domingo, maio 30, 2010

INFÂNCIA ESCRAVIZADA

INFÂNCIA ESCRAVIZADA

EDITORIAL- ZERO HORA (RS) - 30/5/2010
A série de reportagens publicada esta semana pelo jornal Diário Gaúcho revelou de forma contundente que crianças e adolescentes engrossam a cada dia o contingente de escravos do crack no Rio Grande do Sul. Não há dados estatísticos que quantifiquem com precisão a parcela da infância gaúcha atingida pelos efeitos nefastos da pedra criminosa. Basta, porém, uma visita a qualquer das incontáveis cracolândias existentes nas principais cidades, em especial na Capital, para que se perceba a presença de meninos e meninas inalando a fumaça da droga ou dominados pelo torpor que ela causa. Nos desvãos das cidades, nas calçadas imundas, sob pontes e viadutos, vegeta uma população de zumbis, hipnotizados pela euforia ilusória da pedra.
Parece incrível que uma sociedade organizada não consiga, ao menos, resgatar as crianças desse feitiço. Mas, infelizmente, tem sido assim. O poder de cobertura do tráfico e o potencial de conquista da droga têm se mostrado incomensuravelmente mais eficientes do que a nossa capacidade de combatê-los. O mais chocante é a inoperância do poder público para agir em nome dos cidadãos contra essa praga que dizima famílias, fomenta a criminalidade e condena milhares de pessoas à mendicância, à prostituição, à doença e à morte. Estima-se que existam atualmente mais de 50 mil gaúchos usuários de crack, entre os quais muitas crianças já com o futuro comprometido.
Há casos verdadeiramente assombrosos, como o do menino de sete anos que começou a usar crack aos quatro, estimulado pelo irmão mais velho. Há famílias inteiras dependentes da droga, pais e mães viciados, filhos desencaminhados, fora da escola, praticando furtos e outros crimes para adquirir a pedra. Há adolescentes grávidas, bebês condenados a nascer com a saúde comprometida.
E a saída é estreita como o cone do funil. Poucos escapam do destino traçado pela pedra, pelo tráfico e pela negligência das autoridades. São raríssimos os centros especializados para tratamento e internação, disputadíssimos os leitos, escassos os medicamentos e os profissionais capacitados a ajudar as vítimas. Mesmo os raros dependentes que têm a sorte de encontrar ajuda ficam invariavelmente sentenciados a sucessivas internações e múltiplas recaídas, como se fosse impossível escapar da armadilha da droga.
Mas há saída: o município de Montenegro, como mostrou a última reportagem da série, está conseguindo vencer o crack, graças ao envolvimento e à mobilização de todos os setores da comunidade. O poder público está fazendo a sua parte, a polícia está agindo, as escolas estão prevenindo e as famílias participam ativamente do movimento Montenegro contra o Crack uma iniciativa que merece ser replicada em outras cidades do Estado. O Rio Grande precisa reagir, não podemos capitular diante da sedução assassina de uma droga que abrevia vidas e extermina futuros.
Parece incrível que uma sociedade organizada não consiga, ao menos, resgatar as crianças desse feitiço.

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