quinta-feira, setembro 02, 2010

Mais uma Vez-Placa Luminosa

Duke, para O Tempo

Conselho Federal de Medicina autoriza operação de mudança de sexo em mulheres

Conselho Federal de Medicina autoriza operação de mudança de sexo em mulheres

Quinta, 02 de Setembro de 2010 - 10:44
Foto: www.jornale.com.br
O Brasil tem novas regras e regulamentos para a cirurgia de readequação, que possibilita a troca de sexo. A Resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) nº 1955/2010 reconhece o tratamento de transgenitalismo de adequação do fenótipo feminino para masculino. A matéria autoriza procedimentos de retirada de mama, útero e ovários. A resolução foi publicada nesta quinta-feira (2), no Diário Oficial da União (DOU).
Para o CFM, o tratamento de neofaloplastia (construção do pênis) continua sendo um procedimento experimental. “Entendemos que o procedimento é de resultados estéticos e funcionais ainda questionáveis, e por isso seja mantido como experimental”, apontou o relator da resolução e conselheiro federal, Edvard Araújo.
Outra novidade na resolução é que agora os tratamentos de transgenitalismo podem ser realizados em qualquer estabelecimento, desde que siga os pré-requisitos da resolução. “Por ser um procedimento válido não é necessário limitarmos o local onde será feito”, explica Araújo.
O presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), Toni Reis, destaca que existem muitos casos do transexual se mutilar, por rejeitar o próprio corpo. “A medicina pode ajudar a construir a cidadania das pessoas independentemente da identidade de gênero”, disse Reis.
Regras – A seleção dos pacientes para cirurgia continua obedecendo a avaliação de equipe multidisciplinar constituída por médico psiquiatra, cirurgião, endocrinologista, psicólogo e assistente social. Este acompanhamento deve ser de, no mínimo, dois anos.
O tratamento só pode ser realizado em maiores de 21 anos, depois de diagnóstico médico e com características físicas apropriadas para a cirurgia.
A gaúcha Cristyane Oliveira foi uma das pioneiras da cirurgia no país. Ela teve seu processo concluído em 2002 no Hospital de Clínicas de Porto Alegre (RS). Hoje trabalha como secretária, é casada há oito anos, e diz se sentir realizada. “A cirurgia foi uma janela para realizar um sonho. Não me sinto mais mulher, a cirurgia me fez sentir mais cidadã”, apontou Oliveira.

Freire: Com devassa em sigilos, governo do PT leva Estado brasileiro a um processo de decomposição

Freire: Com devassa em sigilos, governo do PT leva Estado brasileiro a um processo de decomposição
PORTAL DO PPS - Valéria de Oliveira
Freire diz que Receita Federal quer transformar vítimas em réus.

Vivemos um momento “extremamente perigoso”, advertiu o presidente do PPS, Roberto Freire, ao comentar o vazamento dos dados fiscais de Verônica Serra, filha do candidato do PSDB a presidente. “Aquilo que é fundamental em qualquer estado democrático de direito, que são as garantias constitucionais da pessoa, está sendo enxovalhado, rasgado, ofendido em episódios como esse, permitidos pela Receita Federal, no governo em que Dilma é a mãe de todos”.
Para Freire, o governo, com ações como a que envolve quebras de sigilos, leva “o Estado brasileiro a entrar em um processo de decomposição; ele está sendo utilizado para bandidagem, para chantagem contra grupos econômicos, pessoas físicas e para a bandidagem política também”. A reação de Serra, demonstrada no Jornal da Globo de terça-feira, foi comedida, mas muito dura, diz Freire, já que o caso envolve a família. Nas investigações sobre os ilícitos, afirmou Freire, a Receita tem usado o seu poder “para obstruir e distorcer, para tentar transformar a vítima em réu”.
Em cadeia Freire disse que o desrespeito ao sigilo vem ocorrendo em cadeia. “Primeiro, foi o caseiro (Francenildo), depois, grupos de empresários, e agora, a política”, afirmou. Até agora, sabe-se que 140 pessoas tiveram seus dados fiscais revelados pela Receita.
“E ainda têm o desplante de dizer que ela (a funcionária responsável por acessar os sigilos dos tucanos) cometeu um erro, por descaso. Não, ela cometeu um crime. A Receita permitiu que se cometesse um crime contra o artigo V da Constituição, que garante a qualquer cidadão o direito ao sigilo”, insistiu Freire.
Cinismo Segundo ele, o argumento “de um cinismo atroz” que vem sendo usado para minimizar as quebras de sigilo é o de que as pessoas de bem não precisariam temer as revelações. “É preciso entender que a Receita tem todos os dados, toda a vida, a movimentação financeira da pessoa está lá declarada. O que não pode é isso ser do conhecimento público. Não há razão para esse argumento fascistóide, porque ninguém está escondendo nada”. O ex-senador insiste: "está na Constituição, a Receita tem de respeitar”.
Ele lembrou o episódio de que o PT foi vítima em 1989, quando o então candidato Fernando Collor usou um fato particular da vida de Lula na campanha. Utilizou a família para atacar o adversário. “Eles fizeram, agora, aquilo que sofreram na época; e isso não pode ser entendido nem como vingança histórica, até porque Collor está lá com eles”, disse Freire.

