domingo, junho 27, 2010

Corrupção no front

Corrupção no front
ANTONIO CAÑO

Como se a polêmica desatada pelo general Stanley McChrystal, ex-comandante dos EUA no Afeganistão, não fosse suficiente, um relatório apresentado na última terça-feira pelo Congresso americano complica ainda mais o debate sobre a presença militar do país no Afeganistão, ao denunciar que milhões de dólares do Pentágono acabam caindo nas mãos dos caciques locais, como pagamento de chantagens, ou inclusive de extremistas insurgentes.
A corrupção, uma epidemia denunciada pelo governo americano e que o presidente afegão, Hamid Karzai, tem se mostrado incapaz de extirpar, se estende agora à atividade das Forças Armadas com risco de deslegitimar ou fazer mais impopular sua atuação.
O informe do Congresso assegura que uma fração dos US$ 2,1 bilhões que se destinam ao transporte de material militar no Afeganistão se dedica a pagar aos senhores da guerra, para que protejam os comboios com seus exércitos privados ou, simplesmente, para que não os ataquem. Em algumas ocasiões, o dinheiro tem servido também para compensar a indulgência dos talibãs com a passagem de caminhões pelo território sob seu controle.
O dinheiro não era entregue a seus destinatários pelos próprios militares, mas por empreiteiros privados, encarregados de proteger o transporte. Assim, se violava tanto o código de conduta do Departamento de Defesa como a legislação recente, produzida na esteira dos abusos cometidos no Iraque.
O transporte é uma das atividades que mais tempo ocupa uma força que teve que deslocar 30.000 novos soldados para a zona de combate com suas correspondentes necessidades logísticas.
Cerca de 70% desse transporte se realizam por terra, o que exige medidas de segurança que o Exército se vê incapaz de cumprir por si só, sem abandonar suas obrigações de combate.
Esse problema logístico tem provocado um outro muito mais profundo, de caráter político. Ao pagar os talibãs, os EUA estão facilitando seu fortalecimento e reconhecendo sua autoridade no âmbito local. Ao pagar-lhes com recursos do contribuinte americano, fica minada a justificativa moral da guerra e seu apoio entre os americanos.
“As descobertas deste informe são tristes e impactantes”, disse o representante democrata John Tierney, que preside o comitê da Câmara dos deputados responsável por este trabalho.
Há pouco, a secretária de Estado, Hillary Clinton, citou a injeção de dinheiro estrangeiro como uma das principais causas da corrupção no Afeganistão. O próprio Obama recriminou Karzai em Cabul pela falta de energia para combater esse mal.
Agora, quando se descobre que militares americanos favorecem essa rede de extorsão, tanto Obama como Clinton veem reduzida sua autoridade para exigir-lhes o que eles mesmos não podem controlar.

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