domingo, maio 23, 2010

O papel dos emergentes na nova ordem global

O papel dos emergentes na nova ordem global


Os EUA necessitam de novos parceiros para que o século 21 se transforme no período em que a maioria das pessoas desfrutará de paz e de padrões satisfatórios de vida

Richard N.Haass, Project Syndicate

Estamos atravessando um longo período de transição internacional, iniciado há mais de duas décadas, com o fim da Guerra Fria. A era de rivalidade estratégica entre EUA e União Soviética deu lugar a uma outra, em que os americanos passaram a ter um poder muito maior do que qualquer outro país e a desfrutar de um grau de influência sem precedentes.
Esse momento unipolar americano vem abrindo caminho para um mundo descrito como não polar, em que o poder está amplamente distribuído entre os 200 Estados e dezenas de milhares de atores não estatais, da Al-Qaeda à Al-Jazira e do Goldman Sachs às Nações Unidas.
Mas o que distingue uma era da outra é menos a distribuição do poder e mais o grau de ordem entre e dentro dos Estados. A ordem nunca emerge simplesmente. Ela resulta dos esforços conscientes das entidades mais poderosas do mundo.
Nova era. Embora os EUA ainda sejam o país mais poderoso do mundo, sozinho ele não consegue manter, muito menos expandir, a paz e a prosperidade internacionais. As exigências são muitas, ele depende de enormes importações de dólares e petróleo diariamente e suas Forças Armadas estão engajadas em conflitos no Afeganistão e no Iraque. Os EUA carecem de recursos e de consenso político para assumir, de maneira muito mais vigorosa, as responsabilidades globais. E não têm os meios para compelir os outros a seguir sua liderança.
Além disso, problemas contemporâneos - como impedir a propagação de materiais e armas de destruição em massa, manter uma economia mundial aberta, conseguir reduzir o problema das mudanças climáticas e combater o terrorismo - não podem ser administrados, muito menos solucionados, por um único país. Somente um esforço coletivo poderá fazer frente a desafios comuns a todos - quanto mais global a resposta, maior a probabilidade de sucesso.
Em resumo, os EUA necessitam de parceiros para que o século 21 se torne uma era em que a maioria das pessoas de todo o mundo desfrute de uma paz relativa e de padrões satisfatórios de vida. No entanto, as parcerias que prevaleceram durante a Guerra Fria - entre EUA, Europa Ocidental e diversos países asiáticos, incluindo Japão, Coreia do Sul e Austrália - já não são as adequadas. Esses países não possuem os recursos e, muitas vezes, a boa vontade para procurar resolver os problemas do mundo.
Assim, os velhos parceiros precisam de novos. E as potências emergentes têm potencial para atender a essa necessidade. A questão é o que China, Índia, Brasil e outros estão dispostos a fazer com a sua força crescente.
O que torna um país grande não é o tamanho de seu território, de sua população, de seu Exército ou de sua economia, mas a maneira como ele usa seu poder para moldar o mundo além de suas fronteiras. Países com grande vigor, mas que ainda estão se desenvolvendo, geralmente encaram a política externa quase como uma serviçal da política interna e um meio para conseguir acesso a mercados e recursos essenciais para um rápido desenvolvimento.
É uma visão do mundo compreensível, mas míope. As potências emergentes não podem se isolar do que ocorre além de suas fronteiras. Queiram ou não admitir, elas têm uma participação na ordem mundial.
Incentivo. A China, por exemplo, sob muitos aspectos, é o mais importante país emergente. E deseja manter o acesso preferencial aos recursos energéticos do Irã, mas se as aspirações nucleares de Teerã resultarem num conflito, os chineses pagarão muito mais por esses recursos.
A perspectiva de uma ameaça à estabilidade do Oriente Médio, em um contexto mais amplo, e para o fluxo de petróleo, deveria ser um incentivo para a China aprovar sanções mais rigorosas contra o Irã. No entanto, não se sabe ao certo se os líderes chineses reconhecerão o problema e agirão no próprio interesse de seu país no longo prazo.
Não se trata só da China. Questões similares aplicam-se à Índia e ao Brasil. E não são apenas os países emergentes e em desenvolvimento que precisam reavaliar seu enfoque do mundo. Os EUA também.
Embora muito seja dito e escrito sobre os apelos dos EUA para a China tornar-se uma participante global, Pequim simplesmente não assinará embaixo como suporte de um mundo definido pelos americanos. A China quer colaborar no estabelecimento das regras e na criação das instituições que aplicarão essas regras.
Cabe aos EUA trabalhar com a China e outros países para isso, o que exigirá uma aceitação das preferências dos outros e o seu desejo de assumir um papel maior. O poder concedido ao G-20 foi um passo na direção certa, mas muitas outras mudanças são necessárias, incluindo a reestruturação das Nações Unidas, do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial, de modo que essas instituições também reflitam a nova distribuição de poder.
Temas. Em troca, novos acertos devem dar ensejo a uma contribuição maior da parte dos países emergentes no tocante a certas questões, como encontrar uma solução para o problema das mudanças climáticas, o custeio das forças de paz e a criação de Estados, a promoção do livre comércio e a condenação dos que apoiam o terror ou desenvolvem armas de destruição em massa.

Os Estados mais fortes desta era, desenvolvidos e emergentes, têm capacidade para chegar a um acordo sobre essas questões-chave do mundo de hoje. Sua disposição para isso determinará quando e como este período de transição global acabará e o que virá em seguida.

É EX-DIRETOR DE PLANEJAMENTO POLÍTICO DO DEPARTAMENTO DE ESTADO DOS EUA

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