Consumidor difama empresa de turismo na imprensa e paga indenização menor

Consumidor difama empresa de turismo na imprensa e paga indenização menor
Um consumidor comprou um pacote de turismo da empresa e teve uma série de problemas com a viagem. Decidiu, então, publicar na imprensa diversas matérias alardeando os maus serviços prestados, o que fez a empresa de turismo conseguir na Justiça o direito à indenização por danos à imagem. A sentença de primeiro grau reconheceu o conteúdo abusivo das matérias publicadas na imprensa e julgou parcialmente o pedido da empresa de turismo. O consumidor recorreu ao TJSP, argumentando que o valor da condenação era exagerado, mas o Tribunal manteve a decisão do juiz singular. O STJ reduziu o valor da indenização por danos morais a ser paga por um consumidor à empresa de turismo.

S.Salvador para O Estado de Minas

A perdedora

A perdedora
Panorama Econômico
Míriam Leitão

Já se sabe quem perdeu a eleição de 2010: a Receita Federal. O órgão sai dessa campanha com uma queda violenta de credibilidade. Pelo que fez, pelo que deixou de fazer, pelo que deixou que fizessem em suas repartições, a Receita que tinha o respeito dos brasileiros - e o temor dos sonegadores - hoje está reduzida a um braço de um partido político.
A violação do sigilo fiscal da filha do candidato José Serra é daqueles fatos que acabam com quaisquer dúvidas que por acaso ainda persistiam. A resposta dada pela Receita de que interposta pessoa levou procuração pedindo para quebrar o sigilo da contribuinte foi espantosamente grosseira. Quem pare um minuto para pensar na explicação do órgão sabe que não faz sentido algum. Quer dizer então que uma pessoa com documento falsificado pode pedir informações protegidas? As primeiras apurações derrubaram a versão oficial.
Na campanha governista a avaliação é que este assunto não terá impacto eleitoral porque apenas alguns milhões de brasileiros declaram imposto de renda no país. Isso equivale a dizer que crimes que atingem poucos eleitores podem ser cometidos, sem problema, desde que não ponham em risco a eleição da candidata do governo.
A atual direção da Receita tem cometido erros sequenciais. Não presta as informações necessárias, protela deliberadamente o esclarecimento do assunto, dá explicações inaceitáveis para os fatos dos quais não consegue escapar. Num dos seus piores momentos, a Receita Federal quis garantir que não era um evento com motivações políticas, explicando que era um caso de corrupção. Se há um balcão de compra e venda de informações sigilosas num órgão que tem a prerrogativa de ser a guardiã desse sigilo, é gravíssimo. Isso não atenua o descalabro.
No caso de ser uma espionagem política, e com fins bem óbvios, é preciso que se saiba tudo antes do fim do pleito. É urgente que se faça uma investigação que acabe com as dúvidas e não as aumente.
Há um claro exagero do PSDB em pedir a cassação do registro da candidata que está em tão confortável vantagem nas intenções de voto. Por outro lado, Dilma Rousseff, seu entorno, e o governo têm feito declarações espantosamente amenas ou equivocadas diante da gravidade do caso. Reiteradamente eles têm tentado subestimar o que está acontecendo dizendo que é briga de campanha. Dilma disse esta semana que o PSDB "tem trajetória de vazamentos e grampos expressiva." Falou para justificar os fatos que estão sendo divulgados. Referiu-se ao caso das fitas gravadas no BNDES. Não há qualquer comparação possível. As fitas do BNDES tentavam comprometer pessoas do próprio governo - e não políticos de um partido adversário em campanha. Elas foram resultado de gravação ilegal, as pessoas foram identificadas, e foram condenadas.
A candidata precisa mostrar seriedade no trato dessa questão - ainda que tarde. Esse tipo de resposta criada por assessor pode dar a impressão de esperteza, mas o que passa é a convicção de que está se aceitando como banal e corriqueiro o que é inaceitável, a quebra de um princípio constitucional.
O Estado não pode ser usado pelo partido que está temporariamente no poder para espionar adversários políticos. Foi isso que derrubou o então presidente Richard Nixon no caso Watergate. É preciso restaurar a noção da dimensão do crime de usar a máquina para espionar e usar informações, entregues ao Estado, como parte da guerra eleitoral. A luta tem que ser travada apenas em torno de ideias, projetos, estilos de governo.
O secretário Otacílio Cartaxo disse que a Receita foi "pega de surpresa" e que "está traumatizada". Causa com isso novos danos à imagem do órgão, que sempre teve reputação de competência. Quebra-se o sigilo fiscal em bases seriais e o fato nem é notado, monta-se um balcão de compra e venda e isso só vem a público pela imprensa.
Para evitar o trauma, a Receita precisa rapidamente trabalhar para mitigar o dano à sua imagem. Isso só se faz se houver uma apuração rigorosa e ágil. A demora nesse caso deixará a impressão de acobertamento. E se for isso a desconfiança se espalhará por toda a instituição.
No governo Lula, o aparelhamento de alguns órgãos ficou acima do tolerável. Como o que acontece com o Ipea, por exemplo. O órgão não foi usado nem mesmo pelos militares durante a ditadura, e, ao contrário, tornou-se uma espécie de centro de pensamento crítico que produziu análises valiosas para o país. Agora virou estação repetidora do partido. A qualidade dos estudos comandados pela presidência do órgão é sofrível. A imagem do instituto só não está inteiramente demolida porque alguns resistentes, ainda que marginalizados, continuam mantendo a capacidade de produção de informação de qualidade no órgão. Mas hoje, o Ipea, com seus exóticos escritórios em Havana e Caracas, é uma sombra do que foi nos anos em que sua inteligência foi tão útil ao país.
O primeiro sinal de que a Receita Federal não era mais um território protegido do uso indevido aconteceu na queda da ex-secretária Lina Vieira, derrubada por ter dado informações que constrangeram a hoje candidata Dilma Rousseff. O caso nunca foi suficientemente esclarecido. Até o fato de não haver ainda a foto dela na parede dos ex-secretários da Receita é um sinal estranho. Lembra os regimes autoritários que mudam a história pregressa e apagam personagens que incomodam.
Construir a reputação de seriedade, competência e neutralidade da Receita Federal custou muito trabalho. Esse patrimônio está sendo destruído nessa eleição. É ela, a Receita, a perdedora. Mais do que as vítimas da espionagem.

