quinta-feira, outubro 21, 2010

As regras engessaram os debates

As regras engessaram os debates
Elio Gaspari - O GLOBO
Antes que os eleitores peguem no sono, seria bom copiar normas que vigoram para os candidatos americanos
Quem sabe chegou a hora de se repensar a organização dos debates dos candidatos na televisão. A decadência do atual modelo ficou patente na noite de domingo. Não só Dilma Rousseff e José Serra não responderam a diversas perguntas, mas chegaram a informar que voltariam ao assunto "no próximo bloco" ou "próxima vez", como se fossem apresentadores.
As redes de televisão esforçam-se para preservar a neutralidade do formato e do cenário, mas ficam amarradas às condições negociadas com a direção das campanhas dos candidatos. Essa anomalia engessa o debate e relega o moderador às funções de cronômetro. Resultado: no debate de domingo a audiência média da Rede TV! caiu à metade em relação à sua programação normal.
Como a próxima série de debates presidenciais ocorrerá daqui a quatro anos, há tempo para se pensar no assunto. Para começar, pode-se buscar o que há de útil no modelo americano, com meio século de existência e aperfeiçoamentos:- Os debates americanos são realizados em auditórios de universidades e organizados por uma entidade de composição bipartidária, a Comissão para Debates Presidenciais. Quem quiser, transmite. (Em 1988, a Liga das Mulheres Eleitoras deixou de organizar esses eventos, acusando os partidos de manipular os formatos.)
- Em 2004 as regras negociadas com a direção das campanhas foram públicas e se estenderam por 31 páginas, detalhando até mesmo que os candidatos não podiam levar cola. Antes do início do programa eles recebem papel e caneta para tomar notas. Em 2008, o detalhamento das regras ficou no cofre.
- Houve três debates de Obama com McCain, dois deles com temas predefinidos (política externa e segurança, assuntos domésticos e economia). No Brasil esse mecanismo evitaria que um candidato repetisse propostas e denúncias feitas nos anteriores.
- Duas regras de ouro do contrato de 2004 inibiriam golpes baixos comuns aos debates nacionais. Foi proibida a reprodução de trechos de áudio ou vídeo dos debates na propaganda dos candidatos. Foi proibida também a pegadinha de propor ao outro assuma um compromisso em relação a seja lá o que for.
- A principal diferença está nas atribuições do moderador. Já houve debates com vários jornalistas fazendo as perguntas ou com um só. Há uma pequena flexibilidade com o tempo dado para as respostas. É o moderador quem faz as perguntas ou apresenta os tópicos (que não são negociados com os marqueteiros).
Cabe ao moderador manter o equilíbrio na distribuição do tempo.
- Em 2008 Obama e McCain toparam dividir dois debates em segmentos, com respostas de dois minutos e embates diretos de cinco minutos. No modelo de 2004, Bush e John Kerry não podiam fazer perguntas diretas.
- Um terceiro debate é alimentado por perguntas de uma audiência previamente selecionada. Os candidatos nunca escolhem os convidados e as perguntas são previamente submetidas ao moderador, e só a ele, a quem cabe selecioná-las.
Esse último formato seria de difícil aplicação no Brasil. Outras regras, como a proibição da cola, a definição de um tema para cada debate e sobretudo a proibição do uso de trechos pinçados na propaganda posterior dos candidatos, pedem para serem copiados nas próximas campanhas.

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