terça-feira, setembro 14, 2010

As verdades de Sarrazin: A "correção política" está silenciando um debate importante

As verdades de Sarrazin: A "correção política" está silenciando um debate importante
Matthias Matussek – Der Spiegel
O banqueiro-central alemão Thilo Sarrazin está sendo linchado por causa de sua polêmica censura aos muçulmanos, mas há algumas coisas que seus críticos claramente não estão entendendo. Não se pode desprezar o que o homem personifica: a ira de uma população alemã que está cansada de ser insultada quando se oferece para ajudar estrangeiros a se integrar.
Nada mais é como costumava ser. Nesta temporada de indignação pública, o caso de Thilo Sarrazin tornou-se muito maior que Sarrazin. É muito maior que o homem ou o livro que ele escreveu com críticas ao islã.
O caso Sarrazin também é um caso Merkel, um caso para seu partido, o Social Democrata, de centro-esquerda, e para o "establishment" político e midiático alemão. Sarrazin tornou-se sinônimo da indignação sobre como o ramo politicamente correto da sociedade alemã, baseada no consenso, mandou seus funcionários escoltarem esse indivíduo perturbador até a porta. No caminho, eles também parecem tentar lhe ensinar uma lição: "Vamos lhe incutir à força a tolerância".
Sarrazin não é telegênico, e muitas vezes se atrapalha com as estatísticas. No que se refere a estilo, é uma negação - mal arrumado quando vai aos inúmeros programas de entrevistas que mantêm nossa sociedade do entretenimento viva. Ele escorrega em uma casca de banana de correção política após a outra, expondo-se a ataques com suas declarações sobre genética. Mas suas conclusões sobre o fracasso da integração dos imigrantes turcos e árabes estão além de qualquer dúvida.
Sarrazin foi obrigado a sair do Bundesbank. O SPD também quer chutá-lo para fora do partido. Convites antes estendidos a Sarrazin estão sendo cancelados. Os editores da página de cultura do semanário alemão "Die Zeit" o denunciam e os editores do jornal "Frankfurter Allgemeine Zeitung" amaldiçoam Sarrazin por trechos que ele nem sequer escreveu.
Técnicos da exclusão
Mas o que todos esses técnicos da exclusão deixam de ver é que não se pode evitar a própria coisa que Sarrazin personifica: a irritação de pessoas que estão cansadas - depois de deixar para trás um longo e árduo processo de esclarecimento - de ser confrontadas com elementos pré-esclarecimento que retornam ao centro de nossa sociedade. Elas estão cansadas de ser ofendidas ou ridicularizadas quando oferecem ajuda para a integração. Estão cansadas de ler sobre associações islâmicas que têm um grau mínimo de separação do terrorismo, de assassinatos de honra, de ameaças de morte contra desenhistas e cineastas. Elas estão horrorizadas pelo fato de que "você cristão" tornou-se hoje um insulto em alguns pátios de escola. E estão irritadas que os líderes ocidentais sejam obrigados a lutar por uma mulher de um país islâmico que foi acusada de adultério e está sendo ameaçada de apedrejamento.
Estranhamente, um grande número de nossos concidadãos turcos ficam mais indignados com o livro de Sarrazin do que com essas coisas.
Esses imigrantes turcos suficientemente afortunados para ter carreiras exemplares não deveriam começar a exercer um pouco de influência sobre seus colegas imigrantes e sobre seus vizinhos para que o Corão mostre sua face mais gentil e caridosa? Não está na hora de eles se levantarem e mostrarem seu apoio à pluralidade e à liberdade de expressão?
Esse certamente não foi o caso recentemente, quando o Conselho Migratório, um grupo guarda-chuva de organizações de imigrantes em Berlim, manifestou-se com sucesso contra uma palestra de Sarrazin durante o Festival Internacional de Literatura na capital alemã. Bernd Scherer, que dirige a Casa das Culturas Mundiais, o local do festival, cedeu à pressão e cancelou o evento. Agora a palestra será realizada em outro lugar na sexta-feira - sob proteção policial.
Proteger o público de veneno e tentação
Mas enquanto sociedade parecemos satisfeitos com o fato de que nossos políticos, que se tornaram oportunistas, estão se debatendo sob o mesmo peso. E quanto à mídia politicamente correta, não funciona mais.
Até agora a mídia foi dominada por dois arquétipos: havia o estilo de governanta condescendente que assume que o público é ignorante e, sem ser solicitada, tenta protegê-lo do veneno e da tentação. Ou existe a abordagem de denúncia enérgica, que também supõe que o público é tolo e se concentra em revelar segredos: Sr. Professor, eu notei uma mancha marrom, o senhor não consegue vê-la a olho nu, mas como sou tão inteligente eu consegui vê-la.
Klaus von Dohnanyi, que vai defender Sarrazin enquanto o SPD tenta expulsá-lo, disse ao jornal "Süddeutsche Zeitung" que a Alemanha foi dominada por sua história do Holocausto e que se desenvolveu uma cultura na qual qualquer um que dissesse as palavras "gene" ou "judeu" era automaticamente considerado suspeito.
Ele tem razão ao se queixar de que nós evitamos debates que "são comuns em outros países". Entre estes, a discussão de que "grupos étnicos específicos" compartilham características específicas.
Simplesmente não entendeu
Debates sobre identidade e dominação cultural são generalizados em um mundo cada vez mais global - nos EUA assim como no Reino Unido, na França, Holanda ou Dinamarca. Esse debate não exclui o cosmopolitismo de modo algum. Ele meramente representa uma insistência em manter tradições e valores. A religião é um deles, e algo que as pessoas não vão dispensar de bom grado.
Esses são os trechos do livro de Sarrazin que eu acho mais interessantes. Os que refletem melancolicamente que os alemães estão não apenas demograficamente trabalhando para seu próprio fim, como também estão se despedindo de seu passado cultural e educacional. Quem chamar isso de racista simplesmente não entendeu.
Mas desde o caso Sarrazin está claro que a intimidação da polícia do pensamento politicamente correto da mídia e suas ameaças de expulsar pessoas da sociedade não funcionam mais. Agora o público já tem um instinto de justiça altamente desenvolvido.
O apoio que Sarrazin recebeu demonstra isso. Os alemães estão aprendendo. Talvez, um dia, as redações do país vão se equiparar à posição em que os britânicos estão há muito tempo - um lugar onde os debates podem se realizar sem tapa-olhos ou controles de linguagem. Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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