quinta-feira, maio 13, 2010

Coisas de cinema

Coisas de cinema
Rogério Bonato , Jornal do Brasil
RIO - Foz do Iguaçu é uma terra pacífica, mesclada por 72 etnias, entre elas, de descendentes e oriundos de países árabes, onde há muçulmanos sunitas e xiitas. Não se tem notícia de uma única ação terrorista na região, apesar da propaganda mentirosa em contrário. Tudo começou com o atentado contra a Embaixada de Israel em Buenos Aires em 1992 e com a tragédia que arrasou a Associação Mutual Israel-Argentina em 1994. Alguém apontou o dedo acusador para a tríplice fronteira, e a região transformou-se na sucursal do inferno. Mais tarde, depois do fatídico atentado de 11 de setembro de 2001 e a invasão de Cabul, a situação ficou pior.
Quem poderia imaginar que um tímido calendário de farmácia, com a inocente foto de uma cascata, encontrado na casa de um suposto terrorista de Cabul, teria se transformado na única prova irrefutável da ligação macabra entre Foz do Iguaçu e o eixo do terror? Geólogos, turismólogos, biólogos, fotógrafos e entendidos nas belezas do Parque Nacional do Iguaçu tentaram explicar que aquele calendário não retratava nossa atração turística, mas a irracionalidade não deu ouvidos e Foz, com os seus 230 mil habitantes, viu-se inserida no mapa da guerra. Sem perdão, a cidade sofreu um bombardeio de acusações, cidadãos pacatos tiveram seus negócios fechados, alguns foram detidos, e o que se viu foi a ruína de uma região que dependia da imagem para sobreviver. E não ficou só nisso. Em 2003, um professor e jornalista norte-americano, chamado Jeffrey Robinson, escreveu e assinou o maior compêndio de idiotices contra a região, conhecido como The merger, ou A globalização do crime, um best-seller naturalmente lido pelos políticos e formadores de opinião americanos. O que pensar de uma região definida por Robinson como “o ânus do mundo, um posto avançado para os cartéis da droga da América do Sul? Este lugar inóspito se chama Ciudad del Este... essa cidade de 200 mil punguistas, prostitutas, arruaceiros, revolucionários, rufiões, traficantes e viciados em drogas, assassinos, chantagistas, piratas, quadrilheiros, extorsionários, contrabandistas”.
A cidade reagiu ao ataque com humor e com o passar dos anos conseguiu promover eventos, fez do limão azedo a limonada e trouxe de volta os seus visitantes. A farsa impulsionada pela raiva incontida foi freada. No caso do novo projeto da cineasta Kathryn Bigelow, é bom lembrar que Foz do Iguaçu é o paraíso dos diretores, como em A missão, Miami vice e Mr magoo. Enfim, a região centralizou inúmeras produções de qualidade e, mesmo com as invencionices da ficção, superou confusões geográficas capazes de existir apenas na cabeça de alguns roteiristas, como o Amazonas desaguando nas Cataratas.
Agora o “terror” volta a assombrar os moradores e os empresários, que investiram em grandes negócios no ramo do turismo, transporte, hotelaria, e o assunto rouba o sono de todas as pessoas que sabem que terroristas, caso existissem, teriam explodido a Itaipu Binacional, ou mesmo as pontes da Amizade e Tancredo Neves, que interligam o Brasil, Paraguai e Argentina. Neste caso, a preocupação é que o “terror” das telas do cinema possa causar vítimas, dependendo de uma ou outra frase no roteiro, pois a verdade e a ilusão, sabemos, estão separadas por uma linha muito tênue para quem viaja naqueles mágicos 90 minutos.
Rogério Bonato é presidente do braço público da Iguassu Film Commission

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