quarta-feira, outubro 13, 2010

Quem ganha com a “guerra cambial”, e a panacéia Keynesiana

Quem ganha com a “guerra cambial”, e a panacéia Keynesiana
Rodrigo Constantino
Era uma vez o tempo em que uma moeda forte era considerada algo positivo, indicando a solidez da economia. No mundo keynesiano em que vivemos, onde austeridade fiscal virou palavrão, tudo isso mudou. A saída “milagrosa” para todos os problemas agora é desvalorizar a moeda.
Por trás dessa receita, pregada por tantos “gurus” que falharam em prever a crise recente, jaz certo ranço mercantilista: a ideia de que exportar é saudável, mas importar é indesejável para uma nação. Basta refletir um pouco mais sobre a ideia para enxergar seu absurdo. Se isso fosse verdade, então seria verdade para cada estado da nação também, e o saldo comercial teria que ser positivo para todos. A conta não fecha!
A verdade é que os governos não querem fazer as reformas necessárias que aumentariam a competitividade de suas economias. Flexibilizar leis trabalhistas, reduzir gastos públicos e impostos, reformar a previdência, enfim, medidas “impopulares” num primeiro momento, mas que colocariam suas economias numa trajetória sustentável de crescimento.
Os atalhos para ganhos de produtividade costumam acabar mal, assim como os atalhos para emagrecer: a receita saudável é fechar a boca e fazer exercícios. Mas existem aqueles que preferem apelar para caminhos alternativos, mais fáceis e com resultado imediato. Sabemos como acabam.
O mesmo se passa com a “guerra cambial”, uma batalha em que “vence” o mais fraco, e não o mais forte. Aquele que conseguir prejudicar mais a credibilidade de sua moeda canta a vitória. Ninguém quer encarar a ressaca necessária para ajustar o organismo após o estouro da bolha de crédito. Preferem “curar” a ressaca com mais liquidez, mantendo o clima de euforia artificial. Se o veneno foi o excesso de liquidez e crédito, então vamos injetar mais veneno ainda!
Claro que não vai dar certo. Se a desvalorização da moeda fosse solução para alguma coisa, então o Zimbábue seria a nova potência mundial. Estão apenas empurrando o problema com a barriga, jogando para frente os ajustes necessários, que também serão mais dolorosos. Após rodadas de trilhões de dólares não surtirem o efeito desejado, esperam que mais estímulos ainda resolvam os problemas estruturais. Trata-se de uma doce ilusão.
Mas há um detalhe: o “timing” para os novos problemas criados pelos estímulos é bastante incerto. Teoria alguma pode fornecer uma previsão acurada de algo dessa natureza. Acertar o rumo dos eventos e errar o momento pode ser fatal. Eis o que torna o mercado financeiro tão fascinante. Os “profetas” muitas vezes acertam a trajetória de longo prazo, mas não conseguem ganhar dinheiro com sua previsão, pois são aniquilados no processo. É mais fácil falar do que fazer.
A montanha de dinheiro criada do nada pelos bancos centrais precisa ir para algum ativo. Até agora, os títulos do governo americano têm atraído a maior parcela desse dinheiro, mesmo rendendo ao investidor apenas 2,5% ao ano para os próximos 10 anos.
Mas à medida que os investidores notem que os governos não vão parar de inflar suas moedas, a inflação passa a ser um fator maior de preocupação. O dinheiro começa a arder parado nas mãos. É nesse momento que novas bolhas são criadas.
Existem dois claros candidatos a bolhas: o ouro e os mercados emergentes. O ouro disparou, e já vale mais de US$ 1.300 a onça. Há apenas cinco anos ele valia menos de US$ 500. Será que já estamos vendo uma bolha na “relíquia bárbara”? Difícil saber.  Mas enquanto todos os principais governos tentarem bater em suas moedas, expandindo sua oferta de forma descontrolada, parece natural que o metal, com oferta limitada pela natureza, torne-se um alvo daqueles que desejam preservar seu poder de compra.
Os mercados emergentes são outro claro candidato para uma bolha. Com a alta das commodities, puxada pela desvalorização do dólar, e com o crescimento chinês, esses mercados representam um refúgio natural para investidores que desejam algum retorno positivo. O governo brasileiro chegou a aumentar o IOF para a entrada de capital estrangeiro, justamente preocupado com isso. Mas quando vem a boiada, medidas paliativas são ineficazes. O dólar já vale menos de R$ 1,70 e o Ibovespa já passou da barreira dos 70 mil pontos.
A onda pode continuar por algum tempo. Há dinheiro demais sendo jogado nos mercados. Mas todo cuidado é pouco na hora de surfar tal onda. Ela é artificial e insustentável. Bolhas inevitavelmente estouram. Não será diferente desta vez, ainda que possa levar um bom tempo para isso.
Fonte: Jornal “Valor econômico” – 07/10/10

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