio e de sua relevância para a economia. Não faz sentido, por exemplo, criminalizar cultivos realizados há décadas em áreas de preservação permanente, anteriores ao próprio conceito.
O encaminhamento racional do debate depende em grande medida da iniciativa do governo federal. O Ministério do Meio Ambiente já trabalhava numa proposta alternativa. É preciso apresentá-la.

Dias de Grandeza

Dias de Grandeza
RUY CASTRO - FOLHA DE SÃO PAULO - 24/01/11
RIO DE JANEIRO - Não será por falta de solidariedade que a região serrana do Rio voltará a viver grandes dias. Na verdade, já está vivendo.
Sei de pessoas, no Rio e em São Paulo, que, desde as chuvas, não fazem outra coisa senão disparar mensagens, pedir donativos, organizar entregas, controlar postos de arrecadação, divulgar contas para depósitos, denunciar adoções ilegais de crianças, alertar sobre animais abandonados, doar sangue. Enfim, se doar. Isso é grandeza.
Sabe-se de lugares onde os donativos só puderam chegar de helicóptero, com risco para o piloto - efetivamente, um caiu, outro dia-, ou porque voluntários se arriscaram em peregrinações mata adentro. Alguns fizeram esse caminho de volta, trazendo nas costas idosos e doentes. E, assim como há cretinos que desviam as doações para vender, também há famílias que, no limite de resistência, insistem em repartir suas rações com os ainda mais necessitados.
Sabe-se de pessoas que enfrentaram corredeiras de água, pedra e troncos para salvar crianças cujas mães gritavam desesperadas. Outras já podiam ter ido embora dos lugares onde perderam quase tudo, mas preferiram ficar para ajudar vizinhos que perderam tudo. Os dias passam e a possibilidade de achar sobreviventes entre os desaparecidos é mais remota, mas alguns não desistem de escavar.
As pessoas enfrentam o cheiro da morte, que, a esta altura, já não se distingue do que sobrou da vida - ambos se compõem de lama, sangue, flores podres. Os enterros são feitos em sequência por quem, até então, nunca sequer presenciara um. Crianças e jovens estão amadurecendo rapidamente- um dia ali está contando por anos.
O povo da serra e os que chegam de fora para ajudar estão aprendendo lições para o resto da vida. Tomara as autoridades também as aprendessem, pelo menos para o próximo verão. Ou chuva.

