sábado, agosto 07, 2010

Azar Nafisi narra as mudanças no Irã através da sua história familiar

Azar Nafisi narra as mudanças no Irã através da sua história familiar

Camila Mello | Fotos: Divulgação

A escritora iraniana Azar Nafisi, 59 anos, viu seu país se transformar em uma ditadura religiosa a partir de 1979, com a revolução islâmica promovida pelo aiatolá Khomeini.  Para ela, que estava de volta ao Irã na esperança de grandes mudanças políticas, depois de anos morando nos EUA, isso significou ser revistada diariamente, para ver se carregava maquiagem, e ser vigiada em suas aulas de literatura. 
Azar Nafisi na adolescência, quando o Irã tinha um governo moderado em costumes
Como toda mulher, também foi obrigada a se esconder debaixo do véu. Mas ela acabou ficando mais visível.Depois de ser expulsa da Universidade de Teerã, onde lecionava literatura, por se negar a usar o véu em sala de aula, criou um grupo secreto com algumas alunas para continuar discutindo autores como Henry James e Vladimir Nabokov, que foram proibidos no país.
Narrou os encontros no best-seller Lendo Lolita no Teerã (2004), que a tornou conhecida mundialmente. Mas ainda há mais por contar. Azar, que estará na Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) de 2010, em agosto, listou em um diário casos sobre os quais não tinha falado.
No livro O Que Eu Não Contei (Record, R$ 55/378 páginas), ela fala de coisas como o sofrimento com segredos familiares e o preço pela liberdade num país envolvido em revoltas políticas.  Azar desnuda as mulheres de sua família e escreve abertamente sobre histórias pessoais - o que sempre foi considerado pelo Estado como um tabu.
“Nunca revelar assuntos privados é uma característica muito forte da cultura iraniana: não lavamos roupa suja em público, como diria minha mãe, e, além do mais, as vidas privadas são triviais e não merecem ser descritas”, anota a autora.
Azar Nafisi, que vive hoje em Washington, nos EUA, revela histórias entre o nascimento da avó, no começo do século XX, e o nascimento da filha, que se cruzam com a realidade política e social do Irã. A autora lembra, por exemplo, das “horas do café”, em que sua mãe recebia mulheres para sessões de fofocas, e as alucinações que ela tinha para fugir dos problemas.
FAMÍLIA 
A mãe de Azar era controladora e foi uma das primeiras mulheres do parlamento. Já o pai foi preso quando era prefeito de Teerã, suspeito de apoiar a oposição ao regime do xá. A escritora viveu no Irã até os 13 anos, seguindo depois para estudar em Londres.
“Quando ainda era jovem,nas décadas de 1950 e 1960,tínhamos como garantidos nossa educação e nossos livros, assim como festas e cinemas. Vimos mulheres se tornando ativas em todos os níveis da vida, atuando no parlamento”, relata.
Mas, então, em 1984, com uma filha de 10 anos, ela testemunhou um retrocesso político que trazia de volta leis cruéis que fizeram parte da vida de sua avó, no século XX, e aprovavam apedrejamento como punição para adultério e prostituição, poligamia, casamento de meninas a partir de 9 anos e o uso do véu. Além disso, todas as mulheres só podiam entrar nos veículos pela porta traseira e eram vigiadas por homens armados que tinham que assegurar o bom comportamento das moças.
EXÍLIO
Em 1997, Azar deixou o país e foi para os EUA com a família. No mesmo ano, no Irã, o reformista Khatami derrotou um aiatolá nas eleições e anunciou um governo mais moderado, permitindo que as mulheres usassem véu colorido e batom, por exemplo.
Mas as leis continuaram as mesmas. Mesmo longe, ela acompanha a crescente oposição ao governo de Mahmoud Ahmadinejad, reeleito em 2009. Os jovens que protestam nas ruas são humilhados por um regime que ela conhece bem.
“Muito antes de eu conseguir observar como um regime político impiedoso impõe sua própria imagem sobre seus cidadãos, saqueando suas identidades e autodefinições, experimentei suas imposições na minha vida pessoal”, diz.  

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