quarta-feira, abril 21, 2010

Brasília não tem solução em curto prazo.

Por Villas-Bôas Corrêa – Coisas da Política – Jornal do Brasil - 16/04/2010
Remexendo nas gavetas dos guardados, encontrei em meio à barafunda de papeis inúteis, o recorte de O Globo, sem data, mas com alguns meses de sumido na minha gaveta. Trata-se de uma preciosidade, que deveria merecer lugar de destaque nas pífias comemorações de meio século da inauguração de Brasília.
E é a minha flor murcha na crônica dos fracassos da nova capital, que acompanho desde os debates na Câmara dos Deputados, na despedida da sua fase áurea, depois da queda da ditadura do Estado Novo de Getúlio, quando a maioria dos deputados andava de bonde ou de ônibus, poucos tinham carro. Moravam no Rio, viviam com o modesto subsídio, sem verba indenizatória, passagens para o fim de semana nas bases eleitorais, verbas de gabinetes individuais, assessores. Os partidos tinham gabinete, com uma secretária, que batucava na máquina os textos dos deputados. Mas, vamos ao recorte de metade de uma coluna, com meio século de atualidade, que parece que foi escrito hoje para a edição de amanhã:
“O que se está passando na Câmara, a propósito da mudança para Brasília, é inconcebível. Resolveram os congressistas conceder-se três subsídios e mais Cr$ 120 mil para as despesas de transporte, muito embora as despesas com os transportes de parlamentares e funcionários legislativos já estejam a cargo do Estado. Não contentes com isso, promoverão numerosas sessões extraordinárias neste mês e no mês subseqüente à mudança para o Palácio Central. Em abril, a Câmara funcionará sem ordem do dia, isto é, não funcionará. Por sua vez, os funcionários legislativos pleiteiam três vencimentos mensais, diárias, financiamento de carros e transporte gratuito de avião. Trata-se de um verdadeiro saque à Nação”.
Não se pode cair no exagero oposto de que o ensaio para a orgia das mordomias, das mutretas, dos saques aos cofres públicos sejam pecados veniais. Mas, diante do duplo erro do presidente Juscelino Kubitschek de construir Brasília a toque de caixa e da sua inauguração antes de estar pronta, ainda um canteiro de obras no lamaçal do cerrado, a conclusão frustrante é de que JK construiu Brasília e deixou a bomba atômica que a destruiria.
Assisti da bancada de imprensa da Câmara os veementes debates sobre a mudança da capital, prevista na Constituição. E a defesa da bancada goiana que apelava para os argumentos que seriam desmoralizados pela correria para a inauguração em 21 de abril de 1960, nem um dia a mais que JK contava com o slogan JK – 65 para a reeleição que não houve, com o regime democrático desmoralizado pela traição do aloprado Jânio Quadros, com a renúncia aos oito meses de mandato, e a incompetência de Jango Goulart, que traiu o marechal Lott, em parceria com Jânio, na jogada do Jan-Jan.
Os 21 anos da ditadura militar dos cinco generais-presidentes foram mais radicais e violentos que o Estado Novo. Na farsa da democracia forte para uso externo, foi a ditadura que humilhou o Legislativo com o arsenal de violência das torturas nas masmorras do Doi-Codis – em que foi hóspede a provável futura presidenta Dilma Rousseff – cassou mandatos às dúzias, em muitos casos para atender a implicância dos donos do Brasil. A infame censura à imprensa às vezes foi acompanhada com prisão e sua invariável tortura.
Na decadência de Brasília, com a sua favela de mais de milhares de casebres, a população passando dos quatro milhões de habitantes, o absurdo da demagogia rapace de governador eleito, da Câmara Municipal, deputados, vereadores no que deveria ser o Distrito Federal, sede dos poderes da República, com um administrador com qualquer título pomposo de livre nomeação e demissão do presidente da República.
Brasília não tem solução em curto prazo. Só uma reforma política, com a convocação de uma Assembléia Constituinte, para refazer a Constituição que a bagunça de Brasília e a decadência moral das duas Casas do Congresso desmoralizaram até os flagrantes do ex-governador José Arruda distribuindo pacotes de notas que os agraciados escondiam na meia, na cueca, nos bolos e na maleta da precavida senhora, com longa experiência no ramo. 

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