Descalabro

Descalabro
EDITORIAL
FOLHA DE SÃO PAULO - 02/09/10

Novas revelações reforçam aspecto político da quebra de sigilos na Receita e exigem apuração que vá além da tentativa de culpar barnabés
A empresária Veronica Serra, filha do candidato tucano à Presidência da República, José Serra, também teve seu sigilo fiscal violado por funcionários da Receita. O caso se soma a outros, noticiados recentemente, no que já se configura como mais um escândalo nacional. O novo capítulo reforça a percepção de que as ações criminosas no âmbito do órgão federal têm motivações políticas.
É bom recapitular a sucessão dos fatos para que se tenha noção mais clara do banditismo em curso: em junho, esta Folha revelou que Eduardo Jorge Caldas Pereira, vice-presidente do PSDB, teve seu sigilo fiscal violado no ano passado. Dados do Imposto de Renda do dirigente tucano integravam um dossiê confeccionado pelo grupo de inteligência da campanha presidencial de Dilma Rousseff (PT), que negou participação no episódio.
Há uma semana, descobriu-se que outros três nomes ligados ao PSDB também haviam sido vítimas de idêntico abuso, na mesma agência da Receita, localizada em Mauá, na região do ABC paulista, berço do PT e reduto histórico do sindicalismo atrelado ao partido.
Tudo leva a supor que a violência perpetrada contra a filha de Serra faça parte de uma mesma articulação delinquente a serviço da candidatura petista.
No que se refere a Veronica Serra, há algumas diferenças de procedimento em relação às demais violações. O acesso aos dados fiscais ocorreu na delegacia da Receita de Santo André, também no ABC, mediante uma procuração fajuta. A filha de Serra não tinha firma reconhecida no cartório, a assinatura que consta no documento não é a sua, e o carimbo utilizado é falso. Além disso, o titular da procuração utilizava cinco CPFs e ostenta vasto histórico de cheques sem fundo -um perfil típico do estelionatário.
Sabe-se já da existência de um esquema criminoso de compra e venda de dados sigilosos envolvendo a agência de Mauá. Ali teriam acontecido pelo menos 320 acessos sem amparo legal.
Estarrecedor, o descalabro está sendo usado como cortina de fumaça pelo governo para tentar despolitizar o escândalo. Se há crime comum, há também crime político-eleitoral, cuja intenção é intimidar e chantagear adversários do grupo hoje no poder.
Não bastassem as evidências (há petistas entre as vítimas?), é preciso registrar que o atual governo tem caudaloso histórico de aparelhamento do Estado - do mensalão à quebra de sigilo do caseiro, dos aloprados de 2006 aos delinquentes de agora.
Instalou-se no país um ambiente intolerável de impunidade e desfaçatez. Espera-se que a Polícia Federal e o Ministério Público ainda reúnam condições de desmascarar a farsa de uma investigação propensa a apontar a responsabilidade de barnabés e ocultar as motivações políticas que, conforme todos os indícios, estão por trás do caso.

