quarta-feira, maio 19, 2010

A MOTIVAÇÃO DE UM PLANO TEMERÁRIO

A MOTIVAÇÃO DE UM PLANO TEMERÁRIO
EDITORIAL - O GLOBO - 19/5/2010
A iniciativa de Brasil e Turquia de fechar um acordo com o Irã sobre seu programa nuclear, para evitar a imposição de sanções ao país, sofreu duro golpe com o anúncio, pela secretária americana de Estado, Hillary Clinton, de que as principais potências, incluindo Rússia e China, também chegaram a um acordo.
Mas sobre o anteprojeto de resolução que submete o Irã a novas sanções a ser apreciado pelo Conselho de Segurança da ONU.A resposta-relâmpago das potências, à frente os EUA, ao acordo fechado com o presidente Ahmadinejad, em Teerã, pelo presidente Lula e pelo premier turco, Erdogan, realça as lacunas da empreitada de Brasil e Turquia. São elas: 1) a quantidade de urânio que o Irã se comprometeu a enviar ao exterior representa, hoje, percentual bem menor do estoque total do país do que quando o plano foi inicialmente apresentado pela AIEA, em outubro de 2009; 2) o acordo não faz qualquer menção à necessidade de o Irã abrir instalações nucleares à inspeção internacional, vital para constatar a finalidade do programa, se puramente civil ou também militar; e 3) imediatamente após o acordo ser fechado, o Irã anunciou que continuaria a enriquecer urânio.

Desde que, durante visita ao Oriente Médio, Lula se apresentou como candidato a mediador entre palestinos e israelenses, cresceu a desconfiança de que talvez ele estivesse sendo levado pela ingenuidade ou mero desejo de protagonismo mundial.Mas, em relação ao Irã, na companhia da Turquia, é claro hoje que não houve qualquer ingenuidade por parte da atual política externa brasileira.
O entendimento anunciado ontem pela secretária pôs por terra um dos efeitos mais esperados, tanto pelo Irã quanto pelo Brasil e pela Turquia, de seu feito diplomático em Teerã: a protelação das sanções, o que daria à ditadura teocrática iraniana mais tempo para, com suas centrífugas trabalhando a todo vapor, obter mais combustível para armas nucleares, que exigem percentual de enriquecimento bem acima dos 20% previstos no acordo. Quando se observa o jogo arriscado em que a diplomacia brasileira tem se metido em Honduras, em Cuba, na Venezuela, em votos contra a tradição brasileira em fóruns internacionais, e agora no Irã fica visível a política de confronto sistemático aos interesses americanos.
O New York Times, citando fontes da Casa Branca, informou que o presidente Obama conversou com Lula e Erdogan, durante a Cúpula sobre Segurança Nuclear, em Washington, no mês passado, sobre a necessidade de não se dar ao Irã pretexto para não cumprir as exigências da ONU. Obama reiterou sua preocupação em cartas detalhadas aos dois líderes no final de abril. De nada adiantou. Há sérias consequências que, espera-se, estejam sendo levadas em conta pelos artífices dessa política brasileira, o Itamaraty do B. Uma delas se fez sentir no contra-ataque diplomático rápido dos EUA.
A opção brasileira pôs em risco um esforço necessário da comunidade internacional para conter um foco de desequilíbrio que tornará ainda mais volátil e perigosa a situação do Oriente Médio. Lembre-se de que o Irã é o patrocinador de grupos radicais terroristas como o Hezbollah, no Líbano, e o Hamas, na Faixa de Gaza. Imagine-se um artefato atômico contrabandeado do Irã nas mãos de um desses grupos. Brasil adota política arriscada de confrontos sistemáticos com Washington.

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