quinta-feira, maio 27, 2010

Relatório da Anistia Internacional critica violência policial no Brasil

Relatório da Anistia Internacional critica violência policial no Brasil
Para ONG, há ligação entre a violência atual com a impunidade na ditadura. Entidade critica alterações ao Plano Nacional de Direitos Humanos.
João Novaes Do G1, em São Paulo  26/05/2010 20h05
A precariedade do sistema carcerário e a violência policial foram os principais motivos de crítica ao Brasil na edição 2010 do relatório anual sobre direitos humanos da Anistia Internacional. A ONG, que monitora violações contra os direitos humanos em todo o planeta, relacionou o problema relacionado às forças de segurança do país com as recentes modificações do governo brasileiro no Plano Nacional de Direitos Humanos. Em contrapartida, a organização reconheceu avanços no combate à desigualdade social e em reformas “limitadas” na área de segurança pública.
Os dados do relatório, referentes ao ano de 2009, foram anunciados na noite desta quarta-feira (26), em um levantamento que avaliou condições humanitárias em 159 países. No estudo, toda a América Latina foi citada negativamente como uma região com alta ocorrência de mortes ilegais cometidas por forças de segurança (citando em especial países como Brasil, Jamaica, México e Colômbia). No caso brasileiro, a entidade ressalta “uso excessivo de força, execuções extrajudiciais e torturas cometidas por policiais”. Também relata que “centenas de homicídios não foram devidamente investigados e houve poucas ações judiciais”.
De acordo com Tim Cahill, porta-voz para a organização no Brasil, há uma forte relação entre a violência policial citada no relatório e a impunidade para crimes hediondos ocorridos no passado, especialmente durante a ditadura do regime militar (1964-1985).
Cahill criticou com veemência a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), tomada em abril deste ano (portanto não contemplada no relatório), por 7 votos a 2, de não revisar a Lei da Anistia - que prevê a exclusão de punições para acusados de crimes políticos e conexos a eles entre 1961 e 1979.
“(Essa decisão) é uma grande falha do sistema Judiciário brasileiro e do STF em não entender a responsabilidade do Brasil perante a lei internacional e à sua própria de reconhecer que crimes hediondos como tortura e execução não são anistiáveis. Isso é um posicionamento claro, não há como uma interpretação técnica possa questionar isso”, diz o porta-voz da AI.
Para Cahill, o STF passa a mensagem de que esses crimes “tratam-se de um problema do passado, no qual não vale a pena tocar”, enquanto no presente casos de morte e violência policial e problemas no sistema carcerário que resultam em tortura e execuções são registrados com frequência. “Isso dá a ideia de que quando o Estado mata e tortura cidadãos brasileiros, ninguém é responsável, ou há uma justificativa. Toda a prática de tortura e extermínio praticada hoje em dia é uma herança do passado”, afirmou. Em relação a outros países do Cone Sul, Cahill avalia que o Brasil está “um passo atrás”.
Para a ONG, o governo cedeu a pressões quando decidiu revisar o Plano Nacional dos Direitos Humanos. “Certamente é um retrocesso. O programa foi elaborado de maneira democrática e com a participação de toda a sociedade civil. Nos assusta como ele tem sido seqüestrado e desqualificado por setores com interesses particulares, políticos e econômicos [no relatório, esses setores citados são os militares, a Igreja Católica e proprietários rurais] e como o governo recuou tão facilmente diante deles”, disse Cahill. De acordo com a Anistia, “essas contestações representavam uma séria ameaça para a proteção dos direitos humanos no país”.
Cahill informou que a entidade enviou o relatório para os três principais pré-candidatos à Presidência (Dilma Rousseff, José Serra e Marina Silva) juntamente com um pedido para que eles se defendam o Programa Nacional dos Direitos Humanos.
Violência
Entre alguns dos casos citados no relatório ligados à violência policial, a Anistia criticou estratégias como operações policias ostensivas que preveem a ocupação de comunidades por longos períodos com justificativa no combate ao narcotráfico. Segundo a entidade, nesses casos há registros de queixas por de membros da comunidade de “uso excessivo de força, intimidações, revistas arbitrárias e abusivas, extorsão e roubo por parte dos policiais”. No Rio de Janeiro, a Anistia destaca principalmente a disseminação das milícias, as quais controlam diversas comunidades.
Outro ponto negativo do país muito destacado pela entidade está na condição prisional. Segundo o relatório, no Brasil, “os detentos continuaram sendo mantidos em condições cruéis, desumanas ou degradantes. A tortura era utilizada regularmente como método de interrogatório, de punição, de controle, de humilhação e de extorsão”. O Espírito Santo continuou como fonte dos casos mais brutais, segundo a AI. Além de denúncias de tortura, houve também relatos de superlotação extrema e uso de contêineres de navios utilizados como celas.
Conflitos armados por terra, violação de direitos de trabalhadores e de povos indígenas, despejos forçados e políticas de limpeza em favelas (especialmente no Estado de São Paulo) também foram citados. O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) foi criticado porque alguns de seus projetos foram acusados de ameaçar direitos humanos de comunidades locais e povos indígenas.

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