Amorim

A escolha de Serra, parte 2

A escolha de Serra, parte 2
DEMÉTRIO MAGNOLI

José Serra implodiu sua campanha presidencial nos primeiros dias do horário gratuito, no momento em que colou um retrato de Lula à sua imagem, sugerindo uma falsa associação política. O truque circense de quinta categoria talvez enganasse uns poucos desavisados, se Lula estivesse morto. Como está vivo, e fala, ninguém caiu no conto urdido por insuperáveis gênios do marketing eleitoral.
Mas o gesto teve um impacto avassalador, palpável o suficiente para ser registrado tanto nas pesquisas quanto nas conversas de rua: milhões de eleitores de Serra desertaram indignados, declarando-se fartos do baile de máscaras promovido pelo candidato.
A associação farsesca não correspondeu a um equívoco episódico, mas foi o prolongamento e a conclusão lógica de uma estratégia de campanha alicerçada sobre a abdicação do direito de fazer oposição. Seria um erro político, ainda que uma verdade factual, afirmar que Serra traiu seu eleitorado. O que ele fez foi desrespeitar o eleitorado em geral — e, portanto, a democracia — ao negarlhe a oportunidade de escolher entre situação e oposição. A sua derrota não será um fracasso eleitoral, evento normal no sistema democrático, mas o sinal anunciador de uma falência política.
Bem antes do gesto catastrófico, a campanha já se equilibrava precariamente sobre uma corda frouxa, trançada com os fios complementares da arrogância e da covardia. Arrogância: a crença quase mística nos efeitos da comparação entre as biografias de Serra e da candidata oficial. Covardia: a decisão inabalável de não confrontar o lulismo com uma visão alternativa sobre o governo, o Estado e a nação. Guilhon Albuquerque, defendendo a campanha do PSDB da crítica que formulei (em “A escolha de Serra”, de 8 de julho), inspirou-se nas metáforas primitivas de Lula e citou o técnico da seleção espanhola de futebol: a ordem era “jugar para ganar”, não para “sair engrandecido aos olhos de um setor da elite”.
O que dizer disso agora, quando a realidade berra? Na democracia, eleições são para esclarecer. “Jugar para ganar” é orientação típica de potenciais ditadores, que pretendem fraudar. Ou de candidatos que tratam os cidadãos como estúpidos — e pagam o preço cobrado por tal escolha.
Dilma Rousseff, o pseudônimo eleitoral de Lula, era a favorita desde o tiro de largada, por razões óbvias, mil vezes expostas. Isso não significa que inexistia uma disputa competitiva, como pontificam analistas seduzidos por uma estranha noção de destino histórico.
Mas, para ter uma chance de mudar o cenário prévio, Serra precisaria agir como estadista — isto é, como a figura que se ergue acima das circunstâncias, desafia o senso comum, afronta setores de sua própria base partidária e oferece aos eleitores uma narrativa política transparente, equilibrada e franca. É bem fácil pinçar críticas fragmentárias de Serra ao governo e à sua candidata.
Contudo, como estilhaços de uma granada perdida, elas nunca formaram um conjunto coerente, capaz de sintetizar uma aspiração de mudança.
A abdicação de Serra tem um precedente ainda vivo na memória pública. Quatro anos atrás, a campanha presidencial de Geraldo Alckmin entrou em colapso logo após o primeiro turno, quando o candidato cobriu-se com os logotipos das empresas estatais para sublimar o debate sobre as privatizações de FHC. Os dois postulantes do PSDB destruíram a si mesmos por meio de gestos paralelos de rendição política. Há, nisso, algo mais que uma coincidência.
No debate televisivo inaugural, Serra proclamou que não disputa eleições “de olho no retrovisor”. A frase de efeito, que denota desconforto com o passado, veicula uma canhestra tentativa de passar uma borracha sobre a história e evidencia uma fundamental incompreensão da democracia.
Eleição é o momento no qual a nação revisita suas opções pretéritas reflete sobre as diferentes estradas que conduzem ao futuro. Tanto quanto Alckmin, Serra resolveu circundar a discussão sobre o governo FHC — e, exatamente para isso, pendurou um retrato de Lula ao lado do seu. O repúdio tácito à própria herança, com seus acertos e erros, anulou qualquer possibilidade de analisar criticamente o governo Lula e o PT, inscrevendoos numa narrativa inteligível da trajetória recente do Brasil.
Lula depreda cotidianamente a inteligibilidade da política democrática. A campanha de sua candidata, uma fábula sobre o “pai da nação” que entrega seus filhos aos cuidados transitórios da “mãe do povo”, assinala um novo ápice no percurso deflagrado antes mesmo de 2002. Serra converteu-se, agora, em cúmplice ativo dessa operação de esvaziamento do sentido da linguagem política. Uma diferença crucial, entretanto, não pode ser esquecida: o lulismo, autoritário em essência, nutrese da babel de sons indecifráveis, enquanto as correntes democráticas só podem florescer no terreno constituído pela ordem da sintaxe e da gramática.
O lulismo não depreda apenas a linguagem, mas também os direitos. São múltiplos, convincentes, os indícios de que um “núcleo de inteligência” da campanha de Dilma comandou as quebras em sequência dos sigilos fiscais de pessoas próximas a Serra, com o intuito provável de montar um plano eleitoral de emergência para a hipótese de uma disputa renhida. Serra (e, por sinal, todos os candidatos comprometidos com as garantias democráticas) tem não só o direito, mas o dever de expor na campanha eleitoral as sementes do Estado policial, relacionando o que se passa hoje com o episódio da invasão do sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa. Desgraçadamente, porém, a denúncia só atingirá aqueles que, por já reconhecerem uma prática reiterada, não precisam dela. Os demais, uma larga maioria, não entenderão a narrativa sem nexo de um acusador que pretende associar sua imagem à do governante acusado. Mais adiante, não culpem o povo — que não tem a oposição que merece.
Lula depreda cotidianamente a inteligibilidade da política democrática

Por que tão altos?

Por que tão altos?

