domingo, maio 30, 2010

Em defesa das árvores

(...) "O prazer em cortar árvores, me parece, está ligado à volúpia do poder. Quem corta, tortura ou mata experimenta o prazer de exercer poder sobre o mais fraco. Mas acho que o prazer em cortar árvores está ligado a uma coisa mais sinistra. Suspeito que estejamos vivendo um momento de metamorfose da nossa condição humana. Até agora temos sido habitantes do mundo da vida. Nosso habitat é constituído por florestas, animais, rios e mares. Somos seres biológicos, corpos. Mas agora estamos mudando de casa. Estamos trocando nossa casa biológica por uma outra casa, eletrônica. Há tempos fiz a travessia dos lagos andinos – cenários maravilhosos, entre lagos, vulcões e florestas -, passando por Bariloche e terminando em Buenos Aires. Em Bariloche fiquei conhecendo um casal que fazia o mesmo percurso com dois filhos adolescentes. Fui reencontrá-los numa das ruas centrais de Buenos Aires. "Graças a Deus, estamos aqui", me disse o marido."Já não aguentávamos mais: só lagos, montanhas e árvores. Aqui, felizmente temos os videogames." Virei Hulk na mesma hora e lhe disse: "Tomaram a excursão errada. Seu destino era Las Vegas!"Mas eles nada mais fizeram que expressar de forma grosseira o que já ficou normal. (...)
RUBEM ALVES – Em defesa das árvores – do livro O amor que acende a lua – Editora Papirus, 8ª edição, 2003, pp.22/23

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