sábado, junho 26, 2010

Guerra contra drogas tem novos desafios

Guerra contra drogas tem novos desafios
O Globo - oPINIÃO

O mundo está perdendo a guerra contra as drogas. Um relatório do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes (UNODC) atesta a ineficácia dos métodos convencionais de enfrentamento do tráfico de entorpecentes centrados em ações policial-militares, de inspiração americana. É bem verdade que as operações de guerra contra os cartéis colombianos, ponta de lança da política internacional antidrogas dos Estados Unidos, tiveram reflexos positivos no abastecimento de cocaína para o país. De 2007 a 2008 caiu o consumo entre os adultos. Mas é na outra face da moeda que reside o problema.
O que poderia ser contabilizado como um avanço na luta contra os tóxicos evidencia apenas que se manteve uma conhecida tendência: sufocado numa determinada região, o tráfico migra para outras áreas. Foi o que aconteceu nos últimos anos. Novas rotas foram abertas pelos traficantes, com a conquista de outros mercados e uma mudança substancial na geografia do consumo: à perda de espaço do pó nos EUA correspondeu um aumento na Europa.
Países da África e da América do Sul, com um preocupante incremento da participação do Brasil, se reafirmaram como rota de exportação para Itália, Espanha e Inglaterra.
Para agravar o quadro, em todo o mundo cresce a demanda por drogas sintéticas.
O relatório da ONU admite que as alterações na produção, no comércio e no perfil de consumo expandiram o tráfico e, por conseguinte, ampliaram os desafios a serem enfrentados pelos governos.
O realinhamento do tráfico consolidou a Venezuela e o Brasil como países de trânsito do comércio de drogas. De acordo com o documento do UNODC, a primeira responde por mais da metade dos carregamentos de entorpecentes que chegam à Europa por via marítima; pelo território brasileiro passam 10% das cargas. Na Venezuela, a ONU aponta como inquietante a atuação do narcotráfico, nos moldes das Farc colombianas, através de organizações como a Frente Bolivariana de Libertação, que contam com a simpatia de Chávez. É emblemático — e igualmente digno de apreensão — que também no Peru, desde o alinhamento do grupo terrorista Sendero Luminoso com as Farc, comércio e produção de drogas tenham acompanhado o crescimento da demanda. Não por acaso, os índices de violência dispararam naqueles dois países.
Todo este movimento internacional na produção, na comercialização ou no perfil do usuário é clara evidência de que o consumo de entorpecentes continua crescendo. É imperioso que seja revista a política global de combate a essa tragédia que abastece fortunas construídas ao preço da desgraça de milhões de famílias. Tratar as drogas apenas como caso de polícia não atende à complexidade do problema. Países que descriminalizaram o consumo, apertaram o cerco ao tráfico e passaram a cuidar dos viciados com princípios da saúde pública, em vez do tacão policial, registram resultados positivos. Obrigar o tráfico a migrar pode maquiar estatísticas regionais, mas tal política, analisada globalmente, reflete apenas novas arrumações do crime, com a ampliação do flagelo pela conquista de novos mercados.

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