Celso Ming - O Estado de S.Paulo - 02/09/2010


Ontem, o Copom manteve os juros básicos (Selic) nos 10,75% ao ano, patamar em que provavelmente deverão ficar neste resto de ano.
Embora em queda no longo curso, são juros básicos ainda altos demais para uma economia que precisa de investimentos. No mundo rico prevalecem hoje juros reais (descontada a inflação) negativos, enquanto por aqui estão em torno dos 5% ao ano. Nessas condições, são um dos principais fatores do alto custo Brasil, especialmente quando comparados com os custos nação de outras paragens com as quais o País compete mais diretamente, especialmente no comércio exterior.
A tendência de juros baixos no mundo por um longo período é excelente condição que pode permitir a redução deles também por aqui, desde que algo mais se faça para que isso aconteça. Algumas dessas providências exigirão mudanças no mercado financeiro. Outras, no sistema de metas de inflação. Para que os juros caiam, parece inevitável, por exemplo, que se elimine uma das mais graves distorções, que é a utilização de títulos públicos com renda pós-fixada atrelada aos juros básicos, principalmente a Letra Financeira do Tesouro (LFT), criada em 1987, durante o Plano Cruzado, quando ajudou a evitar fuga de dólares.
A LFT tem sido bastante criticada na medida em que impossibilita a formação de um mercado de títulos de longo prazo no País. É que a remuneração de um título que deveria ser de prazo longo, acaba sendo de prazo curtíssimo. Isso posto, não consegue formar poupança que possa casar com financiamentos mais esticados.
Mas, do ponto de vista da política monetária, a LFT impede perdas patrimoniais, caso os juros tenham de aumentar, porque está amarrada à Selic, ou seja, será o que forem os juros básicos. Explica-se: em toda parte, a remuneração dos títulos públicos é prefixada e pune o mercado quando produz inflação. Mas, no Brasil, mais de 40% da dívida em títulos da União está em LFTs. É o carro de corrida que não tem aerofólios e exige muito mais do sistema de freios. Ou seja, exige que o Banco Central redobre a dose dos juros para dar eficácia à política monetária cujo objetivo é controlar a inflação.
O outro emperrador do funcionamento do sistema de metas é a persistência no Brasil de uma enorme faixa de preços que não tem nenhuma relação com o volume de dinheiro na economia e que, assim, não reage à política de juros. Esses preços são reajustados de acordo com o definido em leis ou em contratos, que, em geral, impõem como critério de reajustes um índice de inflação. É o caso dos preços administrados (tarifas de telefone, água, energia elétrica e aluguéis), que correspondem a alguma coisa entre 30% e 35% da planilha do custo de vida. Na maioria das vezes, são reajustados pelo IGP-M, índice que reflete com grande peso as variações dos preços das matérias-primas e do dólar. No caso dos preços administrados, tanto faz que o Copom aumente ou baixe a Selic. O efeito sobre eles é apenas residual. E isso exige, também, mais dose de juros do Copom para reduzir a inflação.
Sem uma profunda revisão nesses dois pontos, vai ser difícil dar mais eficiência ao sistema de metas e, ao mesmo tempo, garantir a derrubada dos juros básicos no Brasil.
Bombando As importações do Brasil continuam disparando. Na acumulada do ano (até agosto) cresceram 45,7%, enquanto, no mesmo período, as exportações aumentaram 28,0%.
É a produção Bens de capital, matérias-primas e produtos intermediários perfazem 68,9% das importações totais. No ano passado, eram 71,0%.
Perda de peso Neste ano, os manufaturados correspondem a 39,7% das exportações. Em 2009, foram 42,5%

Bello, hoje na Tribuna de Minas

Culpa no cartório

Culpa no cartório

Dora Kramer

O Estado de S. Paulo - 02/09/2010
Quanto mais o governo tenta esconder, quanto mais a candidata Dilma Rousseff tergiversa, quanto mais a Receita Federal procura se explicar, mais suspeita fica essa história da quebra de sigilo fiscal na delegacia da Receita em Mauá (SP).
Nesta altura da confusão em que até a filha do candidato José Serra entrou no caso, não é possível deixar de desconfiar de que há motivações espúrias que se reveladas poderiam trazer prejuízos à campanha presidencial governista.

Das artimanhas do Planalto para fugir do assunto, a última envolve o ministro da Fazenda, Guido Mantega, cuja filha recentemente foi envolvida numa dessas escaramuças de espionagem petista. Na ocasião Mantega e, por extensão, a filha foram defendidos pelo tucano Serra em seu direito à privacidade.
O esforço de parlamentares governistas ontem para derrubar a tentativa de convocação do ministro da Fazenda ao Congresso para dar esclarecimentos a respeito do que, afinal de contas, se passa na Receita (subordinada à Fazenda), foi praticamente uma confissão de que a oposição tem razão: o PT está mesmo com a culpa registrada em cartório.
Organizou ou, no mínimo, se aproveitou da farra reinante naquela delegacia da região do ABC para bisbilhotar as declarações de renda de pessoas ligadas ao candidato do PSDB e que, ao juízo do PT, poderiam render informações para ser usadas na campanha contra o adversário.
Não há outra explicação para o governo correr dessa raia de maneira tão desabrida e injustificável.

