terça-feira, setembro 28, 2010

Constitucionalidade da Ficha Limpa

Constitucionalidade da Ficha Limpa
Dalmo Dallari *, Jornal do Brasil
O Supremo Tribunal Federal acaba de proferir julgamento de recurso que tinha como base a alegação de inconstitucionalidade da Lei da Ficha Limpa, questionando, inclusive, a constitucionalidade de sua aplicação às eleições deste ano. O Brasil inteiro pode acompanhar a sessão de julgamento, que foi transmitida pela televisão, verificando-se que o tema foi amplamente debatido pelos dez Ministros, que deram os fundamentos de suas convicções e, depois disso, proferiram os seus votos. No final, registrou-se que cinco membros do Tribunal votaram contra a alegação de inconstitucionalidade e cinco votaram a favor. Houve, portanto, em números absolutos, um empate na votação, o que tem levado à interpretação, juridicamente equivocada, de que o julgamento terminou num impasse, não tendo havido decisão.
 Na realidade, em termos jurídicos não ocorreu o impasse e houve, sim, uma decisão do Tribunal, rejeitando a alegação de inconstitucionalidade. Com efeito, nos termos expressos do artigo 97 da Constituição, para declarar a inconstitucionalidade de uma lei é necessária a manifestação favorável de, pelo menos, a maioria absoluta dos membros do Tribunal. Neste momento, o Supremo Tribunal tem dez membros, havendo uma vaga, resultante da aposentadoria do Ministro Eros Grau. Ora, para se atingir a maioria absoluta dos dez membros seriam necessários seis votos e somente cinco Ministros votaram acolhendo a alegação de inconstitucionalidade, o que significa que tal alegação foi rejeitada.
 Assinale-se, desde logo, que é juridicamente errada a interpretação segundo a qual o julgamento terminou num impasse, por ter havido empate na votação. De fato, todos os Ministros que atualmente compõem o Tribunal proferiram o seu voto e assim o julgamento foi concluído, não restando qualquer dúvida quanto à posição de cada Ministro e o resultado final da votação. A alegação de inconstitucionalidade da Lei da Ficha Limpa não foi acolhida por Ministros representando a maioria absoluta dos membros do Tribunal, o que significa que tal alegação foi rejeitada, concluindo-se desse modo a votação, sem que tenha havido impasse. Isso ocorreu com ampla publicidade e o Brasil inteiro conhece o resultado da votação.
 Terminada a votação cabia ao Presidente do Tribunal proclamar o resultado da votação, o que não foi feito, gerando a impressão de que o julgamento não estava concluído. De fato, colhidos os votos de todos os participantes do julgamento, que eram a totalidade dos atuais integrantes do Tribunal, só restava a proclamação formal do resultado da votação, que deveria ter sido feita pelo Presidente. Isso não foi feito, provavelmente porque, em vista das repercussões políticas e do grande interesse público, o Presidente preferiu redigir a proclamação com maior cuidado, mas, evidentemente, ele não poderá, na proclamação formal, alterar o resultado da votação, que foi pública e clara, rejeitando a alegação de inconstitucionalidade. Com esse resultado, os casos pendentes nos Tribunais questionando a constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa poderão, eventualmente, dar ensejo a novo julgamento pelo Supremo Tribunal, mas enquanto isso não ocorrer a lei está em pleno vigor, devendo ser aplicada sem qualquer restrição sempre que ocorrer uma das hipóteses de inelegibilidade previstas na Lei da Ficha Limpa.
* professor e jurista – Publicado em 27/09/2010

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