terça-feira, junho 01, 2010
'A lei é a confirmação de que tenho de ir embora' diz brasileira que vive no Arizona
'A lei é a confirmação de que tenho de ir embora' diz brasileira que vive no Arizona
Alessandra Corrêa - Enviada especial da BBC Brasil a Phoenix
Depois de quatro anos nos Estados Unidos, a brasileira Camila Novaes Silva embarca na próxima segunda-feira de volta a São Paulo, assustada com a nova lei de imigração do Arizona, onde vive.
Em situação ilegal no país, a estudante brasileira começou a pensar na mudança no fim do ano passado, ao perceber que, quando terminasse o ensino médio, não teria como pagar o valor de um curso universitário, pelo menos três vezes mais alto do que o cobrado de alunos com os documentos em dia. A decisão, porém, foi reforçada após o anúncio da lei que torna crime estadual a presença de imigrantes ilegais e dá à polícia autorização para parar, interrogar e exigir documentos de qualquer pessoa considerada suspeita de estar ilegalmente no país. A lei só entra em vigor em 29 de julho, mas desde seu anúncio vem provocando temor entre os imigrantes ilegais do Arizona. "Tinha esperança de ficar aqui", diz Camila, que mora na capital do Arizona, Phoenix. "Mas a lei foi a confirmação de que realmente tenho que ir embora."
Sonho A viagem vai ocorrer depois de uma semana que, para ela, deveria ser de festa. Nesta segunda-feira, Camila completou 18 anos. Na quarta, comemora a formatura na high school, o ensino médio americano. O clima na família, porém, é de tristeza. Camila vai deixar nos Estados Unidos a mãe, Rosilane Novaes, com quem chegou ao país aos 14 anos. O pai, o administrador de empresas Olívio Pedro da Silva, veio do Brasil para buscar a filha. "O sonho dela foi sendo amassado. A lei piorou tudo", diz Silva. A estudante diz que sempre teve médias altas na escola e recebeu convites para ingressar em universidades americanas. Seu objetivo era cursar Ciências Políticas. Chegou a pensar em Harvard. "Comecei a pesquisar e teria de pagar pelo menos US$ 30 mil (cerca de R$ 55 mil) por ano em universidades no Arizona. Em Harvard, mais de US$ 70 mil (R$ 127 mil)", diz. A estudante calcula que, se estivesse em situação legal no país, teria de desembolsar apenas cerca de US$ 7 mil (R$ 13 mil) por ano para pagar por um curso universitário no Arizona. Mesmo que conseguisse pagar o curso, Camila não poderia exercer a profissão depois de formada, por ser imigrante ilegal. Foi o medo da nova lei que selou a decisão da família. "Ela não tem carteira de motorista (documento comumente usado como identificação nos Estados Unidos). Seria complicado se deslocar até a universidade. Eu corria o risco de receber um telefonema dizendo ''sua filha está presa'", diz a mãe, Rosilane.
Separação Rosilane, 51 anos, chegou aos Estados Unidos em 1986, como estudante. Permaneceu no país alguns meses e voltou ao Brasil. Dez anos mais tarde, já separada, retornou aos Estados Unidos com as duas filhas, Camila e Juliana, que hoje tem 14 anos e mora em São Paulo com o pai. "Eu pensava em dar uma educação melhor para as minhas filhas. E era também a época do boom imobiliário, planejava comprar uma casa", diz. Hoje ela trabalha com serviços de limpeza em residências e diz que seu salário é bem maior do que ganhava no Brasil. Rosilane afirma que a nova lei fez com que se tornasse ainda mais precavida. "Tomo muito cuidado ao dirigir, para não cometer alguma infração e ser parada pela polícia. Para não levantar suspeitas", diz. Apesar da distância das filhas, ela afirma que não pretende deixar os Estados Unidos, pelo menos por enquanto. "Estou morrendo porque minha filha vai embora. Ela não quer ir. Está chorando", diz. "Mas não pretendo deixar o país por enquanto. Minha vida é boa aqui. Aos 51 anos, não conseguiria emprego no Brasil." Ela diz ainda ter esperança de que possa, de alguma maneira, regularizar sua situação e trazer as filhas de volta.
Brasileiros Camila diz que seu caso não é isolado e que outros amigos de origem latina, também ilegais, estão deixando o país por medo da nova lei. "Na sexta-feira, um amigo vai voltar ao México", diz. Ela afirma que já teve medo de ser denunciada ao conversar com amigos em português em locais públicos. "As pessoas em redor percebiam que estavamos falando uma língua diferente, ficavam observando", diz. O cônsul honorário do Brasil no Arizona, Brad Brados, disse à BBC Brasil que nas últimas semanas houve maior procura por informações sobre a lei e sobre um possível retorno ao país. Segundo o cônsul, porém, a comunidade brasileira no Arizona não é tão representativa quanto em outras regiões americanas e aqueles em situação irregular representam uma parcela pequena dos cerca de 450 mil imigrantes ilegais que vivem no Estado, conforme estimativas do governo. Brados calcula que entre 6 mil e 7 mil brasileiros vivam no Arizona, dos quais apenas cerca de 25%, ou entre 1,5 mil e 2 mil, estariam em situação ilegal. "A maioria dos brasileiros que entram pelo México estão de passagem para outro lugar, geralmente a região nordeste do país, Boston, Nova York, New Jersey", diz. De volta ao Brasil, Camila vai cursar Direito em uma universidade adventista no interior de São Paulo, a partir de agosto. Não pretende, porém, abandonar o sonho de voltar aos Estados Unidos legalmente. "Quero voltar. Quero fazer mestrado em Harvard", diz.
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