Primeiro nega qualquer problema, depois envia o secretário da Receita ao Congresso para mentir e omitir. Ao mesmo tempo protege os funcionários que estão sendo investigados como responsáveis pela quebra de sigilo e em momento algum há uma manifestação firme de alguma autoridade em repúdio ao descalabro das violações em série.
Ao contrário, do governo só o que se vê é disfarce e revide de acusações. Chegou-se ao ápice, quando da apresentação de "comprovação" de que Verônica Serra pediu a quebra do próprio sigilo, de a Receita apresentar um documento falsificado. Apressado, o governo não verificou antes a procedência da assinatura.
A história está ficando parecida com a quebra de sigilo do caseiro Francenildo Costa, quando para encobrir um malfeito se cometeu outro e depois se tentou incriminar a vítima mediante uma urdidura logo desmascarada.
Se para se chegar a um autor de crime é preciso seguir a pista do interesse, agora é de se perguntar a quem não interessa esclarecer o mistério da delegacia de Mauá.
Der e vier. Na sala de visitas ninguém quer a companhia de José Dirceu. Daí Dilma negar que já pense na formação de governo quando se pergunta sobre o papel de Dirceu, mas discorrer sobre os planos no Planalto quando a questão não o inclui.
Ele atuará de qualquer forma caso Dilma seja eleita porque continua sendo "capa preta" do partido. Dada a condição de acusado de chefiar "organização criminosa" no processo em trâmite no Supremo Tribunal Federal, se não atuar no oficial agirá no paralelo.
Veste Prada. Um mês antes da eleição o PT dá a vitória como fava contada e, a despeito das negativas oficiais da candidata, Dilma já cancela debates e até suspendeu a prometida divulgação do programa de governo conjunto com os aliados.
Depois de desmoralizar a ética, os Correios, o contraditório, o Enem, a verdade e a Receita, o governo agora se empenha em desmoralizar o valor do voto na urna.
"A eleição está ganha" é frase que se ouve de governistas de primeiro, segundo, terceiro e quarto escalões.
De tal maneira deixaram de lado a prudência que, se houver segundo turno, vai recender a derrota.
O diabo, como se sabe, é longevo não por ser diabo, mas por ser velho e o seguro morreu de velho.

