quinta-feira, setembro 30, 2010

O sonho e o amontoado

O sonho e o amontoado
CLÓVIS ROSSI – FOLHA DE SÃO PAULO
De repente, ouço do cantor e compositor Oswaldo Montenegro, em entrevista para a TV Gazeta, uma frase que, para o meu gosto, é uma síntese quase perfeita para o momento: "Sou do tempo em que a gente sonhava junto; hoje, sonhar junto é cafona".
Vale para as eleições brasileiras. A frieza que as cerca reflete, acho, a falta de sonhos coletivos e o predomínio do individualismo. Essa história de "pai" ou de "mãe", por exemplo, é típica de relação patriarcal, de cima para baixo, bem longe do "somos todos iguais/ braços dados ou não" daquela canção de Geraldo Vandré.
Foi um dos hinos da resistência à ditadura.
Por falar em ditadura, nunca esqueci de uma frase que os espanhóis usavam muito, nos anos posteriores à morte de Francisco Franco Bahamonde, o ditador que ganhou a guerra civil (1936/39) e que ficou no poder até morrer, em 1975: "Contra Franco, vivíamos melhor", dizia-se.
Viviam melhor, apesar das perseguições, apesar da ditadura, porque sonhavam juntos e era facilmente discernível quem era mocinho, quem era bandido, conforme o lado que se escolhesse.
As centrais sindicais espanholas que sonhavam junto com socialistas e comunistas, entre outros, lideravam ontem uma greve geral contra as reformas impostas pelos socialistas, que estão no governo e já não sonham, rendem-se ao pesadelo imposto pelos mercados.
Lembrei de Vandré por causa da entrevista que a Globo News anunciava na semana passada e cuja exibição acabei perdendo.
Fui buscar na internet e encontrei uma frase que remete ao início. Questionado sobre em que país vive, Vandré responde:
"Eu até me atreveria a dizer que quem não vive no Brasil é a maioria dos brasileiros. A quase totalidade dos brasileiros não vive mais no Brasil. Vive num amontoado".
crossi@uol.com.br

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