quinta-feira, setembro 30, 2010

Europeus contra a austeridade

Europeus contra a austeridade
Manifestações em 14 países e greve na Espanha marcam protestos sobre medidas de governos
Priscila Guilayn* O Globo Correspondente • MADRI, BRUXELAS, ATENAS e DUBLIN
Protestos nas ruas de Valencia - Foto: / Reuters
 A Europa foi varrida ontem por protestos contra as medidas de austeridade adotadas pelos governos no rastro da crise financeira global. A Espanha, por sua vez, enfrentou a quinta greve geral da história de sua democracia. Bruxelas, onde fica a sede da União Europeia (UE), foi palco de uma “euromanifestação”, que reuniu mais de cem mil pessoas, segundo os sindicatos. A polícia falou em 80 mil. Os manifestantes levavam cartazes, em várias línguas, com os dizeres “Não à austeridade”.
Cerca de 210 pessoas foram detidas.
França, Grécia, Portugal, Irlanda, Itália, Lituânia, Letônia, República Tcheca, Polônia, Eslovênia, Sérvia, Romênia e Chipre também tiveram manifestações, com paralisações de trabalhadores gregos e portugueses.
Em Dublin, um homem foi preso ao protestar, de forma solitária, em frente ao Parlamento. Ele bloqueou o acesso ao prédio com um caminhão de cimento, pedindo “a demissão de todos os políticos”.
A greve geral espanhola não foi tão forte como a de 1988, quando tudo parou, “inclusive a respiração”, em palavras do então presidente do Governo, Felipe González. Mas teve uma adesão bem superior à esperada: as pesquisas previam participação de apenas 18% dos trabalhadores. No cálculo dos sindicatos, foram 70%. O governo, porém, negou-se a dar uma cifra média. Para analistas políticos e econômicos, não houve vencedores nem perdedores.
— A adesão foi desigual e o efeito, moderado. Não vamos entrar em controvérsia sobre cifras baseadas em estimativas — disse o ministro do Trabalho, Celestino Corbacho. — No setor industrial, a adesão foi de quase 100%, mas em hotéis, restaurantes e bares, não chegou a 3%.
Ele usou a palavra normalidade para definir a greve geral, apesar de 78 pessoas terem sido detidas no país. Centenas de voos foram cancelados.
Três piqueteiros foram atropelados ao tentar impedir a entrada de trabalhadores em empresas de Madri, Barcelona e Ciudad Real (Castilla-La Mancha).
Zapatero chama sindicatos
Já Barcelona concentrou a atenção da mídia devido à violência dos protestos antiglobalização. Alguns manifestantes, encapuzados, chegaram a jogar coquetéis molotov dentro de um carro policial — com os agentes dentro. Vitrines de lojas foram quebradas e a mercadoria, saqueada.
A Generalitat (o governo local) repudiou a violência e disse que os incidentes não foram provocados por sindicalistas, mas por grupos anticapitalistas.
A informação foi corroborada pela polícia. Segundo o jornal “El País”, em toda a região da Catalunha, 33 pessoas foram presas e 57 tiveram ferimentos leves. Entre os feridos, 28 policiais e um enfermeiro dos serviços de emergência.
— A adesão à greve tem poucas interpretações: foi um sucesso inquestionável — avaliou Ignacio Fernández Toxo, secretário-geral do maior sindicato espanhol, o Comissões Operárias.
Em alguns setores a greve foi mais notada que em outros. O lixo acumulado acusava a adesão total dos garis. A indústria parou e os transportes (metrôs e trens) circularam apenas para cumprir os serviços mínimos aos cidadãos (segundo o governo, a adesão no setor foi de 21%). Em Madri, piqueteiros impossibilitaram a saída dos ônibus, jogando pedras e ovos nos vidros.
No Centro da capital, muitas lojas nem abriram. Outras deixaram o portão de ferro pela metade, fechandoo quando piqueteiros se aproximavam. O governo afirmou que somente 10% dos comerciantes aderiram à greve. Os hospitais funcionaram como se fosse domingo, e a adesão dos professores variou de 4% a 60%, dependendo da região.
— Respeitamos a convocação de greve geral e sabemos que amanhã (hoje) haverá muito trabalho para realizar através da via do diálogo — afirmou Corbacho.
Embora se mantenha firme com sua reforma trabalhista, um dos pivôs da greve, o socialista José Luis Rodríguez Zapatero — que vem penando com uma popularidade inferior a 30% — está disposto a negociar sua implementação com os sindicatos. O Executivo ainda chamou os sindicatos para discutirem juntos, hoje, a reforma da aposentadoria.
O convite foi recusado, mas o governo disse que manterá sua “mão estendida”.
— Zapatero está em uma crise tão grande de credibilidade e de imagem, tanto nacional como internacionalmente, que essa greve geral não significará uma mudança qualitativa especial — opina o cientista político Josep Maria Reniu, professor da Universidade de Barcelona.
UE quer multas para disciplinar países
Indiferente aos protestos, a Comissão Europeia, órgão executivo da UE, propôs ontem adotar sanções compulsórias para punir os governos que desrespeitarem o limite de endividamento, de 3% do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos em um país).
Estes teriam de depositar em Bruxelas o equivalente a 0,2% de seu PIB.
Em caso de reincidência, haveria multa anual de 0,1% do PIB.
As propostas ainda têm de ser votadas pelos membros da UE e pelo Parlamento Europeu. Mas Portugal já iniciou ontem as discussões sobre o Orçamento de 2011 e, segundo a imprensa local, o governo estuda elevar impostos. A França, por sua vez, tenta fugir da adoção de medidas de austeridade: ontem o governo Nicolas Sarkozy prometeu controlar os gastos com serviços públicos e acabar com deduções tributárias para reabastecer os cofres públicos em 2011.
(*) Com agências internacionais

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