quarta-feira, janeiro 26, 2011

Esquizofrenia não pega


Esquizofrenia não pega
SUZANA HERCULANO – HOUZEL - suzanahh@gmail.com
Mas é bom reconhecer que infecções na gestação ou no início da vida podem ter sérias consequências
OS JORNAIS já anunciaram a descoberta de vários "genes da esquizofrenia" ou "da depressão". Curiosamente, são vários os tais genes associados a doenças mentais, e a lista continua aumentando -mas quase nenhum é uma sentença garantida quando trazemos sua versão modificada em nossas células.
A esquizofrenia, por exemplo, tem uma concordância de apenas 50% entre irmãos gêmeos idênticos -o que significa que quando um dos irmãos desenvolve esquizofrenia, em apenas metade dos casos seu gêmeo idêntico, com os mesmos genes, também manifesta a doença.
Algum outro fator, não genético, deve servir como gatilho, então. Episódios de estresse intenso são sabidamente um gatilho comum. Recentemente, infecções logo antes ou depois do nascimento passaram a ser reconhecidas como um fator importante de disparo de distúrbios genéticos mais tarde.
Toxoplasmose, herpes ou citomegalovírus, nessa fase, podem despertar um retrovírus que todos nós trazemos latente em nossas células, integrado ao nosso genoma, conhecido como HERV-W.  Por sua vez, esse retrovírus em atividade causa uma enorme inflamação que pode disparar fatores genéticos latentes de predisposição à esquizofrenia que poderiam passar uma vida inteira quietos, sem causar problemas. É fundamental, contudo, não confundir a virose com a causa da doença mental. O HERV-W já foi erroneamente apelidado de "vírus da insanidade" até pela revista científica "Discover". 
Uma irresponsabilidade, pois dá a entender que a esquizofrenia é contagiosa, causada por esse vírus.
Mas não há uma relação direta: 50% das pessoas com esquizofrenia expressam altas quantidades das proteínas do HERV-W -mas os outros 50%, não. Portar genes deletérios pode não bastar para causar esquizofrenia, mas não é necessário ter o HERV-W ativo para manifestar a doença. O importante é lembrar que esquizofrenia não pega: desenvolver a doença depende de uma combinação de fatores genéticos e, em geral, de um gatilho ambiental (como, sim, uma infecção).
Mas reconhecer que infecções durante a gestação ou logo no começo da vida podem ter consequências bem drásticas mais tarde é ótimo.  Se forem levadas a sério e tratadas logo, quem sabe quantas pessoas poderão manter latentes seus genes problemáticos e levar uma vida com menos problemas. 
SUZANA HERCULANO-HOUZEL, neurocientista, é professora da UFRJ e autora de "Pílulas de Neurociência para uma Vida Melhor" (ed. Sextante) e do blog www.suzanaherculanohouzel.com

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