quinta-feira, outubro 21, 2010

Inteligência maquiavélica

Inteligência maquiavélica
HÉLIO SCHWARTSMAN
SÃO PAULO - Sai Deus, entra a mentira. Os candidatos pararam um pouco de falar no suposto criador para acusar um ao outro de mentir feito o diabo. É hora de humanizar um pouco o debate.
Tudo indica que os postulantes mentem mesmo. Agem assim porque é da natureza humana fazê-lo. Como mostra Robert Feldman em "The Liar in Your Life", bebês de seis meses já simulam choro para atrair atenção. A partir dos três anos, crianças tornam-se verdadeiras Dilminhas e Serrinhas, que descumprem as regras estipuladas em 82% das ocasiões e mentem sobre isso 95% das vezes. A coisa não melhora com a idade. No curso de uma conversa de dez minutos em que dois adultos se apresentam, eles mentem em média três vezes cada.
É preciso, porém, distinguir inverdades. Há, para começar, mentirinhas inocentes socialmente necessárias, como elogiar a comida da anfitriã. Um grau acima, estão as mentiras de autopromoção, pelas quais tentamos aparecer sob uma luz mais favorável. Estamos aqui no limiar entre a edição e a farsa. Só depois vêm as tramas com intuito de obter vantagem fraudulenta.
Essas fronteiras, já pouco nítidas, ficam mais borradas quando somos parte do processo, como mentirosos ou "vítimas". Aí entram processos complexos como o autoengano (pelo qual construímos uma imagem positiva de nós mesmos) e o viés de verdade (o modo padrão do cérebro de aceitar como exatas as informações que recebe).
O resultado é que os políticos acreditam nas lorotas que contam, e que os eleitores, ao querer acreditar, reforçam a tendência burlesca dos candidatos. E o bate-boca entre os postulantes só aumenta as coisas. Estudos mostram que, após ouvir uma mentira, mentimos mais.
Usar de ardis para subir na hierarquia pode tornar-se um processo dinâmico. Isso levou certos autores a propor que a mentira foi a grande força a moldar a evolução humana. É a hipótese da inteligência maquiavélica. Acredite quem quiser.

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