segunda-feira, outubro 04, 2010

O cirurgião da liderança

O cirurgião da liderança
Leandro Mazzini – JORNAL DO BRASIL
 SE HÁ UMA CERTEZA sobre Dilma Rousseff além dos números que a rondam, é a de que ela tem vários criadores – e justamente por isso existe o risco de que a disputa por essa paternidade, pós-eleição, seja o enterro de muitos deles. “A candidata fabricada”, na versão escarrada do adversário Plinio de Arruda (PSOL), não deixa de ser verdade. O maior dos pais da neopetista é o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva.
 Lula a puxou de um ministério e lançou- a sem consultar o partido. Nada demais, na visão do presidente. Ele se dissociou do PT há tempos. Está acima da legenda e faz o que bem entende.
Assumiu sozinho, assim, a responsabilidade de manter a continuidade de seu projeto no poder na figura de Dilma. Por ora, em cenários abstratos, deu certo.
Outros dois pais de Dilma não brigam entre si, mas disputarão espaço por poder em um eventual governo seu. São: José Dirceu e Marco Aurélio Garcia. O primeiro, amigo de longa data e conselheiro – até a presenteou com o cão Nego, que brilhou na estreia da campanha da petista na TV, uma forma de menção ao mentor.
E o segundo, o responsável pela subida de Dilma à Casa Civil e à preferência de Lula para a sucessão.
Na sua versão, o próprio Marco Aurélio me contou numa entrevista há dois anos: Lula queria saber quem era aquela galega de óculos de lentes fundas. Foi Garcia quem fez a aproximação.
E também virou fã dela.
 O esboço do sucesso eleitoral de Dilma não provém de nenhum deles especialmente.
 Obviamente que o presidente Lula é o maior cabo eleitoral da candidata, e provou ser o potencial transferidor de votos.
Mas Dilma tem um irmão, e este foi ela quem fabricou. E, sem ele, nem Dilma nem o presidente Lula teriam a base partidária e a militância parlamentar para engrossar as fileiras do PT na disputa presidencial. Trata-se do médico Alexandre Padilha. Um sanitarista que foi pescado nas divisões de base do PT e que virou o guardião do cofre.
Padilha é a chave do mistério na alavancada de Dilma Rousseff contra José Serra, no que concerne à virada nas pesquisas.
O maior protagonista dessa subida meteórica de Dilma é o dono do cofre. Sem segredos, a base do governo se alimenta de fatias orçamentárias bem distribuídas por emendas controladas por Padilha.
Há mais de dois anos, na surdina e depois à frente do Ministério de Relações Institucionais, é Padilha quem sacia os grandes partidos aliados em doses esporádicas de verbas. Foi Padilha quem negociou também, junto ao comitê de Dilma, a formação dos partidos da chapa. Foi Padilha quem nestes anos todos recebeu centenas ou milhares de prefeitos enviados por deputados e senadores. Ele foi o responsável pela confecção da grande teia de coalizão que sustenta os votos confirmados de Dilma.
Em suma, Padilha, o médico, fez a cirurgia para erguer uma militância forte. Fez da grande maioria dos prefeitos os seus cabos eleitorais. E são estes que garantem o sucesso inicial de Dilma. Daí o presidente Lula, há mais de um ano, garantir que faria a sucessora, que agora vai ao segundo turno com José Serra. Ele já tinha milhares de prefeitos nas mãos.
O doutor que ajudou a operar a militância que apoia Dilma, por ora, soube criar o gigante eleitoral e alimentá-lo.
Resta saber se, daqui por diante, saberá controlar seu apetite, se esse gigante subir a rampa do Palácio.
Sábio, o eleitor pediu mais tempo para pensar
 O ELEITOR BRASILEIRO MOSTROU suas várias faces neste primeiro turno. Para o bem e para o mal, exibiu sua revolta, seu engajamento, seu discernimento e sua alienação nas cabines de votação espalhadas de Norte a Sul.
 Na sua vontade soberana, quis o eleitorado que Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB) disputassem ainda uma última rodada de embates para que seja decidido qual dos dois ocupará o Palácio do Planalto entre 2011 e 2014.
Agora, os dois mais votados terão oportunidade de debater e explicar melhor suas ideias e projetos. Ao mundo, o Brasil dá uma importante lição sobre eleições em dois turnos: vota-se em quem se acredita, e não naquele que parece ser o menos pior. Vota-se a favor de alguém e não contra determinado candidato.
Pode-se especular sobre as razões que determinaram a redução da dianteira apresentada pela candidata petista até recentemente.
Denúncias de corrupção na Casa Civil, nervosismo e mau desempenho nos debates televisivos, autossuficiência na reta final da campanha, desempenho abaixo da expectativa no Nordeste...
 Da mesma forma, há muitas teorias para a ressurreição da candidatura de José Serra. Bom desempenho na TV, apoio às vezes explícito de alguns meios de comunicação, sabedoria para aproveitar os flancos abertos pelo governo federal, crescimento da candidatura de Marina Silva (PV)...
Mas essas dúvidas importam menos do que uma certeza: hoje começa uma nova eleição.
Dilma e Serra partem em igualdade de condições em busca da Presidência da República, embora o tucano entre com o ânimo renovado e a candidata do presidente Lula, com uma indisfarçável ressaca por ter visto escapar a vitória.
 Marina Silva (PV), com seus cerca de 20% do eleitorado, será o fiel da balança. Embora ex-petista e ex-ministra de Lula, reuniu votos que podem certamente migrar para o PSDB. Conquistá-los será o primeiro teste para as habilidades de Dilma como negociadora política.
Vencedor, até agora, só o povo brasileiro, que decidiu pensar um pouco mais sobre aquele a quem entregará, no próximo dia 31, os destinos da Nação e seu próprio futuro.

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