sexta-feira, julho 16, 2010

Sem medo de ser feliz

Nas Entrelinhas
Sem medo de ser feliz
Alon Feuerwerker – Correio Braziliense

A caminhada eleitoral é difícil para a oposição brasileira. Assim como foi difícil para o PT, quando estava na oposição. A nossa democracia já tem um quarto de século, mas nenhuma força política dominante no período se preocupou seriamente com a engenharia institucional, digamos assim, para o bem.
O último impulso virtuoso veio na Constituição de 1988. Eram os bons tempos em que as forças autodenominadas democráticas ocupavam-se da remoção da herança ditatorial. Mas de lá para cá quem pega o manche encontra ambiente cada vez mais favorável para agir como se jamais fosse deixá-lo. E não tem qualquer interesse em mudar as regras contra si próprio.
Nem seria natural. A democracia não é operação acadêmica, ou fruto de conciliábulos. Seu vigor está diretamente relacionado à quantidade de energia social empregada na sua construção e consolidação. O poder precisa ser confrontado, em benefício da coletividade. Entre nós, para dizer o mínimo, não há grande preocupação com o assunto. O fenômeno tem raízes históricas bem determinadas.
O governo Luiz Inácio Lula da Silva emprega todos os meios estatais para clonar-se rumo aos próximos quatro anos. Não falo aqui da tal “campanha antecipada” ou de irrelevâncias do mesmo naipe. O Estado brasileiro tem instrumentos bem mais eficazes de autorreprodução. Tampouco faço juízos. Para isso existe a Justiça, inclusive a Eleitoral.
Lula utiliza o poder para eleger a sucessora, e o faz sem medo de ser feliz. Fernando Henrique Cardoso utilizou-o quando, como czar econômico do governo Itamar Franco, produziu a extensão ampliada do próprio poder pelo mandato seguinte. Ou quando aprovou a reeleição para si próprio.
Naquelas épocas o PT decidiu apostar no caminho teoricamente mais difícil: opor-se.
Deu-se bem no fim.
Paradoxalmente, talvez o PT tenha então prestado um serviço à democracia brasileira.
Já que se autolimitar não é da natureza do poder, uma oposição clara e firme acaba sendo essencial para o ambiente democrático, pela produção de vetores de equilíbrio político.
Por que Lula está tão forte e pode dar-se ao luxo de um comportamento imperial, sem freios? Em primeiro lugar porque o governo dele apresenta resultados que agradam à maioria da população. Mas isso não seria suficiente se ele enfrentasse resistência digna do nome.
Ao longo destes quase oito anos, a oposição potencial a Lula oscilou entre surtos de histeria udenista e o simples adesismo.
Nunca foi consistente. Ser consistente não é ser barulhento.
Consistência aqui é algo mais relacionado à capacidade de produzir movimentação e sedimentação política tangíveis.
A atual oposição leva uma desvantagem fundamental na comparação com o então oposicionista PT: ela e sua turma dependem muito mais do Estado do que dependiam na época as bases do petismo. Em linguagem automobilística, a oposição perdeu rendimento nos últimos anos porque uma parte da sua potência dissipou-se nos atritos internos. Mas também porque suas fontes de alimentação foram cuidadosamente cooptadas pelo governo, com os instrumentos de praxe.
O PSDB nunca conseguiu atrair de verdade as bases sociais petistas, apesar de adulá-las. Mas a recíproca não vem sendo verdadeira. Sem contar o efeito-temor. Nem todo mundo está propenso a enfrentar um governo que desconhece limites no uso da força estatal contra os adversários (ou contra os aliados, se necessário). Aliás, quase ninguém está. Nem aqui nem em lugar nenhum. Ainda mais quando o país vai bem.
Para a oposição, este processo eleitoral é uma batalha morro acima. Haverá mortos e feridos em profusão. Mas ela prestará um serviço ao país. Porque finalmente se verá algo parecido com uma oposição. Qualquer que seja o resultado.
Tese sem rumo Uma herança bendita do governo Lula vai ser o arquivamento da reforma trabalhista, a outra maneira de dizer “abolição de direitos trabalhistas”. Com a criação de empregos formais às pencas, a tese anda meio sem rumo. Ainda que o próprio Lula tenha prometido implementá-la. Jamais se provou que reduzir encargos levaria a criar mais empregos. E a (má) experiência do programa Primeiro Emprego desautoriza otimismo ingênuo a respeito.
O governo Lula emprega todos os meios estatais para clonar-se rumo aos próximos quatro anos. E não falo aqui da tal “campanha antecipada”

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