terça-feira, outubro 05, 2010

TEMA EM DISCUSSÃO: O STF E A LEI DA FICHA LIMPA

TEMA EM DISCUSSÃO: O STF E A LEI DA FICHA LIMPA
NOSSA OPINIÃO: Prazo de validade
O Globo - Publicada em 04/10/2010 às 17h29m
Não se tem notícia, na história recente, de um julgamento tão intrincado e importante para a vida política quanto o do recurso impetrado junto ao Supremo Tribunal Federal pelo então candidato ao governo de Brasília Joaquim Roriz contra a rejeição ao seu pedido de registro à Justiça eleitoral, com base na Lei da Ficha Limpa. Nem de um resultado tão frustrante, pois, com um pouco visto empate em cinco votos, os ministros não conseguiram definir um ponto capital: se a lei deve produzir efeitos nas eleições deste ano.
A frustração fica por conta de que um movimento inédito de mobilização popular, com tão bons resultados em prazo curto - cerca de um ano entre a formulação do projeto, captação de mais de um milhão de assinaturas e aprovação pelo Congresso -, poderia ter sido concluído de forma espetacular na semana retrasada. Tanto há razões para fundamentar juridicamente a tese de que a Ficha Limpa pode ser aplicada no pleito de 2010 que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) aceitou o enquadramento de políticos nos critérios da lei, feito por tribunais regionais. E por isso recursos foram e são encaminhados ao STF. O primeiro a chegar veio de Joaquim Roriz.
Não é também por acaso que, dos dez ministros em atuação no momento na mais alta Corte do país, a metade concorda que a Ficha Limpa, por não alterar a legislação eleitoral, escapa à exigência do prazo mínimo de um ano para alterações nas regras dos pleitos. Ela apenas estabelece novos critérios para a aplicação de uma legislação mantida intocada nos últimos doze meses. Não há, portanto, tratamento desigual a candidatos - princípio em defesa do qual existe a regra da anualidade. E como bem defendeu o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, como probidade do homem público é uma exigência constitucional, qualquer norma que a reafirme entra em vigor na data da sua publicação. Metade dos magistrados do Supremo, porém, entende o contrário. Como o presidente da Corte, Cezar Peluso, decidiu, acertadamente, não usar sua prerrogativa de dar o voto de Minerva, o julgamento ficou suspenso no ar. (Peluso agiu bem porque, se dobrasse o voto contra a entrada imediata da lei em vigor, livraria não apenas Roriz, mas dezenas de acusados de ser "fichas sujas", e sem qualquer discussão). A malandra renúncia de Roriz, horas após encerrada a sessão do STF, criou mais uma controvérsia. A melhor alternativa seria manter o julgamento, para não haver incertezas sobre as eleições, mas a decisão foi outra. Roriz nomeou a mulher, Weslian, candidata-laranja, e o assunto voltará a ser discutido com a chegada ao Supremo do próximo recurso, talvez do paraense Jader Barbalho.
A frustração, no entanto, não ofusca aspectos positivos. Um deles, que o STF carimbou a constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa. Não há como ela não entrar em vigor, restando a discussão sobre se será agora ou na próxima eleição, em 2012, municipal. Haverá uma situação curiosa: quem foi dado como ficha-suja pelo TSE, e se livrar agora da aplicação da lei, pode considerar que será apanhado daqui a dois ou quatro anos. Serão políticos com prazo de validade. Outro aspecto positivo é que a mobilização em torno da lei sedimentou uma atenção maior com a ética na política. Mas essa faxina poderá começar imediatamente, a depender da Corte. E quanto antes, melhor.
OUTRA OPINIÃO: Só em 2012
OSCAR ARGOLLO - Publicada em 04/10/2010 às 17h33m
A renúncia do candidato Joaquim Roriz e a desistência do recurso junto ao Supremo Tribunal Federal encerraram o processo judicial que tratava de inelegibilidade, por força de dispositivo legal processual.

O julgamento do STF interrompido pelo empate na discussão sobre a incidência da figura jurídica da anterioridade já basta para revelar que há enorme dúvida sobre o tema, e quão oportuna foi a manifestação que alertou para a interpretação equivocada, não da lei que se discutia, mas de decisões de outros processos na mesma Corte.
O assunto ainda merece uma reflexão, no sentido de que o processo eleitoral que a Constituição menciona não se refere ao caderno recheado de papéis, muito menos apenas ao ato de registro da candidatura, ou da convenção partidária, porque tais atos são subsequentes ao prazo de um ano de filiação partidária.
A Lei dos Partidos Políticos determina que, para concorrer às eleições, o candidato deverá possuir domicílio eleitoral e estar filiado ao partido um ano antes do pleito. Dispõe, ainda, que os partidos e coligações solicitarão à Justiça Eleitoral o registro de seus candidatos até o dia 5 de julho do ano em que se realizarem as eleições. No entanto, observa-se que, na segunda semana dos meses de abril e outubro de cada ano, o partido, por seus órgãos de direção municipais, regionais ou nacional, deverá remeter o pedido de registro aos juízes eleitorais, para arquivamento, publicação e cumprimento dos prazos de filiação partidária e para efeito de candidatura a cargos eletivos.
O processo eleitoral a que a Constituição alude se refere ao ato administrativo, composto e complexo, iniciado com a filiação do candidato, um ano antes da eleição, seguida de confirmação em abril "para efeitos de candidatura a cargos eletivos" (sic), sendo o candidato escolhido e registrado depois de superadas tais premissas, mas já em franco processo eleitoral.
A reflexão que se pondera é a revisão da situação externada no julgamento do ex-governador Roriz, haja vista que ocorrerá o empate em qualquer novo caso apresentado, diante da manutenção das mesmas opiniões e até a investidura de novo magistrado.
 Deve-se ponderar, também, que a alteração ocorrida no texto da lei não teve mero destino redacional ou gramatical, sem mudar-lhe o sentido, pois salta aos olhos quando a regra legal pretendia excluir do pleito os que tenham sido condenados, passando a registrar os que forem condenados, uma visível modificação temporal da proposição inicial, que é vedada pelo Regimento Comum das Casas do Congresso Nacional.
O empate das opiniões externadas pelos membros da Corte Suprema já parece suficiente para demonstrar a situação de insegurança jurídica, mesmo quando se interpreta claramente que a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência.
Somente pelo impasse, transtorno e confusão que a situação já ocasionou há que se verificar que a vontade dos constituintes foi manter a paz e tranquilidade durante o período eleitoral a partir de um ano antes da eleição. Por fim, também cabe ponderar a algum partido político ingressar com ação direta de inconstitucionalidade para, finalmente, se aclarar a situação ainda insegura.
OSCAR ARGOLLO é advogado.

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