quarta-feira, agosto 11, 2010

É preciso manter a indignação

É preciso manter a indignação

Editorial, Jornal do Brasil
RIO - O mundo civilizado acompanha, incrédulo, a saga da iraniana Sakineh Ashtiani, que está prestes a ser morta pelo governo de seu país. Não bastasse o episódio, este JB noticiou na edição de ontem a execução da grávida Bibi Sanubar por um grupo talibã do Afeganistão. Ambas tornaram-se vítimas por supostos atos de adultério. Os dois casos – que infelizmente não são exceções nesses países e só chegaram ao conhecimento do Ocidente por causa da globalização da informação via internet – são riquíssimos nas possibilidades de análise e desgraçadamente pobres em alternativas para mudar o contexto local. Mas não se pode desistir.
Sofrimento das vítimas à parte, seria um oportuno momento de reflexão para, por exemplo, os países que ainda preveem em suas leis a pena de morte, como os Estados Unidos. No sentido da humanidade, que diferença há entre apedrejamento ou forca e injeção letal ou cadeira elétrica? Algum preciosista poderá alegar que uma é mais rápida ou menos dolorosa do que a outra. Bobagem, o fim da história é o mesmo. Quem se choca com a pena imposta no Irã não tem por que aceitar a mesma pena decidida pelos americanos.
Outro ponto que deve ser tratado com muito cuidado é a demonização da cultura islâmica, que vários setores ocidentais estão promovendo, aproveitando-se do choque que o apedrejamento causa para tentar impor a nossa cultura à dos povos do Oriente Médio. É evidente que o impacto de uma barbárie, como é a pena de morte, aplicada por um Estado é grande, mas quem somos nós para nos acharmos melhores que os islâmicos se alguns de nossos países invadem outros e matam civis, e, em outros, jornalistas e devedores do tráfico são queimados no alto dos morros em microondas de pneus? E a criança arrastada num carro por vários bairros?
O que não se pode é perder a capacidade de indignação com o ato bárbaro de tirar a vida de alguém voluntariamente. Seja com traficantes, com exércitos inábeis e imperialistas ou com talibãs fanáticos. O século 21 e a globalização chegaram para todos. Não é aceitável que uma parte do mundo, independentemente de suas respeitáveis crenças religiosas, insista em, voluntariamente, cobrir os olhos e viver nas trevas que marcavam tempos remotos.
As lideranças humanistas do planeta, oficiais ou não, precisam erguer a voz contra esse apedrejamento – que pode ser “substituído” por enforcamento – com a mesma força com que, por exemplo, guardadas as devidas escalas, se combateu o Holocausto – em que diferem pedras ou cordas no pescoço de câmaras de gás? Se uma sociedade inteira chega à conclusão de que uma pessoa não deve mais a ela pertencer, que aceite então as ofertas de países irmãos e a mande para eles, que lhe poupe o mais sagrados dos direitos, à vida.
Não se trata de discutirmos culturas ou religiões. É questão de sabermos se ainda somos seres humanos.
21:34 - 10/08/2010

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