quarta-feira, agosto 04, 2010

O “Donnie Brasco” da Barra

SOCIEDADE
O “Donnie Brasco” da Barra
Infiltrado entre surfistas que vendiam drogas no Rio, um oficial de cartório conseguiu desbaratar uma organização internacional
Fontes, que era surfista, passou a sondar um grupo de traficantes

”No Brasil, a ‘infiltração’ é chamada tecnicamente de ‘entrevista dissimulada’. Você se faz passar por alguém que não é. O seu trabalho não produz prova judicial válida e você não tem outra identidade. A gente apenas levanta os dados necessários para que a Justiça autorize as quebras de sigilo. Você não consegue sair quebrando sigilo de 200 pessoas assim, então é preciso que o alvo seja bem localizado. O trabalho começa com o estudo dos hábitos do grupo que vai ser identificado. A polícia levanta tudo: os lugares que eles frequentam, os hábitos, o linguajar. A gente faz uma espécie de laboratório. Como eu já surfava, fui escolhido para entrar nesse grupo de surfistas que traficava. Você passa dias, semanas nos mesmos lugares que eles, e um dia puxa a conversa. É importante parecer que você faz parte daquele lugar. Todos os dias eu chegava na delegacia às 6 horas da manhã, pegava o carro descaracterizado com uma prancha em cima e ia para a praia. Ficava lá, surfando, com os mesmos caras o tempo todo. Chega uma hora em que você não é mais um estranho no lugar.
Eu nunca tinha ido a uma rave, tive de aprender. Eles passaram a me convidar para festas, e não demorou muito para alguém me oferecer as drogas. Você não pode chegar pedindo, tem de esperar que uma hora alguém oferece. Eu negava, dizendo que tinha de participar de uma competição. Não usava nome falso porque você pode ser parado numa blitz e ter de mostrar o documento. Quando alguém pergunta onde você mora, geralmente você tem de dar um endereço de algum parente que more nas redondezas, para o caso de alguém querer ir até lá. Em geral, eles assumem que você é dali mesmo. Eu nunca tive conflito de achar que eles eram meus amigos. A distância dos mundos é imensa, e você sabe exatamente o que está fazendo ali e quem são eles.
Meu trabalho era identificar os traficantes que seriam alvo de uma investigação mais profunda, com grampos autorizados pela Justiça. A gente não tem esse glamour da polícia dos filmes, que tem uma casa falsa, documento falso, tudo. Você tem de ficar atento o tempo todo, mas isso acaba virando um padrão na sua cabeça. O policial infiltrado não pode ser uma pessoa muito conhecida, popular, que chega num lugar e todo mundo sabe quem ele é. Tem de ser discreto, o tempo todo. "Minha família nunca soube desses trabalhos."

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Skoob

BBC Brasil Atualidades

Visitantes

free counters