Novos desafios para o CNPq


Novos desafios para o CNPq
Carlos Alberto Aragão de Carvalho Filho e Glaucius Oliva - FOLHA DE SÃO PAULO - 24/01/11
Não há como ser a quinta economia do mundo sem educação básica de qualidade e sem formação superior de cientistas em maior número
No Brasil, a construção de uma infraestrutura para ciência e tecnologia é recente. Começou em 1951, com o Conselho Nacional de Pesquisas - CNPq, criado pela lei nº 1.310, de 15 de janeiro, com a missão de fomentar pesquisas e a formação de pesquisadores; ainda em 1951, veio a criação da Capes; em 1962, a da Fapesp; em 1967, a da Finep; finalmente, em 1985, a do Ministério da Ciência e Tecnologia.
Em 60 anos, os avanços são expressivos. Hoje, temos uma comunidade científica e tecnológica com 1,7 milhão de currículos na plataforma Lattes do CNPq, 135 mil deles de doutores e 237 mil de mestres, e 27 mil grupos de pesquisa no Diretório de Grupos de Pesquisa.
O Brasil forma mais de 11 mil doutores por ano e produz 2,7% da ciência mundial, com liderança em várias áreas do conhecimento, como agricultura tropical, parasitologia, geofísica e engenharia associada à prospecção de petróleo e gás em águas profundas.
Em 2010, o CNPq atendeu a 80 mil bolsistas; investiu R$ 1,85 bilhão em formação de recursos humanos e fomento à pesquisa; avaliou 74 mil solicitações; tem 64 mil processos vigentes e custo operacional inferior a 5% do orçamento.
Foram também criadas mais 14 mil bolsas de iniciação científica, mil de produtividade em pesquisa e 4.000 de mestrado e doutorado. Há 7.000 bolsas de fomento tecnológico e um programa (RHAE) dedicado às empresas, com bolsas para incorporar pessoal qualificado em P&D. E, sem ônus para as atividades-fim, o CNPq terminou o ano com uma nova sede em Brasília.
A ciência e a tecnologia e o indispensável compromisso com a inovação são hoje instrumentos de política de Estado, expressa no Plano de Ação em Ciência, Tecnologia e Inovação e nos planos de desenvolvimento de várias áreas do Estado, como na Política de Desenvolvimento Produtivo, nos planos de educação e saúde, no PAC, nos desafios nacionais de sustentabilidade ambiental, econômica e social e nos programas de erradicação da miséria e de inclusão social.
O cenário para a C&T do século 21 pressupõe novos paradigmas. A ciência moderna exige atenção às demandas da sociedade, abordagens multidisciplinares e inovação, pesquisa e desenvolvimento nas empresas. A pesquisa requer novos formatos, novos atores, organização institucional e deve se pautar por critérios de qualidade, impacto, relevância, sustentabilidade e internacionalização.
Nesse novo contexto, cabe ao Estado brasileiro -por meio do Ministério da Ciência e Tecnologia e do CNPq em particular- modernizar a gestão de C&T, com avaliação e acompanhamento que promovam qualidade e multidisciplinaridade, e adequar o marco legal às especificidades da pesquisa, desburocratizando importações, compras e contratações, para aumentar a eficiência na aplicação dos recursos.
O sistema nacional de CT&I, em cinco anos, incorporou 15 mil novos pesquisadores em novas universidades, campi e instituições de ciência e tecnologia federais e estaduais. E não há como ser a quinta economia do planeta sem educação básica de qualidade, sobretudo em matemática e em ciências, e a formação superior de cientistas e engenheiros em maior número.
Para apoiar esse crescimento, o CNPq deve pelo menos dobrar seu orçamento nos próximos quatro anos, chegando a R$ 3,5 bilhões, de forma sustentável e que reflita planejamento e articulação de políticas de governo.
Em 2011, o CNPq celebrará seus 60 anos com o olhar voltado para o futuro, pronto para seguir em sua missão de desenvolvimento científico e tecnológico, por um Brasil mais justo e desenvolvido.
*Carlos Alberto Aragão de Carvalho Filho, 59, físico, é presidente do CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico.
*Glaucius Oliva, 51, engenheiro eletrônico, é diretor de Engenharias, Ciências Exatas e Humanas e Sociais do CNPq.

Nota zero


Nota zero
Ricardo Melo - FOLHA DE SÃO PAULO - 24/01/11
São Paulo - As trapalhadas e a sucessão de falhas que cercam a seleção para as universidades de forma alguma representam um raio em céu azul. Como tantos outros órgãos da administração brasileira, o Inep é mais uma vítima da transformação de repartições públicas em objeto de negociatas políticas e conveniências partidárias.
Os fatos vêm de longe. No final de 2005, o governo Lula ainda não completara três anos, mas o instituto emplacava seu quarto presidente sob a nova administração (hoje já se perdeu a conta de quantos ocuparam a cadeira até agora). Naquela época, um diretor demissionário reclamava nesta mesma Folha do fatiamento da instituição.
"O coordenador do centro de informação e biblioteca do Inep [...] está lá porque é irmão de um político de Brasília. [....] Na minha diretoria, fui obrigado a engolir uma professora de educação física [num cargo que] exige conhecimento de estatística e psicometria." E assinalava que até a sogra de Lindberg Farias, então prefeito de Nova Iguaçu, tinha assento na diretoria.
Pelo andar da carruagem, de lá para cá, quase nada mudou em termos de gestão. Apenas a obsessão pelo amadorismo explica a natureza e a profusão de erros no Enem e no Sisu. Sem saber direito o que falar, o MEC busca refúgio nos grandes números. Em sua defesa, argumenta que, estatisticamente, a quantidade de ocorrências é pequena face ao gigantismo dos exames.
Socialmente falando, o prejuízo não se mede desta forma. Cada estudante atingido pela incúria oficial tem todo o direito de apontar 100% de incompetência. É ele que terá perdido um ano ou mais de sua vida por causa de problemas perfeitamente evitáveis.
Em vez de recorrer ao STJ para impedir contestação nos tribunais, o MEC faria melhor se garantisse a todo e qualquer prejudicado o direito a um exame imparcial. E agisse, por exemplo, com a eficiência da Receita Federal quando avança sobre o bolso dos contribuintes.

Duke


Skoob

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