sábado, julho 10, 2010

Novas regras, velhos problemas

Novas regras, velhos problemas
Anac registra 915 queixas um mês após a ampliação dos direitos dos passageiros. Faltam fiscais
Geralda Doca e Danielle Nogueira - BRASÍLIA e RIO
Na próxima terça-feira, as regras que ampliam os direitos dos passageiros completam um mês. Nesse período, foram registradas na Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) 915 queixas no país contra atrasos, cancelamentos de voo e overbooking (venda de bilhetes acima dos assentos disponíveis), mas nada mudou nos aeroportos, e os usuários continuam desprotegidos de abusos cometidos pelas aéreas. Falta fiscalização da Anac para que as normas sejam cumpridas.
Nas salas de atendimento que ainda restam em dez aeroportos, funcionários terceirizados apenas registram a queixa ou orientam o usuário a ligar para o 0800 ou acessar o site da Anac.
A reclamação resulta em processo administrativo, com três meses em média de duração, em que a empresa poderá ou não ser multada. E só.

Na última quarta-feira, O GLOBO esteve em aeroportos de Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo e constatou o descumprimento das novas regras. Em Brasília, o português Vitor Manuel dos Santos, sua mulher, a brasileira Suzana Rodrigues Rocha, e seus dois filhos não receberam assistência da TAP, companhia que vendeu o bilhete Lisboa-Brasília-Goiânia. Devido a problemas na Imigração, eles perderam a conexão para Goiânia pela TAM e passaram por um empurra-empurra nos balcões de check-in das duas empresas. A TAP informou que eles tinham de comprar outro bilhete. Na TAM, disseram que o próximo voo para o destino final sairia três horas depois, mas este estava lotado e com fila de espera.

No Santos Dumont, filas dobram saguão
Pelas novas regras da Anac, caberia à TAP acomodá-los em outra aérea. Porém, embora tenham sido alertados a esse respeito, os atendentes responderam que o problema não era deles.
— É uma falta de respeito com a gente — disse Suzana, que tentava a todo custo controlar o filho mais novo, que é hiperativo e passava mal.
Naquele momento, não havia ninguém da Anac. A família só não passou a noite no terminal, porque a Infraero interveio junto à TAM e deu assistência médica à criança. Procurada, a TAM informou que adotou todas as providências necessárias para atender às novas regras. Já a TAP transferiu a responsabilidade à TAM. “A TAP tentou acomodação junto à TAM, que estava com overbooking no voo das 21h05m. E a TAM ficou impedida de priorizar o atendimento desta senhora (Suzana), uma vez que, conforme a legislação, deveria ser respeitada a lista de espera”, disse a TAP em nota.
É uma situação que se repete. No último dia 1o, o sistema de reservas da TAM ficou fora do ar em Brasília das16h40m às 18h45m. Filas se formaram no check-in, sem que a empresa informasse o motivo do atraso. Coube à Infraero anunciar pelo alto-falante o que ocorria. Pelas novas regras, as empresas são obrigadas a informar o porquê do atraso e a previsão do horário de partida.
No Rio, passageiros da Azul também tiveram que enfrentar filas que dobravam o saguão do Santos Dumont na última quarta-feira. Um atraso de mais de duas horas em um voo da companhia que vinha de Salvador para o Rio provocou um efeito cascata nos demais voos da empresa. O avião sairia às12h da capital baiana e só decolou por volta das 14h30m. Com isso, o voo que sairia do Rio para Porto Alegre usando o mesmo avião, agendado para 19h53m, só deixou o aeroporto por volta das 21h30m.
Em Salvador, a empresa providenciou voucher de alimentação e internet para os passageiros, como preveem as novas regras da Anac. No entanto, bastou a dona de casa Patricia Silva se ausentar por poucos minutos para trocar a fralda de sua filha Milena, de um ano, para perder o direito ao voucher.
— Quando retornei ao guichê para pedir o voucher, me falaram para aguardar que o voo já sairia e não me deram nada. Minha filha ficou com fome e não parava de chorar — disse ela, ao desembarcar no Rio.

Anac: ‘fiscalizar não é seu papel’. Mas é
No Santos Dumont, a empresa providenciou alimentação, mas, segundo relato de passageiros, não informou que teriam direito a usar telefone ou internet. E quem tentava reclamar não conseguia, pois o posto de atendimento da Anac no aeroporto foi desativado em 2008.
— Só me deram um voucher e nada mais — disse o comerciário Croaci Gomes, que viajava com a mulher e a filha para a capital gaúcha.
A Azul alegou problemas no avião e disse que internet e telefone estavam disponíveis para os usuários no Rio, embora ninguém os tenha usado.
A Anac argumentou que seu papel é administrativo e não de fiscalização in loco. Frisou que cabe ao consumidor recorrer ao Procon ou à Justiça, se quiser reparação pelo mau serviço. “O órgão regulador não pode, em hipótese alguma, assumir as responsabilidades das companhias aéreas no contrato de transporte que ela firmou com o passageiro”, informou em nota. No entanto, a própria lei que criou a agência delegou ao órgão a missão de regular e fiscalizar a aviação civil.
Setores do governo estão preocupados com a estrutura precária de fiscalização da agência. Teme-se que, com o crescimento, a demanda pelos serviços vai subir. A agência tem 1.096 fiscais, mas a fiscalização das normas nos aeroportos é feita por uma dupla de inspetores. Como alternativa, a Infraero negocia com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) a instalação de juizados especiais em Guarulhos e no Galeão.

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