segunda-feira, setembro 20, 2010

Modas - Manoel Carlos – Veja Rio

Modas
Manoel Carlos – Veja Rio
 Sofro de insônia. Não me lembro ao certo quando isso começou, mas a impressão que tenho é que já nasci assim. Pelo menos, na minha memória existem muitas noites em claro, eu adolescente e a família no meu quarto, tentando me ajudar.
— Você tem de relaxar para dormir — dizia meu pai. — Se lê, fica mais desperto, afugenta o sono.
E tirava o livro das minhas mãos.
— Conta carneirinhos — palpitava minha irmã mais velha, bocejando, enfiada numa camisola até os pés.
 Diante da minha chorosa resistência, minha mãe acrescentava santamente:
 — Reza uma Ave-Maria, filho.
Para minha mãe, tudo se resolvia com uma oração. Eu me lembro que, diante dos horrores da II Guerra Mundial, ela afirmava categoricamente:
 — Isso é falta de Deus. Falta de orações, de fé.
 Bem, o que acontece é que hoje, como na adolescência, demoro a encontrar o sono. Após um tempo, durmo, mas acordo várias vezes, custando então a reencontrá-lo. Meu médico diz que não adormeço porque não quero, já que um comprimidozinho de Simply Sleep me daria uma noite tranquila. Como tenho o mesmo clínico há mais de trinta anos, ouço dele essa recomendação desde então. De outros médicos, anteriores a esse, também ouvi palavras semelhantes. Resisto, sempre resisti. A razão é simples: não me atrai caçar o sono. Queria, isso sim, que ele viesse ao meu encontro, espontaneamente, me recompensando de um dia ativo, desses que nos cansam, mas que também nos alegram. Mas isso não acontece, mesmo depois de uma longa jornada de trabalho. Diante disso, já cansado de não descansar suficientemente, resolvi fazer uma polissonografia noturna, que consiste em ir a uma clínica especializada, onde vou passar a noite monitorado por um aparelho que revela como funciona o cérebro quando a gente dorme.
— Mas e se ele não conseguir dormir? — pergunta minha mulher à secretária da clínica.
— De qualquer maneira — diz ela —, dormindo ou em vigília, o médico avalia o comportamento do cérebro.
Resolvi marcar o exame e queria que fosse logo, mas aí veio a revelação: só daqui a um mês. A clínica está com a agenda cheia de homens e mulheres que passarão pela tal polissonografia, o que significa que dormir mal, dormir pouco ou simplesmente não dormir faz parte da rotina de muita gente. Não deixa de ser um consolo.
 Diante da minha cara de desânimo e de incerteza, a secretária se apressa a oferecer:
 — O senhor pode trazer acompanhante.
Olho para a minha mulher, hesitamos alguns instantes, mas por fim resolvemos marcar o exame para a data disponível, com entrada às 10 e meia da noite e saída às 6 e meia da manhã do dia seguinte. Iremos lá nós dois, levando pijama e escova de dentes. Não deixa de ser uma noite diferente, para nós, que há 33 anos dormimos juntos.
— O senhor não precisa trazer roupa de cama, nem toalhas, mas pode trazer seu travesseiro, para não estranhar.
— Ah, se o meu problema fosse o travesseiro! — suspiro eu.
 Depois do exame, em outubro, prometo contar aos meus possíveis leitores o desenrolar dessa noite nada convencional, mas que está ficando na moda.
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Uma amiga, conhecida ex-modelo, mas também atriz, que viveu e trabalhou em Tóquio, Milão, Londres e Nova York, padeceu com as mais diversas dietas que teve de fazer — das sensatas, com orientação médica, às malucas e perigosas restrições alimentares, recomendadas por atrizes de Hollywood e médicos inescrupulosos.
— Fazia todas as dietas que estavam na moda — conta ela. — Fiz uma, entre as mais malucas, que era comer apenas arroz sempre que tinha fome.
 — Que absurdo!
 — Foram três meses, todos os dias! Quase virei japonesa!
— E emagreceu?
 — Não precisava emagrecer. O objetivo era não engordar.
Quando parou de desfilar, preferindo o trabalho de modelo fotográfico e de atriz, só então conseguiu relaxar. Na mesma noite em que desfilou pela última vez, em um grande evento em São Paulo, foi entrevistada por uma emissora de TV.
— Agora que parou com os desfiles, o que você pretende fazer? — perguntou o repórter.
— Ser gorda — respondeu a bela ex-modelo e ex-escrava da moda.
Manoel Carlos e-mail: almaviva@uninet.com.br

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