Solda, para O Estado do Paraná

Democracia em perigo

Democracia em perigo
Merval Pereira – O Globo

A face mais dura do aparelhamento do Estado brasileiro por forças políticas está sendo revelada nesse episódio da quebra do sigilo fiscal da filha do candidato do PSDB à Presidência da República. Em um país sério, o secretário da Receita já teria se demitido, envergonhado, ou estaria demitido pelo seu chefe, o ministro da Fazenda Guido Mantega. E alguém acabaria na cadeia.
Ao contrário, o secretário Otacílio Cartaxo tentou até onde pôde minimizar a situação, preferindo despolitizar o caso e desmoralizar sua repartição.
Ao mesmo tempo surgem de vários lados do governo tentativas de contornar o problema, ora atribuindo à própria vítima a culpa da quebra de seu sigilo fiscal, ora sugerindo que uma disputa política dentro do próprio PSDB poderia ter gerado a quebra do sigilo fiscal de Verônica Serra.
Uma análise muito encontradiça entre os políticos governistas é de que as denúncias, tendo aparecido em período eleitoral, perdem muito de sua credibilidade e de seu poder de influenciar o voto do eleitor, ficam com sabor "eleitoreiro".
Como se essa fosse a questão central. Pensamentos e atos de quem não tem espírito público.
O aparelhamento político da máquina pública não ocasiona apenas a ineficiência dos serviços, o que fica patente em casos como o dos Correios, outrora uma empresa exemplar e que se transformou em um cabide de empregos que gera mais escândalos de corrupção do que seria possível supor.
Dessa vez a revelação de que a Receita Federal transformou-se em um balcão de negócios onde o sigilo fiscal dos cidadãos brasileiros está à venda, seja por motivos meramente pecuniários, seja por razões políticas, coloca em xeque uma instituição que, até bem pouco tempo, era respeitada por sua eficiência e pelo absoluto respeito aos direitos dos cidadãos.
O episódio da quebra do sigilo fiscal do vice-presidente do PSDB Eduardo Jorge Caldas Pereira, de três pessoas ligadas de alguma maneira ao partido ou ao candidato oposicionista e, mais grave, da sua filha, mostra que diversas agências da Receita Federal são utilizadas para práticas criminosas, não apenas a de Mauá, que se transformou em um local onde se compra e se vende o sigilo de qualquer um.
O sigilo de Verônica Serra foi quebrado na agência de Santo André, numa demonstração de que se vulgarizou a privacidade dos contribuintes brasileiros.
Não terá sido coincidência que, além de Verônica, os nomes ligados ao PSDB que tiveram seu sigilo fiscal quebrado - Luiz Carlos Mendonça de Barros, Ricardo Sérgio de Oliveira e Gregório Marin Preciado - sejam personagens de um suposto livro que o jornalista Amaury Ribeiro Junior estaria escrevendo com denúncias sobre o processo de privatizações ocorrido no país durante o governo de Fernando Henrique.
O jornalista fazia parte do grupo de comunicação da campanha de Dilma Rousseff, subordinado a Luiz Lanzetta, e os dois tiveram encontro com um notório araponga tentando contratá-lo para serviços de espionagem que incluíam grampear o próprio candidato tucano à Presidência.
