terça-feira, outubro 12, 2010

Importância do segundo turno

Importância do segundo turno
BENJAMIN STEINBRUCH- FOLHA DE SÃO PAULO - 12/10/10
É preciso saber a opinião dos candidatos sobre a "guerra cambial" a que se refere o ministro Mantega
COSTUMA-SE dizer que o segundo turno das eleições é útil por duas razões: dá oportunidade para se conhecer melhor as propostas dos candidatos e força o entendimento entre as várias facções políticas.
Mais do que nunca, desta vez o segundo turno da eleição presidencial será crucial pela primeira razão.
Passamos a campanha do primeiro turno sem discutir quase nenhum dos graves problemas que a próxima administração terá de enfrentar.
Enquanto os candidatos "candidamente" debatiam questões menos relevantes, corria no mercado global o que o ministro Guido Mantega chamou de "guerra cambial", declaração guindada à manchete do "Financial Times", de Londres, em 28 de setembro.
É espantoso que o assunto não tenha sido levantado em nenhum debate na televisão e em nenhuma proposta partidária, porque ele impacta diretamente o Brasil. O resultado dessa "guerra cambial" é a constante e preocupante alta do real ante o dólar e a outras moedas estrangeiras, que corrói a competitividade brasileira no exterior.
Ao contrário do senso comum, o real forte enfraquece o país, porque reduz a capacidade de exportar das empresas e, no médio prazo, pode levar a profundos desequilíbrios nas contas externas, como já ocorreu várias vezes no passado recente.
Todos os bancos centrais do mundo estão envolvidos nessa batalha.
O americano (Fed), que até março comprou US$ 1,7 trilhão em títulos da dívida dos EUA, deverá retomar essa política. O japonês (Banco do Japão) reduziu os juros a zero e vai comprar US$ 60 bilhões em títulos públicos para conter a alta do iene.
Embora pressionado pelos EUA e pela Europa, o BC chinês se recusa a permitir a valorização do yuan, para manter sua força exportadora.
O problema do câmbio, portanto, está longe de ser uma exclusividade brasileira. Mas é possível tomar medidas por aqui para atenuar seus efeitos, evitando-se que o real continue a ganhar força em relação ao dólar. Na semana passada, o governo aumentou de 2% para 4% o IOF incidente sobre ganhos de investimentos estrangeiros em renda fixa.
O impacto dessa medida, pelo menos no primeiro momento, foi pequeno para conter o grande volume de recursos que entra no país e segurar a queda do dólar. Mas a medida está na direção correta, porque tenta interferir na absurda diferença entre os juros internos e os externos -este também um tema crucial que não mereceu a atenção dos candidatos. Em aplicações pelo prazo de um ano, o investidor estrangeiro pode obter ganhos de mais de 7% no Brasil, enquanto a rentabilidade no exterior beira a zero. Por essa razão, de janeiro até agora já entraram líquidos no país mais de US$ 18 bilhões desses capitais oportunistas, contribuindo para pressionar a cotação do real para cima.
Martin Wolf, experiente editor de economia do "Financial Times", que esteve em São Paulo na semana passada, usou uma figura marcante para comentar a "guerra cambial".
Disse que ela é uma briga entre duas superpotências, a atual, os EUA, e a próxima, a China. "Quando dois elefantes desse porte brigam, os espectadores podem ser pisoteados."
O Brasil, certamente, é um desses "espectadores". Portanto, não é razoável que um tema dessa magnitude fique fora do debate entre aqueles que pretendem governar o país nos próximos quatro anos. É preciso saber a opinião deles sobre isso.
Mais ainda, é preciso saber quem são as pessoas que comporão seu time de auxiliares de primeira linha, que formularão as políticas econômica, monetária e cambial do próximo governo.
Outros temas relevantes exigem debate, como a questão do ritmo de crescimento que se pretende impor ao país. Há um fato novo nesse assunto, a partir de mensagens embutidas nos quase 20 milhões de votos dados no primeiro turno a Marina Silva, cujas propostas incorporam preocupações e proposições para a área ambiental em seus programas de desenvolvimento.
O debate da campanha no segundo turno, sem dúvida, será muito útil, desde que as discussões não descambem novamente para futricas e questões pessoais.
BENJAMIN STEINBRUCH, 56, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp. Escreve às terças, a cada 15 dias, nesta coluna.

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