quarta-feira, junho 22, 2011

Descriminalização das drogas: é o que a sociedade quer?

Descriminalização das drogas: é o que a sociedade quer?
José Theodoro Corrêa de Carvalho – Correio Braziliense
Voltou a ser recorrente na imprensa o tema do tratamento legal dispensado ao traficante e ao usuário de drogas, em virtude das manifestações do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. As propostas são as mais diversas possíveis: liberação total do tráfico e uso; controle da venda e liberação do uso; proibição da venda e liberação do uso; descriminalização do uso, com proibição administrativa (tese de FHC); liberação total apenas do uso da maconha; e uso da maconha para fins medicinais.
Os argumentos mais empregados são o fracasso da guerra contra as drogas; a necessidade de retirar o poder dos traficantes, garantindo o controle de qualidade das substâncias comercializadas; o direito do usuário de fazer o que quiser com o próprio corpo; o fato de que mandar o usuário para a cadeia impede que receba tratamento médico; e, por fim, a defesa de que a maconha é droga leve e tem fins terapêuticos.
De fato, o sistema repressivo não tem o poder de coibir integralmente a prática do tráfico de drogas, mas isso também ocorre em relação aos demais crimes, como roubos, homicídios etc. e ninguém pensou em liberá-los. Por seu turno, se a venda de drogas fosse regulada, controlada e tarifada, é certo que haveria limites de idade para compra e de toxidade para as drogas e preço mais alto, o que indica que seguiria existindo um mercado paralelo, controlado pelos traficantes, para venda de drogas mais fortes e mais baratas. O problema da criminalidade continuaria existindo e a facilidade de acesso às drogas levaria ao aumento do número de consumidores.
Outra hipótese seria a liberação apenas do consumo individual de todas as drogas. Apesar de parecer correto afirmar que cada um tem o direito de fazer o que quiser com o próprio corpo, consumindo, inclusive, produtos nocivos à saúde, essa regra não é absoluta. Quando se trata do consumo de drogas que alteram o funcionamento do cérebro, mudando comportamentos, gerando adicção e tolerância, não pode haver liberdade absoluta, visto que o vício provoca compulsão incontrolável pela próxima dose.
Não bastasse isso, a droga produz mudanças de comportamento que criam riscos para o usuário e para outras pessoas que o circundam (doenças, acidentes, crimes, etc). Percebe-se, portanto, que a droga retira justamente o que seria a justificativa para se permitir o consumo: a liberdade. Quem é viciado em drogas perde a liberdade de escolher o próprio destino e passa a ser controlado pelo vício. Como afirma Paulo Coelho no filme Quebrando o tabu, a droga mata a coisa mais importante de que você vai precisar na vida, que é o poder de decidir.
Manter o consumo proibido parece a solução mais adequada. Nenhum país do mundo liberou o consumo de drogas. No Brasil, 76% da população quer a proibição das (Datafolha/Folha de S.Paulo, 28.2.2010). A ideia defendida por FHC de descriminalizar, para evitar que o usuário vá para a cadeia e para permitir o tratamento, demonstra total desconhecimento da legislação brasileira. Desde 2006, não existe pena de prisão para usuário e a proibição não impede que sejam implementados programas massivos de prevenção e tratamento, o que é fundamental.
Se os governos permitissem ou regulassem o uso das drogas, como ocorre com o álcool, certamente, o número de consumidores aumentaria assustadoramente, pois a percepção do risco deixa de existir. Para que se tenha uma ideia, aproximadamente 75% da população brasileira já provaram álcool, contra menos de 9% que fizeram uso da maconha (Senad, 2005).
A solução do problema das drogas virá das pesquisas médicas e da prevenção, enquanto a descriminalização poderia provocar problemas muito mais sérios, como uma epidemia de consumo de drogas. Não é necessário descriminalizar qualquer conduta para que a prevenção e o tratamento sejam aperfeiçoados, enquanto, paralelamente, são realizadas ações de redução da oferta. Afinal, quanto menos droga houver, melhor para a qualidade de vida de todos.
Doutor em direito, é promotor de Justiça do MPDFT, conselheiro do Conen/DF, professor de Direito Processual Penal e autor do livro Tráfico de drogas

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