Além da denúncia do araponga, delegado aposentado da Polícia Federal Onésimo de Souza, feita no Congresso, outro ator do submundo petista surgiu nos últimos dias denunciando manobras criminosas nas campanhas eleitorais.
Wagner Cinchetto, conhecido sindicalista, afirmou ao "Estado de S. Paulo" e à revista "Veja" que o núcleo envolvido com a violação de sigilo fiscal de tucanos na ação da Receita é uma extensão do grupo de inteligência criado em 2002 por lideranças do PT.
Ele diz ter certeza de que os mesmos personagens atuam nos dois episódios. Revelou que o escândalo que levou ao fim a candidatura de Roseana Sarney em 2002 foi montado por esse grupo petista para incriminar o então candidato tucano à Presidência, José Serra, que foi considerado responsável pela denúncia pela família Sarney.
Até mesmo um fax teria sido enviado ao Palácio do Planalto para dar a impressão de que a Polícia Federal havia trabalhado sob a orientação do governo de Fernando Henrique.
No caso atual, os diversos órgãos do governo envolvidos na apuração - Polícia Federal, Receita Federal, Ministério da Fazenda - tiveram atuação leniente, e foram os jornais que descobriram rapidamente que a procuração era completamente falsa, desde a assinatura de Verônica Serra até o carimbo do Cartório do 16º Tabelião de Notas de São Paulo, onde aliás Verônica nunca teve firma.
Não basta a Receita dizer que por causa de uma procuração está tudo legal. Não faz sentido que qualquer pessoa que apareça em qualquer agência da Receita Federal com uma procuração possa ter acesso a dados sigilosos.
Aliás, o pedido em si não faz o menor sentido. Então o contribuinte que declara seu imposto de renda não tem uma cópia?
Agora, que quase todo mundo declara pela internet, como não ter uma gravação da declaração?
A funcionária da Receita que achou normal a apresentação da procuração deveria ter desconfiado de alguma coisa, pelo menos do fato de uma pessoa que declara seu imposto de renda na capital de São Paulo mandar um procurador a uma agência de Santo André para ter acesso a uma cópia.
O contador Antônio Carlos Atella Ferreira admitiu que foi ele quem retirou cópias das declarações de IR de Verônica Serra na agência da Receita Federal em Santo André, mas alega que fez isso por encomenda de uma pessoa que "queria prejudicar Serra".
Mais uma história mal contada. E tudo leva ao que aconteceu em 2006, quando um grupo de petistas ligados diretamente à campanha de Aloizio Mercadante e à direção nacional do PT foi preso em flagrante tentando comprar um dossiê, com uma montanha de dinheiro vivo, contra Serra, candidato ao governo de São Paulo, e Alckmin, o candidato tucano à Presidência.
O presidente chamou-os de "aloprados", indignado nem tanto com o episódio em si, mas com a burrice de seus correligionários que acabaram impedindo que ganhasse a eleição no primeiro turno.
Hoje o caso é mais grave, pois envolve um órgão do Estado que deveria proteger o sigilo de seus cidadãos.
O que menos importa é se a repercussão do caso influenciará o resultado da eleição. O grave é a ameaça ao estado de direito embutida nesse uso da máquina pública para chantagem eleitoral.

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